Os negros estão sub-representados nos parlamentos brasileiros, desde o Congresso Nacional às câmaras municipais, passando pelas assembleias legislativas. A dificuldade para entrar na política institucional começa já na campanha, quando as lideranças negras não dispõem de financiamento. No entanto, a Coalizão Negra por Direitos pretende mudar esse cenário.
A entidade lançou o "Quilombo nos parlamentos", iniciativa que reúne 120 candidaturas de pessoas ligadas ao movimento. Desse total, 20 candidaturas são de representantes quilombolas. De caráter suprapartidário, a iniciativa reúne candidaturas negras pelo PT, PSOL, PCdoB, PSB, PDT e Rede. São ao menos 30 pré-candidaturas à Câmara dos Deputados e o restante às assembleias legislativas do Distrito Federal e de 17 estados, entre eles Minas.
O objetivo é ampliar a representatividade negra no poder legislativo. "A ideia é 'aquilombar' a política. Trazer a resistência negra para dentro da política", afirma a advogada Sheila Carvalho, diretora de incidência política do Instituto de Referência Negra Peregum e integrante da Coalizão Negra por Direitos.
De acordo com a Coalizão Negra, dos 513 deputados federais apenas 21 são negros. Essa representatividade no Congresso Nacional está longe de espelhar o percentual de negros na população brasileira que, de acordo como o Instituto de Geografia e Estatística (IBGE), é de 54,1%.
A articulação defende reivindicações históricas do movimento negro na luta antirracista. "Trata-se também de uma representatividade de lutas do movimento negro na política, pessoas que estejam comprometidas com uma agenda de defesa da vida da população negra para ocupar esses cargos", avalia Sheila. A proposta pretende incidir na política institucional, com o fortalecimento de políticas de ação afirmativa.
Fundo partidário
Em 2021, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou que 30% do fundo partidário devem se destinados às candidturas negras dos partidos. O tribunal também estabeleceu que esses candidatos têm direito a 30% do tempo de TV da propaganda eleitoral gratuita. "Há sempre uma dificuldade para que essas medidas sejam implementadas pelos partidos", afirma Sheila.
O TSE determinou que os votos para candidaturas de mulheres e negoras oara para a Câmara dos Deputados, nas eleições de 2022 e 2030, sejam contabilizados em dobro para distribuição dos 30% do fundo eleitoral.
"O voto mulher e o voto negro têm peso dois. O que isso significa? Que a cada voto para mulher e para pessoas negras que o partido receber, ele terá mais recursos no fundo partidário nos ciclos eleitorais seguintes", informa Sheila.
A determinação, na avaliação dela, é uma forma de barrar candidaturas "laranjas" ou seja de candidaturas que não sejam de fato de mulheres e pessoas negras.
Dificuldade das candidaturas negras
O estudo 'Candidaturas negras para cargos proporcionais" apontou que a falta de recursos é uma das principais barreiras enfrentadas por lideranças negras que tentam atuar na política institucional. Outra barreira é o medo de sofrer violência. As lideranças negras ainda apontam a dificuldade de equilibrar as demandas da vida privada com as exigências de uma campanha.
Segundo o estudo, as novas regras de financiamento de campanha não tiveram efeito no que diz respeito às candidaturas negras. A fatia de recursos direcionada a candidatos brancos é 3,4 vezes maior que a de homens negros, 3,2 vezes a das mulheres brancas e quase seis vezes superior à das mulheres negras.
O estudo ainda apontou que a desigualdade na distribuição de recursos na campanha se reflete na desigualdade de sucesso eleitoral dos candidatos. Homens brancos conquistaram 65% das vagas para deputado estadual, em 2014, e 61%, em 2018. No entanto, homens brancos representam 21% do total da população brasileira.
Nas disputas para o cargo de deputado federal, homens brancos foram eleitos em número quatro vezes maior do que homens negros, seis vezes maior que mulheres brancas e mais de 20 vezes maior que de mulheres negras.
O estudo foi elaborado pelo Instituto de Referência Negra Peregum e Laboratório de Estudos da Mídia e Esfera Pública. A pesquisa baseou-se em dados do TSE e entrevistas em profundidade com 30 lideranças negras.