Morar junto com um parceiro já foi considerado um passo importante para a união por toda a vida, mas as gerações mais jovens não estão necessariamente dividindo a casa pensando em casamento.
Anos atrás, morar junto com um parceiro era uma decisão quase sagrada, a não ser nos últimos estágios da relação, já perto do casamento. E, poucas décadas atrás, muitos casais não chegavam a morar juntos antes de assinar os papéis.
Este ainda pode ser o caso para algumas pessoas hoje em dia, especialmente em algumas culturas ou religiões específicas, mas morar junto tornou-se comum em países como o Reino Unido e os EUA - e, muitas vezes, sem relação com projetos para o futuro.
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Os pesquisadores afirmam que, em vez de ser um momento importante no caminho para o relacionamento permanente, a decisão de morar junto pode estar mais ligada à conveniência. Aparentemente, os jovens continuam a abandonar os velhos conceitos do que significa ter um parceiro, agora e para o futuro, comprovando que os momentos marcantes não têm hoje a mesma importância que tiveram no passado.
Não é mais um 'período de experiência'
O momento atual é oportuno para analisar as tendências da coabitação, que é o segmento demográfico que mais cresce no Reino Unido.
Dados de 2018 do Instituto Nacional de Estatísticas do Reino Unido (ONS, na sigla em inglês) indicam que o número de casais que moram juntos está ultrapassando o de casais casados e famílias com um dos pais, após um aumento de mais de 25% entre 2008 e 2018.
E, nos Estados Unidos, o padrão é similar. Os millennials estão mais dispostos a morar junto com um parceiro amoroso que a geração X, quando tinha a mesma idade. Dados de 2019 do think tank (centro de pesquisa e debates) norte-americano Pew Research Center mostram que 12% dos millennials estavam morando junto com os parceiros sem se casar - contra apenas 8% dos jovens da geração X em 2003, com a mesma idade.
As narrativas tradicionais sobre morar juntos muitas vezes têm relação direta com o casamento, seja acreditando que as pessoas se unem com a intenção explícita de estabelecer-se ou que elas estão pelo menos "verificando" sua compatibilidade a prazo mais longo com seus parceiros. Mas as gerações mais jovens podem estar provando que essas histórias estão erradas.
Pesquisadores do University College de Londres (UCL) e da Universidade Saint Andrews, no Reino Unido, examinaram as mudanças de percepção sobre o significado atual de morar junto com um primeiro parceiro em comparação com anos atrás, além da solidez desses relacionamentos.
Utilizando dados de duas pesquisas sobre a situação socioeconômica dos indivíduos no Reino Unido - o British Household Panel Survey e o Understanding Society -, os pesquisadores examinaram uma amostra de 3.233 pessoas de três faixas etárias: os nascidos entre 1974 e 1979, 1980 e 1984 e entre 1985 e 1990, observados entre 1991 e 2016.
A conclusão foi que os hábitos desses grupos com relação a morar juntos e manter relacionamentos apresentam diferenças dramáticas, mesmo com a diferença de idade relativamente pequena entre os grupos estudados.
Em termos de permanência com os parceiros, o grupo que nasceu nos anos 1970 tinha 50% de possibilidade de permanecer junto. Mas os dados dos grupos mais jovens indicaram menos estabilidade a longo prazo.
Ao examinar por quanto tempo os casais permaneciam juntos, concluiu-se que 25 a 27% dos casais nos dois grupos mais velhos separavam-se em até dois anos depois de morarem juntos - enquanto, no grupo mais jovem (os nascidos entre 1985 e 1990), esse percentual saltou para 43%.
A pesquisa também fornece uma ideia das motivações para os casais morarem juntos. Os dados indicam que a maioria das pessoas nascidas nos anos 1970 considerou morar junto pela primeira vez como um período de experiência com os parceiros - uma espécie de "teste para o casamento". Mas os millennials parecem estar menos interessados nessa abordagem "test drive" e consideram a mudança como uma decisão prática.
A principal pesquisadora do estudo, Alina Pelikh, especialista em pesquisas demográficas do UCL, afirma que existem muitas razões para isso, que incluem a conveniência e os benefícios econômicos, além da menor estigmatização sobre morar junto com o parceiro.
Essa conclusão confirma outros dados sobre a aceitação das pessoas que decidem morar juntas. Cada vez mais pessoas aprovam a coabitação, mesmo para parceiros que não têm planos de se casar.
Isso é especialmente válido para as gerações mais jovens. Dados adicionais do Pew Research Center, de 2019, demonstram que mais de três quartos dos jovens com 18 a 29 anos de idade afirmaram que é aceitável que casais não casados morem juntos, independentemente se eles planejam casar-se ou não.
