Jornal Estado de Minas

AFASTAMENTO PROVISÓRIO

MPMG alega 'violação de direitos' ao afastar mãe que levou filha à umbanda


Uma mãe foi impedida de ter contato com a filha de 13 anos depois de levá-la a uma casa de umbanda na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A situação perdura há quase um mês, quando, no dia 20 de maio, a 2ª Vara da Infância e Juventude de Ribeirão das Neves determinou que a adolescente ficasse em um abrigo municipal. O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e o Conselho Tutelar (CT) da cidade de 341 mil habitantes afirmam, em nota enviada ao DiversEM, ter havido "desvirtuamento da realidade fática".



O MPMG alega ter adotado providências imediatas visando à proteção da adolescente quando tomou conhecimento do caso em 20 de maio. “As informações colhidas nessa fase inicial das investigações apontavam diversas violações de direitos, notadamente à saúde, já que ela estaria sendo submetida a lesões corporais, ingestão de bebida alcoólica, restrição da liberdade de ir e vir e omissão de tratamento por equipe de saúde”.

Conforme o Ministério Público, a filha de Liliane foi levada em situação emergencial a um acolhimento institucional por não haver indicação de outros familiares que pudessem assumir sua guarda.

“Iniciado o trabalho pela equipe técnica do serviço de acolhimento, foi apontada a possibilidade de sua colocação sob a guarda da família extensa. A 8ª Promotoria de Justiça esclarece que continuará atuando com a finalidade de proteger a infante de violações aos seus direitos, até que as intervenções necessárias possibilitem a avaliação acerca de reintegração familiar segura ou colocação em família substituta”.

Já o Conselho Tutelar de Ribeirão das Neves disse ter garantido a inviolabilidade do direito à vida e lamentou o "desvirtuamento da realidade fática". “As providências não foram tomadas pelo fato da adolescente ter sido levada a um ritual religioso, mas sim pela notícia de violação de direitos”.




Defesa cita intolerância religiosa


Segundo a defesa de Liliane dos Santos, mãe da adolescente, o documento do MPMG enviado ao juiz contém afirmações que podem indicar um caso de intolerância religiosa. O órgão propôs a retirada da guarda de filha, de 13 anos, em razão de ela ter feito um tratamento espiritual na umbanda.

Liliane também acredita que esteja sofrendo intolerância religiosa. Ela conta ter sido reportada ao Conselho Tutelar quando a filha foi para a Escola Estadual João Lopes Gontijo usando guias e colares de proteção dos orixás.

"Tudo começou na escola. A direção que me denunciou para o Conselho Tutelar. A diretora me chamou para dizer que minha filha tinha que esconder as guias, que ninguém tinha que ficar vendo aquilo". 
 
A diarista recebeu uma convocação para que pudesse comparecer com a filha ao CT no dia 20 de maio, às 8h. No encontro, de acordo com Liliane, as conselheiras a acusaram de maus-tratos à jovem, não a deixaram falar e a trataram como se tivesse cometido um crime.





"Cheguei do serviço. Levei minha menina ao Conselho Tutelar e tomaram ela de mim. Não falaram para onde a levariam. Me deram um papel pequeno com o endereço onde a menina está. Já me levaram para a delegacia para fazer boletim".

Frequentadora antiga da umbanda, Liliane diz que a adolescente estava em tratamento espiritual, mas sem risco à sua integridade física.

A diarista também tentou visitar a filha no abrigo, mas, no momento, está sem nenhuma comunicação com a garota. "Eles não atendem meu telefone mais, não respondem".

A defesa da mãe informou que o boletim de ocorrência registrado por conselheiras tutelares, depois da denúncia da escola, menciona cicatrizes com características bem menos invasivas do que a circuncisão em crianças judias ou muçulmanas. No mesmo boletim, Liliane é acusada de sequestro e cárcere privado da própria filha.



Íntegra dos comunicados

Conselho Tutelar de Ribeirão das Neves


Em atendimento à solicitação desta ilustre Central de Jornalismo, o Conselho Tutelar de Ribeirão das Neves, Regional Justinópolis vem prestar esclarecimentos quanto à reclamação encaminhada pela genitora informada.

Em que pese alegações da genitora de que perdeu a guarda de sua filha devido a racismo religioso, cabe esclarecer que no caso da menor, o Conselho tutelar atuou para garantir a inviolabilidade do direito à vida.

Reiteramos o respeito à liberdade de crença e culto previsto no art. 5o, inciso VI da Constituição, porém, a denúncia apurada pelo Conselho foi promovida para garantir o previsto nos Art. 5° e 7° do Estatuto da Criança e do Adolescente que assim dispõe:

Art. 5° Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, VIOLENCIA, CRUELDADE e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.




Art. 7° A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.

Quanto ao afastamento provisório da menor do convívio materno esclarecemos que não se trata de medida definitiva, haja vista que tal medida é tomada excepcionalmente e com autorização do Ministério Público.

Em que pese insatisfação materna quanto ao procedimento realizado por este Conselho e alegação de racismo religioso, reafirmamos que este Conselho atuou no caso em defesa da menor.

Lamentamos que tenha havido desvirtuamento da realidade fática (uma vez que as providências não foram tomadas pelo fato da adolescente ter sido levada a um ritual religioso e sim pela notícia de violação de direitos.





O caso concreto não será objeto de discussão e notícia na presente, haja vista tratar-se de caso sigiloso que foi devidamente encaminhado à autoridade judiciária e segue em segredo de justiça.

MPMG - 8ª Promotoria de Justiça de Ribeirão das Neves


Sobre o caso, a 8ª Promotoria de Justiça de Ribeirão das Neves esclarece que tomou conhecimento dos fatos no dia 20 de maio deste ano, por meio do Conselho Tutelar, tendo imediatamente adotado providências visando a proteção da adolescente, já que as informações colhidas nessa fase inicial das investigações apontavam diversas violações de direitos, notadamente à saúde, já que ela estaria sendo submetida a lesões corporais, ingestão de bebida alcoólica, restrição da liberdade de ir e vir e omissão de tratamento por equipe de saúde. Como não havia indicação de outros familiares que pudessem assumir a guarda, diante da situação emergencial, foi realizado o acolhimento institucional.

Iniciado o trabalho pela equipe técnica do serviço de acolhimento, foi apontada a possibilidade de sua colocação sob a guarda da família extensa (formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade), tendo o MPMG, em atenção ao princípio da intervenção mínima, requerido tal medida no último dia 7, sem prejuízo do prosseguimento do feito.





O Ministério Público de Minas Gerais salienta que respeita a expressão religiosa. Este direito, entretanto, deve ser compatibilizado com os demais, lamentando que tenha havido desvirtuamento da realidade fática (uma vez que não houve adoção das providências porque a adolescente foi levada a um ritual religioso, mas sim, como já dito, pela notícia de violação de sua integridade física, restrição de liberdade e omissão de busca por tratamento de saúde).

A 8ª Promotoria de Justiça, por fim, esclarece que continuará atuando com a finalidade de proteger a infante de violações aos seus direitos, até que as intervenções necessárias possibilitem a avaliação acerca de reintegração familiar segura ou colocação em família substituta.
 

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*Estagiária sob supervisão do subeditor Rafael Arruda