Jornal Estado de Minas

TRADIÇÃO QUILOMBOLA

Sistema de plantio quilombola se torna patrimônio cultural do Brasil



Mais do que as atividades de plantar e colher, a agricultura tradicional e familiar mantém vivas as técnicas, as práticas e o sustento de muitas comunidades quilombolas pelo país. No sudeste paulista, em um dos quilombos do Vale do Ribeira, a agricultura tradicional foi reconhecida como Patrimônio Cultural do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). 





As comunidades desenvolvem a técnica de plantio de alimentos há mais de 300 anos. Além de toda bagagem cultural e social, o reconhecimento pelo Iphan também é fruto da tradição que não utiliza adubo ou agrotóxicos, optando pela roça de coivara.
 
O procedimento, mantido durante todo esse tempo no Vale do Ribeira, também é aplicado por comunidades ribeirinhas, por povos indígenas e tradicionais no Brasil. Isso, devido ao seu baixo custo, pois realiza o corte e a queimada do espaço que receberá o plantio.

De acordo com o Instituto Socioambiental (ISA), o Vale do Ribeira possui cerca de 481.224 mil habitantes. São 88 comunidades quilombolas na região, que dependem da produção tradicional agrícola do local, em sua maior parte de subsistência, para consumo próprio. Outra parte é destinada ao comércio local e regional. 




Liberação para o plantio

Para a realização do plantio, colheita ou qualquer outra prática em vegetações nativas, as comunidades precisam de autorização do Governo do Estado de São Paulo, especificamente para o Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp).
 
O Itesp é responsável pelas vistorias dos espaços. Em parceria com a Companhia Ambiental do Estado (Cetesb), emite a licença para o plantio. No entanto, a ausência desta aprovação está sendo um desafio para as comunidades que utilizam a Mata Atlântica. 

Em setembro, comunidades quilombolas e entidades de apoio lançaram uma campanha em defesa da abertura das roças. Atualmente, a região abriga 21% da região da Mata Atlântica brasileira. No país, apenas 7% do bioma foi mantido ao longo da história.





Para Ivy Wies, assessora técnica do Instituto Socioambiental (ISA), organização que apoia os quilombolas, o título recebido pode demonstrar também a necessidade de incentivo e acolhimento constante para as comunidades tradicionais. 

“Esse reconhecimento do Iphan também é um apoio político para mostrar a importância da roça. Não foi à toa que o Iphan reconheceu isso, foi construído um dossiê, as comunidades fizeram um inventário cultural. Além disso, tem os artigos científicos e tem subsídios legais. Tudo isso mostra a importância ambiental, social e cultural que levou ao reconhecimento do sistema agrícola como patrimônio”, comenta uma das entidades que apoiam os quilombolas, em entrevista para a Agência Brasil.

Para a assessora, a ausência de emissão da licença para o plantio afeta o desenvolvimento das comunidades.  “Dois pontos que estão ameaçados pela falta de licença: a segurança alimentar e a manutenção das variedades agrícolas, que são um patrimônio da humanidade - as variedades de milho, batata, cará, arroz, feijão, mandioca”, destaca Ivy, mencionando a riqueza social e diversa que os alimentos que não são geneticamente modificados oferecem.

No Brasil, são mais de 2,6 mil comunidades quilombolas reconhecidas pela Fundação Cultural Palmares. Os estados brasileiros com a maior quantidade de comunidades são Maranhão, Bahia, Pará, Minas Gerais e Pernambuco. 




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