Os atores Zac Afron, Johnny Deep, e os músicos Rocky Loewe e Shaw Mendes exibem com orgulho as unhas pintadas com diferentes cores e até desenhos. No Brasil, Enzo Celulari também aderiu aos esmaltes. Muita gente pode dizer: 'mais uma modinha de artistas'. Pode até ser, ma o comprtamento é muito mais que moda. Não são apenas homens das artes, muitos anônimos aderem também e até homens de profissões modelo de masculinidade.
Na Olimpíada de Tóquio 2020, o boxeador australiano Harry Garside comemorou a vitória exibindo as unhas pintadas, depois do triunfo nas quartas de finais da categoria peso leve contra Zakir Safiullin.
O pugilista explicou o motivo de usar esmalte nas unhas pintadas. “Eu só quero quebrar estereótipos, para ser honesto. Eu sou um grande adepto disso. Há muitas pessoas por aí que sentem que têm que ser algo porque são homens ou mulheres. O meu objetivo é apenas ser diferente”, explicou Harry.
A modalidade do boxe, que muitas vezes é vista apenas como sinônimo de força física, teve um dos símbolos mais marcantes da edição dos jogos e levantou um debate importante sobre o rompimento com os estereótipos.
Mas qual o impacto que as unhas pintadas por homens têm?
Para Emerson Campos, pesquisador sobre lazer e esportes sob a perspectiva de gênero e sexualidade, essa é uma prática de resistência que não é tão simples. Há a possibilidade de o atleta perder apoio financeiro e ser vítima de preconceito.
O pesquisador destaca como uma forma de vinvenciar a masculinidade se baseia em noções estabelecidas na sociedade do que cada pessoa, homem e mulher, pode vestir ou usar.
“Forja-se uma masculinidade possível apenas para homens, mas também uma feminilidade, esta possível apenas para mulheres. Em todo caso, se você é homem não pode expressar-se de forma feminina, logo, não deve participar de determinadas práticas de lazer e esporte, o mesmo acontece com as mulheres, porém de modo inverso”, declara Emerson.
Nos esportes, o pesquisador aponta que não há apenas uma masculinidade, mas diversas. No entanto, há manifestações que se tornam padrões, relacionando o fato de “ser homem” com as atitudes de masculinidade. Para Emerson, quando isso acontece é prejudicial aos próprios atletas, limitando suas atuações no esporte e questionando até a sua sexualidade.
SINÔNIMO DE FORÇA?
Os esportes, em certa medida, sempre foram vistos como sinônimo de força física, resistência, equilíbrio e outras características associadas principalmente ao corpo. Nos Jogos Olímpicos, por exemplo, há esportes em que não há a oferta da modalidade feminina. Outras modalidades como o boxe feminino só conquistaram seu espaço olímpico na edição de 2012.
Esse ambiente, de acordo com Emerson, contribui para a masculinidade tóxica por definir modalidades que podem ou não ser realizadas por determinadas pessoas, questionando sua participação e sua condição de atleta.
“Mulheres que não performam uma feminilidade esperada, ou quando vivenciam esportes lidos como masculinos (futebol, boxe, remo, por exemplo), têm suas participações questionadas, inclusive isso incide sobre teste de verificação de veracidade de gênero, doping e etc", menciona o pesquisador.
NÃO SÃO CASOS ISOLADOS
Outro caso que repercutiu no boxe foi do atleta mexicano Diego Garijo, que também realiza performances como Drag Queen. Em entrevista à VICE, Diego declarou que as duas atividades podem ser realizadas por uma mesma pessoa, sendo ótimas saídas para superar medos e traumas.
“Acho que as pessoas se perguntam se eu sou gay, mas não entendem que feminilidade e preferência sexual são duas coisas completamente diferentes", afirmou Diego.
No futebol, é esperado uma forma de homens expressarem a masculinidade. Por exemplo, o número de jogadores LGBTQIA+ assumidos é quase inexpressivo em relação a quantidade de atletas atuantes no esporte.
A FIFA, entidade máxima do futebol, somente em 2019 alterou o seu código de práticas e condutas disciplinares, inserindo algumas medidas em casos de atos homofóbicos, com multas financeiras aos clubes e a possibilidade de o árbitro da partida encerrar o jogo em caso de homofobia, por exemplo.
Emerson destaca que alguns símbolos e “tradições” criadas no ambiente do futebol acabam contribuindo ainda mais para que este padrão de masculinidade excessiva seja mantido.
“O uso da camisa de número 24 é um tabu no futebol brasileiro, tudo isso porque esse número, no Jogo do Bicho, é representado pelo animal veado, então, poucos teriam coragem de usá-lo. Não querem estar relacionado ao animal e pelo que representa no senso comum, geralmente relacionado aos gays”.
ROMPIMENTO COM A MASCULINIDADE TÓXICA
Para o pesquisador, as ações para combater a homofobia e a masculinidade padronizada ainda são lentas e é preciso avançar com essas discussões no ambiente esportivo, pois somente assim é compreender o outro como sujeito.
“Precisamos discutir educação sexual, diversidade, questões de gênero, dentre outros temas relacionados à inclusão. Isso deve fazer parte de uma política pública ampla, com muitas frentes de ação. As pessoas têm uma visão limitada do que esses termos significam”, aponta Emerson.