Como surgiu o universo, o mundo e a natureza que conhecemos? Há diversas histórias e explicações sobre a criação desses elementos. Conhecidas como cosmogonias, essas histórias explicam a origem da vida de diferentes maneiras. Uma dessas versões é contada no livro “Òrun Àiyé: A Criação do Mundo", que apresenta a origem do mundo e da vida humana através da mitologia iorubá, e está iniciando a sua pré-venda.
Dedicado ao público infantil, a obra da autora baiana Jamile Coelho conta a história do plano espiritual Òrunonde onde vive Olorum, o senhor de todas as coisas. Olorum confia a missão de criação do mundo, conhecido como Àiyé, para seu filho Obatalá. Após a desobediência, Odùdùa, seu outro filho, é quem espalha a magia necessária para o surgimento da terra. Tudo isso com ilustrações gráficas de Marcone Silva e contracapa do antropólogo baiano Vilson Caetano, que trazem figuras negras e ancestrais e valorizam a cultura afro-brasileira.
“O livro Òrun Àiyé vem de um processo muito importante, que é de honrar nossos ancestrais, que sobreviveram a todas essas atrocidades e que através dos anos conseguiram fazer com que nossa cultura sobrevivesse através das narrativas orais” declara Jamile.
Criado após o sucesso do filme "Òrun Àiyé - A Criação do Mundo", uma animação stop-motion também dirigida por Jamile Coelho e que circulou em diversos festivais no Brasil e no exterior, o livro é um dos primeiros passos de Jamile Coelho na literatura. Atualmente em pré-venda, o livro está com uma campanha de financiamento coletivo lançada na plataforma Catarse. Os contribuintes podem receber brindes como adesivos, marca páginas e o DVD do filme.
O RESGATE DA CULTURA ANCESTRAL
A valorização da cultura afro-brasileira vai além da história narrada, mas também está relacionada a forma como a obra é contada. As aventuras de “Òrun Àiyé: A Criação do Mundo" são narradas respeitando uma das principais tradições da cultura africana: a oralidade. Os irmãos Antônio e Beth são cativados com a narrativa de Vovô Jaime, que enaltece a tradição africanista do saber transmitido entre gerações pela fala e pela escuta. A figura do Vovô é, na verdade, uma homenagem a Jaime Sodré, importante professor e historiador, referência na preservação dos estudos africanos na Bahia.
“No mundo ocidental, somos condicionados sempre ao novo. Mas nas tradições africanas o futuro é ancestral, pois temos a figura do griô, deste guardião, que é um contador de histórias, uma verdadeira biblioteca viva”, destaca Jamile, mencionando como sua obra rememora não somente Jaime Sodré, mas todos os outros griôs que deixaram seu legado na história do Brasil.
COM LEI, COM INSISTÊNCIA
Obras como “Òrun Àiyé: A Criação do Mundo" se juntam a outros livros que vem ganhando espaços em livrarias e estantes no país. Após anos de luta dos movimentos negros no Brasil, o ensino da cultura sobre a "História e Cultura Afro-Brasileira e Africana” tornou-se obrigatório para a rede de ensino básico somente em 2003, com a aprovação da Lei 10.639/03. “A gente precisa fazer cumprir essa lei, que ainda hoje não tem uma aplicação em sala de aula”, menciona Jamile.
Para a autora, a obra também se encaixa como uma ferramenta de combate ao racismo e ao ódio religioso, valorizando as culturas de matrizes africanas e auxiliando na formação da sociedade brasileira.
*estagiário sob a supervisão de Márcia Maria Cruz