No mês do Orgulho LGBTQIA, o debate acerca da inclusão de perguntas referentes à identidade de gênero e à orientação sexual no censo 2022 ganha um novo capítulo. Nesta quinta-feira (09/06), o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) anunciou que recorreu da decisão Justiça Federal do Acre e que não é possível incluir a população LGBTQIA no recenseamento que terá início no dia 1º de agosto.
“A menos de dois meses do início da operação do Censo Demográfico 2022, não é possível incluir no questionário pergunta sobre 'orientação sexual/identidade de gênero' com técnica e metodologia responsáveis e adequadas - muito menos com os cuidados e o respeito que o tema e a sociedade merecem”, informa o IBGE em comunicado.
No comunicado, o instituto ainda afirma que a discussão e elaboração dos questionários e sucessivos planejamentos e preparações se iniciaram em 2016 e que a inclusão das perguntas causará aumento nos custos e adiamento da pesquisa.
O sentimento de Gregory Rodrigues Roque de Souza, coordenador nacional de comunicação da Aliança Nacional LGBTI, é de abandono.“Estou cansado de me sentir apagado pelo governo, me sentir inexistente na hora de produzir política pública, de ter hoje meus direitos conquistados apenas porque a Suprema Corte do meu país decidiu e não porque aquelas pessoas que eu votei para me representar lá decidiram e legislaram a favor da população da qual eu faço parte”, declara Gregory.
IMPACTOS NA COMUNIDADE LGBT
O pedido de inclusão da população LGBTQIA no censo brasileiro não é uma novidade. Em 2000, o Grupo Gay da Bahia solicitou a inclusão do item “orientação sexual” no questionário e em 2020 a Aliança Nacional LGBTQIA encaminhou ao IBGE um oficio solicitando a inclusão da população LGBTQIA no censo e falando sobre a importância desse dado e como um levantamento desse porte influencia na construção de políticas públicas. Ambos os pedidos não foram atendidos.
A falta de dados no Censo 2022 sobre a população LGBT pode impactar no desenvolvimentos de políticas públicas para essa parcela da população que ainda sofre preconceito, contribuindo para que permaneçam marginalizados e sem direitos de igualdade garantidos.
“Nós pessoas LGBTQIA sofremos apagamento durante toda a nossa história. Já há 20 anos que nós lutamos, que nós pedimos ao poder público e ao IBGE, e, agora, mesmo com uma decisão judicial, eles recorrem. Agora vem com essa desculpa de que não é possível? Isso não é uma demanda nova”, afirma Gregory.
OUTRAS PESQUISAS
No comunicado publicado pelo IBGE, o instituto afirmou que os quesitos relacionados à “identidade de gênero” e “orientação sexual” já estão previstos para investigação no conjunto de pesquisas que compõem o Sistema Integrado de Pesquisas Domiciliares do IBGE, entre eles a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS).
Os dados coletados em 2019 mostram que 1,9% da população brasileira se identifica como homossexuais ou bissexuais o que corresponde a 2,9 milhões de pessoas de 18 anos ou mais. Entretanto, 1,1% da população (1,7 milhão de pessoas) disse não saber responder à questão e 2,3% (3,6 milhões) se recusaram a responder.
Gregory Rodrigues afirma que o método usado pela PNS é falho, pois uma única pessoa pode responder por todos os residentes da casa, o que pode levar a uma subnotificação. “A falha dessa pesquisa, a meu ver, figura dentro da questão da subnotificação. Quando nós falamos de Brasil, nós falamos de um país preconceituoso. O maior problema nessa situação é esse. O pai que não aceita o filho, o filho que tem medo de se assumir, entre N situações de não aceitação, de pessoas que ainda temem em se assumir para a própria família”, explica.
POSSIVEIS SOLUÇÕES
A possibilidade de subnotificação também é possível de ocorrer no recenseamento, mas Gregory acredita que o uso da tecnologia para se aproximar da população pode ser uma solução que gere um resultado mais próximo da realidade. Em Portugal, por exemplo, o censo realizado em 2021 contou com a utilização de plataforma online, permitindo a coleta de dados em meio á pandemia sem o risco de expor a população ao vírus.
Gregory propõe a permanência de agentes de campo onde a conexão com a internet ainda é escassa, e a utilização de app ou site para a população em capitais e regiões com fácil acesso à internet. Através de um cadastro por CPF, é possível garantir que cada cidadão responda uma única vez a pesquisa.
“A tecnologia deveria ser uma ferramenta que deve ser utilizada em conjunto com as agentes do censo, para possibilitar uma resposta mais exata e mais tranquila por parte da população. Porque aí as pessoas vão se sentir seguras para responder, sem nenhum fator externo que possa estar pressionando a pessoa”, defende Gregory.
*Estagiária sob supervisão.
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