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Estado de Minas TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

A luta de mães com filhos autistas para conseguir diagnóstico

Invisibilidade do transtorno faz com que crianças não sejam diagnosticadas precocemente, comprometendo seu desenvolvimento


22/07/2022 15:29 - atualizado 22/07/2022 15:29

Diversas peças de quebra cabeças brancas cobrindo toda a superfície da foto e uma peça azul clara com um coração amarelo no centro se destacando das demais
O diagnóstico precoce é a melhor forma de garantir suporte e inclusão para crianças com autismo (foto: Tara Winstead)


Para crianças com transtorno do espectro autista (TEA), é extremamente importante que o diagnóstico seja feito o mais cedo possível, de preferência antes dos 2 anos de idade. Entretanto, no Brasil a média de idade para diagnosticar é de 6 anos. Esse atraso gera  grandes prejuízos ao longo da vida da pessoa com autismo. O ideal é a intervenção precoce, sendo possível oferecer mais recursos para que a criança tenha melhores condições de se comunicar, se expressar e lidar com o ambiente.

Tão importante quanto a necessidade de os pais estarem atentos ao comportamento dos filhos é a intervenção de profissionais capacitados para fazer o diagnóstico do transtorno do espectro autista e conduzir terapias que realmente vão auxiliar as crianças com autismo. Mas esse processo não é simples e nem todas as mães conseguem o diagnóstico precoce dos filhos.

“Apesar de ele ser uma criança de só sete anos, há seis anos atrás era muito difícil conseguir um diagnóstico precoce. Eu percebo que de dois anos pra cá está muito maior o número de diagnósticos precoces do que no período dele”, comenta a psicopedagoga e professora municipal Erika Santiago, mãe do Miguel.

“Muito focado em objetos”


Erika e seu filho Miguel, de sete anos, ao ar livre
Erika percebeu que o filho era diferente aos 8 meses de idade (foto: Arquivo pessoal)


Erika percebeu diferenças no Miguel aos 8 meses. As pessoas tentavam chamar a atenção dele, mas ele olhava para outros lugares. “Coisas que já fazia dentro de casa, como bater palminha ou mandar beijo, eu pedia para mostrar para uma tia, uma avó, pessoas com as quais ele tinha vínculo, e ele não mostrava. Muito focado em objetos, já prestando atenção mais em objetos do que em pessoas, a não ser em casa comigo e com o pai”, conta.

Entre Erika perguntar ao pediatra que acompanhava seu filho se ele era autista, conseguir o encaminhamento para um neuropediatra e passar por dois psiquiatras para ter o diagnóstico fechado, Miguel já estava com três anos e três meses.
“Naquela época, nós olhamos um neuropsiquiatra bom na área do autismo que estava dando diagnóstico precoce, mas custava em torno de R$ 1.500 a consulta. Então, a gente tentou via plano de saúde. A primeira consulta com o neuropediatra para o Miguel foi liberada um ano depois.” 


Em duas consultas com neuropediatras, Erika e o marido ouviram que estava tudo normal e que tinham de esperar o tempo da criança. Tentaram um psiquiatra e, com insistência com o plano de saúde, conseguiram consulta quando Miguel tinha 2 anos e 7 meses, na qual se levantou a hipótese de TEA, mas sem fechar diagnóstico. Foi nesse momento que conseguiram encaminhamento para a fonoaudióloga, pois o menino já apresentava atraso de fala significativo.

Vendo a vida com outros olhos

“No senso comum, a gente pensava que a pessoa autista estava fechada no seu mundinho, mas não é nada disso, elas querem participar, as crianças querem conviver com outras crianças, querem brincar, mas elas não sabem como fazer. Elas têm dificuldade de, às vezes, controlar alguns impulsos e filtrar o excesso de estímulo que a gente recebe o tempo todo”, explica Maria Luísa Magalhães Nogueira, psicóloga e professora do departamento de psicologia da UFMG.

Maria Luísa é mãe de um menino de 10 anos, o Francisco, diagnosticado com autismo com 1 ano e 11 meses. Além disso, desenvolve pesquisas e projetos de extensão na temática Transtornos do espectro autista e é co-coordenadora do Laboratório de Estudo e Extensão em Autismo e Desenvolvimento (LEAD) e do Programa de Atenção Interdisciplinar ao Autismo (PRAIA), ambos vinculados à UFMG.

Importância do diagnóstico precoce

Maria Luísa conta que Francisco estava com atraso de fala, falando apenas poucas palavras, não fazia muito contato visual e apresentava distúrbio de sono. Algumas crianças também podem apresentar atraso nas habilidades motoras. Ela ressalta que é importante entender que esses sinais não dizem respeito à ausência completa de algumas dessas habilidades, mas da qualidade delas.

“Mesmo sendo psicóloga e trabalhando no campo da diferença, foi um impacto em um primeiro momento. A gente leva um tempo para processar que o nosso filho amado é diferente do filho esperado. Ao longo do tempo a gente vai conseguindo organizar a experiência de uma forma a abraçar e afirmar a diferença, até mesmo porque é a diferença que nos faz humanos”, conta Maria Luísa.

Maria Luísa, seu marido e os dois filhos sentados em um banco de ferro pintado de branco em um jardim
Maria Luísa e sua família dão todo o apoio necessário a Francisco, o filho mais novo, que tem TEA (foto: Arquivo pessoal)


É muito importante que a criança saiba imitar, que olhe para as pessoas, que preste atenção, porque grande parte do que aprende nos primeiros anos de vida é através da observação. Se uma criança não está prestando atenção no mundo ela vai deixando de aprender e isso vai aumentando esse atraso no desenvolvimento e gerando uma cascata de prejuízos.

“O autismo não é uma doença a ser curada”


“A ideia da intervenção precoce não é fazer com que essa criança se torne uma criança típica, porque isso é impossível. O autismo não é uma doença a ser curada, é um transtorno no neurodesenvolvimento que traz para essa pessoa uma outra forma de organizar a experiência a partir de um cérebro que tem uma organização um pouco diferente”, explica a pesquisadora.

Para auxiliar a detectar os sinais de autismo, existe um recurso na caderneta de saúde da criança, onde se encontra o cartão de vacinação, no qual os pediatras devem registrar o desenvolvimento neuropsicomotor, tanto quando registram a altura, peso e crescimento encefálico.

Segundo Maria Luísa, menos de 20% das cadernetas de saúde das crianças têm esse acompanhamento, levando a atrasos no diagnóstico, o que é muito negativo, uma vez que nos primeiros anos existe uma maior plasticidade cerebral, sendo muito mais fácil ensinar para as crianças as habilidades que têm dificuldade.

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