No dia 7 de fevereiro deste ano, o odontopediatra Edson Higa recebeu uma multa do condomínio comercial onde trabalha há cerca de seis meses, em Curitiba (PR), por conta do choro de seus pacientes, cuja maioria é composta por crianças com deficiência. Na última sexta-feira (8/4), uma manifestação em defesa do profissional foi realizada no Bairro Centro Cívico, em frente ao condomínio.
Antes da multa, Edson chegou a receber uma notificação assinada pela síndica no dia 9 de dezembro alegando que o barulho e o choro das crianças extrapolavam o limite de seu imóvel, além de solicitar que ele fizesse um isolamento acústico em seu consultório, o que foi acatado pelo dentista.
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Atendimento humanizado
A multa foi expedida no valor de R$ 332,66, o mesmo da taxa mensal condominial, mas que, em caso de reincidência, poderá ser multiplicada por 10. Segundo o dentista, no dia da notificação, um vizinho bateu na janela para reclamar do barulho do choro de um paciente, que possui paralisia cerebral. "Quando isso aconteceu, liguei para a gerência do prédio e reclamei. Depois, recebi a multa", explica ele.
"É uma tristeza muito grande porque, na realidade, fere meu direito de trabalhar. É um absurdo. Estou sem entender até agora como que pessoas fazem isso. O que sinto é que elas são intolerantes e fico extremamente triste de não poder executar meu direito de atender crianças com necessidades especiais", relata Edson.
Ele também conta que o atendimento desses pacientes, demanda cuidados, e que opta por processos humanizados, evitando que sedações sejam necessárias. "Recentemente, aumentou muito a procura por esse tipo de atendimento, já que não tem especialista que atenda. Eles choram e isso é normal. fez uma pressão para silenciar minhas crianças", explica.
"Durante o atendimento, é preciso toda uma preparação. As crianças precisam de empatia e de tempo para se acostumar ao ambiente. Tenho que contar uma história e sempre faço massagens nas costas e nos pés para se sentirem mais à vontade. Todo cuidado é necessário para fazer o atendimento. Já tentei colocar isolamento acústico nas janelas, mas elas precisam ficar abertas por causa da pandemia. Isso já foi avisado para eles ", relata Edson em entrevista ao UOL.
Segundo a defesa do Centro Comercial Cândido de Abreu, não houve discriminação no caso ou objetivo de prejudicar suas atividades, e que o dentista teria manipulado informações sobre a solicitação do condomínio para que faça melhorias estruturais e confunda a falta de preparo de seu laboratório com a violação aos direitos de seus pacientes.
Manifestação pacífica
Por conta da repercussão das queixas de Edson em seu Instagram, famílias de pacientes e ONGs (Organizações Não-Governamentais) de diversas áreas foram para o Bairro Centro Cívico, em frente ao condomínio comercial onde Edson Higa trabalha para manifestar a seu favor. Os protestos foram pacíficos e ocorreram na última sexta-feira (8/4).
Assim que recebeu a primeira notificação sobre o barulho em seu consultório, no final de 2021, Edson procurou o Conselho Regional de Odontologia do Paraná (CRO-PR). A partir da multa, voltará a procurar auxílio com a instituição. Por orientação jurídica, o odontopediatra não pagou a multa.
"Eu não estou lutando pelo meu consultório. Estou lutando pelas minhas crianças. Elas não precisam ser sedadas para não chorarem. Luto para que possam ser atendidas por pessoas com capacitação", afirma o dentista.
Edson Higa costuma postar em seu perfil do Instagram fotos com os pacientes e dá dicas sobre identificação de algumas deficiências ainda na fase de amamentação das crianças.
Investigação
Nesta terça-feira (12/4), o caso chegou à Comissão de Defesa dos Direitos da Criança, do Adolescente, do Idoso e da Pessoa com Deficiência (Criai) da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep).
Segundo a Alep, o Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente Vítima de Crimes (Nucria), da Polícia Civil do Paraná, já foi noticiado sobre o caso e uma investigação foi solicitada.