Renata Rocha Santos Mendes se preparou para levar o filho João Pedro, de 2 anos e diagnosticado com síndrome de down, para Centro Municipal de Educação Infantil (CEMEI), em Montes Claros, no Norte de Minas. Porém, o menino foi impedido de frequentar a escola, no dia 21 de fevereiro, ato que, segundo a mãe, foi movido pelo preconceito em relação ao diagnóstico do filho.
Renata conta que desde os 6 meses de idade, João faz acompanhamento com fonoaudiólogo, pediatra e fisioterapeuta, para estimular seu desenvolvimento.
O grupo de especialistas chegaram a conclusão que, para um melhor aproveitamento da fase de aprendizado da criança, era indicado que frequentasse uma escola regular. Após muita pesquisa, Renata, escolheu a Cemei Amiguinhos da Vila.
Ao chegar à escola, o porteiro impediu a entrada de João, alegando que nenhuma criança poderia entrar sem máscara. Renata conta que o filho tem dificuldade de manter o uso da máscara por muito tempo.
A mãe informou ao porteiro que na Lei nº 14.019, de 2 de julho de 2020, estabelece a obrigatoriedade do uso da máscara, abre um precedente para pessoas com deficiências. Elas não precisam usar a máscara devido às dificuldades da deficiência.
“Essa lei que ampara meu filho, que ampara todas essas pessoas que estão aí, é uma lei marcada de lágrimas, de sofrimento. Muitas pessoas sofreram para que essa lei fosse colocada em prática e a partir do momento que existe essa lei, nenhuma criança deveria sofrer mais para ter seus direitos garantidos”, declarou Renata.
Depois de aproximadamente uma hora de espera próximo à entrada da escola, exposta a outros pais passando e vendo a situação, a diretora foi até Renata e manteve o posicionamento do porteiro, voltando a afirmar que João não poderia frequentar a escola, pois deveria tratar todos os alunos iguais não podendo abrir uma exceção.
A reportagem entrou em contato com a Cemei, mas até o momento não obteve resposta.
Lei federal protege pessoas com deficiência
Renata voltou a explicar que não se tratava de exceção, que se tratava de um direito. A Lei nº 14.019 protege pessoas com deficiência.“Ali, quando ela negou a presença do meu filho na sala de aula, eu senti na pele a descriminação”, desabafa.
“Se aceitou a matrícula, há dois meses, e a escola tinha acesso ao relatório médico, e ainda sim não concedeu o acesso, nós não estamos discutindo sobre recusa de matrícula, estamos discutindo sobre um ato discriminatório com a criança com deficiência", diz Marcel Raoni, advogado da Associação das Pessoas com Deficiência de Montes Claros,
Conselheiro municipal do Conselho de Defesa do Direito da Pessoa com Deficiência de Montes Claros, o advogado explica que a lei federal diz que aquele que comete um ato discriminatório contra pessoa com deficiência está passível de receber pena de reclusão de 2 a 5 anos.
Ao sair do local, Renata se dirigiu a uma base da Policia Militar para registrar o boletim de ocorrência e, na terça-feira (22/2) à tarde, procurou a Secretaria de Educação de Montes Claros, onde foi atendida pelo coordenador da área de inclusão, que assegurou que esse não é o procedimento que foi passado para as escolas, e que em caso de uma criança com deficiência, a escola passa por um processo de preparo para recebe-la.
“Eu disse a ela que a inclusão é muito bonita no papel. Naquela Cemei tanto o porteiro, quanto alguns funcionários e a diretora estavam brutalmente despreparados e não tinham conhecimentos básicos para receber o meu filho”, conta Renata.
A Secretaria de Educação assegurou que João teria a matrícula aprovada em qualquer Cemei, inclusive a Amiguinhos da Vila.
Renata afirmou que depois do episódio, não sente segurança em deixar seu filho sob os cuidados da mesma instituição e está em processo de pesquisa para escolher o melhor lugar para João estudar e ser realmente incluído. Além disso, Renata também abrirá um processo contra a instituição de ensino, solicitando indenização pelos danos morais que ela e João sofreram.
“Independentemente de classe social, independente se tem diagnostico ou não, que não permitam que ninguém, nem uma diretora, nem um porteiro, que ninguém trace ou rotule o futuro dos nossos filhos. Só nós mães sabemos das nossas lutas diárias”, declara Renata.
Marcel acredita que a raiz desse problema vai lá na Secretaria de Educação que não oferece nenhum processo de qualificação a esses funcionários de instituição de ensino para saber das tratativas necessárias para lidar com a criança com deficiência, e lembra que as pessoas devem ser tratadas com igualdade na medida de suas desigualdades.
*Estagiária sob a supervisão de Márcia Maria Cruz