Jornal Estado de Minas

SEXISMO

Topless: caso de Beatriz Coelho levanta discussões sobre o ato

Beatriz Coelho, artista plástica e ex-namorada da atriz Camila Pitanga, foi detida com uma amiga no domingo (30/01) depois de fazer topless em uma praia. Nos stories do Instagram, ela registrou o ocorrido e mostrou que chegou a ter seus pés algemados. Em uma das fotos, perguntou: "O que pode acontecer com uma mulher que faz topless no Brasil?".





Não é a primeira vez que uma mulher é detida por tomar sol sem a parte superior do biquíni no Brasil, mas surpreende por ter acontecido 22 anos após um dos casos mais emblemáticos envolvendo topless: a prisão de Rosemeri Moura da Costa em janeiro de 2000. Na época, o então prefeito do Rio repudiou a ação, mas houve protestos em apoio à Rosemeri e o secretário de Segurança determinou que a PM não interviesse mais em casos do tipo.

O que a lei diz?

Mesmo após duas décadas, a lei continua não sendo clara. O topless em si, não configura crime no Brasil, mas ainda pode levar à prisão, como sinaliza a advogada Luanda Pires, CEO da P2 InterDiversidade e vice-presidente do Me Too Brasil em entrevista ao UOL. De acordo com o especialista em Direito Civil Leonardo Ribeiro da Luz, o tema se encontra numa situação jurídica nebulosa. "O nosso Código Penal data dos anos 1940. Foi feito para outro mundo. Muito do que era ato obsceno naquela época já deixou de ser", conta ele ao Jornal O Globo.

Segundo Luanda, " pode ser entendido como ato obsceno, que é um crime tipificado pelo artigo 233 do Código Penal. A pena pode ser de detenção de três meses a um ano, ou multa". Entretanto, o artigo não explica o que é um ato obsceno e fica aberto a interpretações do agente público, o que passa a ser um fator negativo a partir do momento em que as bases de julgamento se posicionam a favor do sexismo.





No caso de Beatriz Coelho, isso se explicita de maneira ainda mais forte quando a artista relata que "o mais irônico é que, ao meu lado, na delegacia, tinha um homem aguardando sem camisa. Nem na delegacia um homem precisa estar vestido". A historiadora Nataraj Trinta, integrante da Articulação de Mulheres Brasileiras, explica que o corpo feminino ainda é encarado de maneira excessivamente sexualizada no país. "No Brasil, a nudez, especialmente a feminina, usualmente é entendida como convite ou um insulto".

No final dos anos 1970, com a onda libertária vanguardista, Fernando Gabeira atribuiu um fundo político à ação. "O topless não deixava de ser um desdobramento do movimento feminista, da decisão de rasgar o sutiã", comenta. Entretanto, o ato se manteve restrito a uma minoria por nunca ter se adequado à moralidade dominante no país, mas principalmente no Rio, como conta o historiador Luiz Antônio Simas. "É preciso quebrar o mito tropical do carioca como um libertário em relação ao corpo. É uma construção ilusória, uma imagem turística da cidade, especialmente no carnaval", afirma.

Rede de apoio


Ao ter publicado o ocorrido nas redes sociais, Beatriz Coelho ganhou o apoio de internautas. Camila Pitanga chegou a fazer uma publicação em seu perfil do Instagram na manhã desta segunda-feira (31/01) em apoio à artista afirmando que ela "sofreu uma violência policial claramente motivada pelo machismo e homofobia".






Luanda Pires também aponta que nos casos em que há abordagem policial, ela deve ser pacífica quando não há resistência. "O ideal é que o agente peça apenas que a pessoa se vista e, se ela não mostrar resistência, não é necessário levar à delegacia. Mas o trato deve ser pacífico, desde a abordagem até a condução. E se a pessoa não se mostra resistente ou violenta, não há motivo para fazer uso de algemas", explica. Entretanto, Beatriz alega que, mesmo sem resistência, foi levada pelos policiais, que ainda algemaram os pés da artista.

Ouça e acompanhe as edições do podcast DiversEM