Jornal Estado de Minas

MÃO NA MASSA

Programas de aceleração abrem espaço para mulheres na construção civil


O setor da construção civil costuma ser associado aos homens. No entanto, há um movimento que busca por mais diversidade nos canteiros das obras, contratando e acelerando carreiras de mulheres e pessoas LGBTQIA+. O mercado para mulheres no setor cresceu cerca de 120% de 2007 a 2018, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), passando de 109 mil trabalhadoras para 239 mil num período de 10 anos.




 
São mais de 190 mil engenheiras civis atuando em obras em todo o Brasil, segundo o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea). O Painel da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério do Trabalho, mostra um aumento de 5,5% em 2020 no número de mulheres trabalhando na construção civil, no comparativo com o ano anterior. 
 
"Ainda tem uma queixa do público feminino que a voz não é tão ouvida e respeitada. Ela pode estar em campo, mas não é tão ouvida e respeitada", afirma Elizabeth Aparecida de Souza Rodrigues, executiva de gente e gestão da Vedacit, que esteve em Belo Horizonte na ampliação da operação da empresa em Minas. A executiva lembra que ainda é comum que uma mulher dê uma opinião sem que seja levada a sério.

"O homem fala e tem mais voz. Então, temos empoderado a mulher. Ela tem tanta voz quanto. E não precisa de sombra. Dando o espaço que ela precisa e não precisa de sombra". 
 
A executiva se vê encarregada da tarefa de inspirar outras mulheres a chegarem em altos postos nas empresas. "Minha tarefa é que as pessoas olhem para mim e digam 'existe possibilidade. Eu posso chegar lá' E puxar outras pessoas junto comigo. Estamos puxando mais mulheres". A empresa preferencialmente define vagas para esses grupos de afinidade.




 

Governança para a diversidade

Elizabeth Aparecida de Souza Rodrigues, executiva de gente e gestão da Vedacit (foto: Arquivo pessoal)

A empresa criou uma governança de diversidade com metas para acelerar o desenvolvimento de cinco grupos: gênero, raça, etarismo, LGBTQIA+  e pessoas com deficiência. Cada um desses segmentos participa do comitê, com seis representantes, para fazer diagnóstico e propor soluções para tornar o ambiente de trabalho mais acolhedor.
 
"Eles dizem o que a organização precisa fazer para que se sintam mais incluídos e melhor preparados no mercado de trabalho. A diversidade é onde está o nosso melhor potencial. Você só é bom se você é aquilo que você é".
 
Mulher branca, classe média, Elizabeth destaca que é preciso convocar os funcionários de diversos perfis para fazer essa mudança. "Temos que ter grupos representativos que nos ajudem a entender sobre o lugar de cada um deles e o que a empresa precisa fazer de diferente e melhor".




 
A "Declaração à diversidade" orienta a empresa na busca por um corpo de colaboradores mais plural. "Queremos um quadro representativo da sociedade em que a gente vive, opera e trabalha", diz Elizabeth. A executiva defende uma mudança impulsionada. "Tem que ser planejado, não pode ser tão orgânico, senão demora muito". 
 
Alguns grupos já apresentam avanços nesse processo, como as mulheres. "O gênero é o grupo mais avançado. O etarismo é bem avançado também, na perspectiva de 50 mais. O etarismo para baixo é tão importante quanto, o menos 25."
 
No que se refere à representatividade negra, ela lembra que há um grande número de funcionários pardos, mas é preciso fomentar o crescimento e a promoção neste segmento. "Eles ainda estão muito na base da pirâmide", afirma que a empresa promove programas para acelerar a subida na pirâmide desse grupo. A empresa também trabalha para resolver a falta de pessoas com deficiência.




 
"Temos um turn over que precisamos aprender a lidar com ele é a pessoa com deficiência. Temos uma meta de 7% do nosso quadro de pessoas com deficiência", diz.
 
Para isso, é preciso pensar em treinamentos do gestor, dos colegas e da própria pessoa com deficiência. Ela defende que é preciso olhar para a especificidade de cada grupo para que as pessoas possam desenvolver todo o potencial. "Que cada um fale dentro da sua necessidade do que ela precisa"
 

Programas para acelerar

Fabiane Argolo é pós-graduada em Engenharia de avaliações e Perícias e em engenharia diagnóstica (foto: Vedacit)

As empresas devem fazer um investimento na formação, a contratação, uma escuta e o empoderamento. Em algumas situações, são realizados processos seletivos às cegas. Outro caminho é acelerar as carreiras por meio de programas de desenvolvimento, como o Mulher em foco, profissionais que estão próximas de serem promovidas a gerentes, para que tenham mentoria e programas de desenvolvimento. Também há vagas exclusivas. 
 
A engenheira Fabiane Argolo recebe incentivo na Vedacit para acelerar a carreira, com pós-graduação em engenharia de avaliações e Perícias e em engenharia diagnóstica.
 

Mulheres à frente de startups

A arquiteta Luana Tosatti, de 27 anos, diretora de operações na ConstruCode, vê uma mudança em curso no ramo da tecnologia para a construção civil. Ela tem papel de destaque numa startup voltada para o setor - uma plataforma inteligente para gestão de processos da obra que elimina informação defasada no canteiro de obras.

Luana Tosatti está à frente da startup ConstruCode (foto: Arquivo pessoal )

"Nesse segmento, temos um papel ainda muito menor da mulher. A gama de investidores é muito masculina. As pessoas investem mais em startup que homens estão à frente. Tem estudos que dizem que um mesmo pitch feito por um homem é muito mais investido do que uma startup que tem uma mulher à frente fazendo o mesmo pitch. Essa desigualdade a gente vê a todo momento dentro do mercado de startup". Ao falar de pitch ela se refere à sessão para apresentar uma proposta para financiadores.




 
Luana se interessou por tecnologia na obra em que ela trabalhava e a partir daí avaliou que poderia comandar uma empresa de tecnologia na área da construção civil. "Temos muita engenheiras e arquitetas que estão à frente de construtoras", afirma.
 
Uma das medidas de Luana na startup foi promover uma linguagem mais inclusiva. A primeira ação quando assumiu o cargo de liderança foi mudar toda a linguagem para uma linguagem não sexista. "Todo mundo fala do encarregado, do engenheiro, o mestre de obra, mas tem que falar do time de engenharia, do time de arquitetura, o time de campo, porque tem mulheres envolvidas."