Galena Rhoades, professora de pesquisa em psicologia e diretora do Centro de Pesquisa das Famílias da Universidade de Denver, nos Estados Unidos, concorda que a mudança do comportamento social com relação a morar junto com o parceiro permitiu que as gerações mais jovens adotassem um comportamento mais casual sobre a coabitação, sem considerá-la um período de experiência para o casamento.
"Morar junto está cada vez mais se tornando uma etapa do namoro e não do casamento", segundo Rhoades. Sua pesquisa também indica que os millennials estão menos preocupados com a decisão de morar junto como um caminho rumo ao casamento; os jovens das gerações mais novas relatam que, muitas vezes, eles começaram a viver juntos por acaso.
"Eles não consideram uma decisão ou um evento de compromisso em um relacionamento. E acredito que isso se tornou cada vez mais real ao longo do tempo", segundo ela.
Mudanças com 'rapidez incomum'
Alina Pelikh, do UCL, sugere que os jovens consideram morar junto com um parceiro simplesmente uma alternativa a serem solteiros e que o casamento ou a parceria a longo prazo pode vir a ser considerada apenas depois de anos de relacionamento.
Ela também destaca a velocidade com que essas mudanças aconteceram: "Vemos que existem muitas diferenças entre os mais jovens, mais perto dos anos 1990, e mais perto dos anos 1970".
Pelikh explica que, normalmente, mudanças substanciais de comportamento como essa geralmente ocorrem ao longo de gerações - digamos, entre os anos 1950 e 1990. Mas, neste caso, foram períodos de tempo relativamente curtos.
Ela afirma que discrepâncias significativas entre grupos com apenas cinco anos de diferença de idade (como no estudo britânico) são surpreendentes e indicam que a mudança aconteceu com rapidez incomum.
Pelikh ressalta que os dados do estudo representam apenas parcerias formadas até os 27 anos de idade. Isso é importante porque não sabemos o que se passa com os millennials que moraram junto com seus parceiros pela primeira vez após essa idade.
Ela imagina que esses relacionamentos teoricamente podem ser mais fortes, por serem motivados por fatores como pessoas que se conhecem melhor ou que estão em posição econômica mais estável.
'Visão de conjunto'
Embora tenhamos uma ideia das tendências da geração X e dos millennials, não está claro se a geração Z manterá esses padrões de comportamento.
Alguns sinais indicam que a geração Z continua a ter uma abordagem mais pragmática, da mesma forma que os millennials. De fato, a geração Z também está enfrentando uma situação econômica rigorosa e pesquisas demonstraram que os jovens dessa geração são cada vez mais pessimistas sobre uma eventual recuperação.
Além disso, à medida que a aceitação da coabitação aumentar, a geração Z poderá tomar decisões sobre morar junto com seus parceiros sem se preocupar com o estigma enfrentado por muitos dos seus antecessores.
Em alguns casos, os jovens da geração Z também estão mostrando sinais de priorizar seu estabelecimento como indivíduos antes da formação do casal. Isso pode continuar a retardar a primeira coabitação das gerações mais novas, de forma similar aos padrões observados pelos pesquisadores entre os millennials.
Independentemente de como esse comportamento venha a se desenvolver entre a geração Z, Pelikh acredita que essas descobertas são particularmente pertinentes no momento, já que atingir os marcos da vida não é mais algo linear para as gerações mais jovens. E o fato de suas transições não seguirem os cronogramas ou comportamentos "tradicionais" ainda é estigmatizado.
Em outras palavras, pode ser útil demonstrar a frequência com que os jovens se separam dos seus primeiros parceiros de coabitação, para destruir pelo menos uma parte do julgamento remanescente das gerações mais velhas.
Pelikh acredita que esses dados ressaltam "a complexidade da vida adulta de forma mais ampla" - e potencialmente podem oferecer um suspiro de alívio para as pessoas que se sentem abaladas por não terem seguido o caminho que antes era considerado padrão. "Todos nós vivemos nossas vidas, mas o que não temos é a visão de conjunto", segundo ela.
Pesquisas como estas ajudam a continuar destacando a forma dramática como os acontecimentos marcantes da vida estão se transformando ao longo das gerações. O que pode ter sido significativo para uma geração está mudando rapidamente - e isso pode oferecer um quadro cada vez mais nítido do que será o futuro da idade adulta.
Leia a íntegra desta reportagem (em inglês) no site BBC Worklife.
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