Jornal Estado de Minas

RACISMO

Caso Genivaldo: 'Se fosse um branco, não aconteceria', diz irmã da vítima


A família de Genivaldo de Jesus Santos, morto por asfixia dentro de uma viatura na última quarta-feira (25/5) em Umbaúba (SE), afirmou que o racismo contribuiu para que dois agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) executassem o homem de 38 anos. Os diretores da PRF foram exonerados nessa terça-feira (31) e a corporação nega que o afastamento dos oficiais tenha relação com a morte de Genivaldo.





Genivaldo era um homem negro e foi diagnosticado com esquizofrenia, em tratamento há mais de 20 anos. Ele foi morto pelos oficiais Jean Coelho e Allan da Motta Rebello, que soltaram uma bomba de gás lacrimogêneo e spray de pimenta dentro do porta-malas da viatura em que a vítima foi colocada após abordagem, causando asfixia. Ele havia sido parado por trafegar de moto sem capacete.

Depoimento da família


Em entrevista à Folha de S. Paulo, Demarise de Jesus Santos, irmão de Genivaldo, classificou a ação policial como uma barbárie. "São uns marginais, uns assassinos a sangue-frio. O que eles fizeram ali foi só para fazer a crueldade. Não sabia se foi porque meu irmão era pobre e negro, mas depois de ver os vídeos, achei que, ali, foi um preconceito total. Se fosse um branco, não aconteceria aquilo", disse Demarise, que mora em uma casa próxima de onde ocorreu a abordagem.

Segundo a mulher, quando chegou ao local, o irmão já estava morto no porta-malas da viatura. Ela disse ainda que os policiais não chegaram a se intimidar com as câmeras gravando. "Eles tiraram a vida do meu irmão ali. Na hora em que cheguei, ele já estava com os pés brancos, de bruços, todo amarrado. Não teve reação para mais nada. Foi agressão em cima de agressão, barbaridade em cima de barbaridade", afirma.





Segundo a irmã, não houve motivo para que o irmão tenha sido algemado, derrubado e agredido pelos policiais a não ser pelo racismo, já que ele era muito bem-visto pela comunidade de Umbaúba, cidade onde morava desde a juventude. "O que sinto sobre esse caso é que realmente é racismo, não tem outra palavra", diz.

Maria Fabiana dos Santos, a viúva de Genivaldo, também apontou a raça da vítima como elemento determinante para que o assassinato ocorresse, já que o marido não desrespeitou os policiais ou perdeu o controle em momento algum, sendo a reação desproporcional. "Ele se considerava negro, então creio que o racismo tenha contribuído, sim. O negro é indefeso", afirmou ela.

"Espero que a justiça seja feita. Que os policiais sejam presos e que eles paguem pelo crime que eles cometeram. Meu marido era inocente, uma pessoa maravilhosa e que só fazia o bem", completou.

Resoluções do caso


A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pediu prisão cautelar dos policiais, mas os oficiais seguem em liberdade. Os nomes dos envolvidos foram revelados: Kleber Nascimento Freitas, Paulo Rodolpho Lima Nascimento e William de Barros Noia, três dos cinco agentes da PRF que trabalhavam no patrulhamento durante a Operação Nordeste Seguro na última quarta-feira (25).





Em boletim de ocorrência, os agentes admitiram o uso do gás lacrimogêneo dentro do carro, mas negaram que a morte da vítima tivesse relação com a abordagem policial. Apesar disso, o laudo do Instituto Médico Legal (IML) apontou que a vítima sofreu de insuficiência respiratória aguda provocada por asfixia mecânica, e testemunhas disseram que Genivaldo foi agredido por cerca de 30 minutos antes de ser levado ao hospital pelos policiais.

Nesta terça-feira (31), a direção-geral da PRF criou uma comissão interventora na superintendência regional da corporação em Sergipe para investigar a morte de Genivaldo. Outra comissão, com servidores de outros estados, deve acompanhar o PAD (Processo Administrativo Disciplinar) a que os três policiais envolvidos no caso respondem internamente.

Também nesta terça-feira (31/5), as exonerações de Coelho e Rebello foram publicadas no Diário Oficial da União (DOU), sem apresentação de justificativa.

A PRF nega que as dispensas tenham relação com a morte de Genivaldo, afirmando que, antes de o assassinato ocorrer, ambos foram nomeados oficiais de ligação da corporação no Colégio Interamericano de Defesa, localizado nos EUA.





Os agentes teriam solicitado as dispensas há cerca de 10 dias, mas só foram efetivadas agora por conta da burocracia.

À TV Globo, Fredson Vital, delegado da Polícia Federal que está conduzindo a investigação, disse que não vê razão para prender os policiais. "A investigação está em andamento, está fluindo, a polícia rodoviária está contribuindo desde o início, então, a meu ver, não tem motivo para pedido de prisão dos policiais."

A Polícia Federal tem 30 dias para concluir a investigação.

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