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Estado de Minas ELEIÇÕES 2022

Candidatas quilombolas em MG: 'precisamos da nossa comunidade na política'

Atualmente, não há quilombolas ocupando as esferas de maior poder institucional; há perspectiva de mudança em 2022


30/09/2022 15:09 - atualizado 30/09/2022 16:07

Imagem do lançamento do movimento Quilombo no parlamento
MG tem quatro candidaturas quilombolas (foto: Quilombos no parlamento/Divulgação)
Minas Gerais tem quatro candidaturas quilombolas para cargos de deputada estadual e federal nas eleições de 2022. Todas são mulheres e concorrem por partidos de esquerda (PT, PSOL e PDT) para tentar ocupar, pela primeira vez na história da democracia brasileira, as esferas de maior poder institucional. No Brasil, foram mapeadas candidaturas quilombolas em apenas 13 das 27 unidades federativas.

Edna Gorutuba (PT), Lara Luisa (PDT), Juhlia Santos (PSOL) e Maria Alves (PT) são os nomes que representam a defesa de povos e terras quilombolas em Minas Gerais. Além de defenderem pautas voltadas para o bem-estar socioeconômico das minorias, pretendem representar suas comunidades no poder público, que nunca teve deputados quilombolas  nas esferas nacional e estadual.

“Sempre tivemos esse anseio de colocar um nome que representasse a população quilombola na política, e entendemos que esse era o momento. A gente vem sofrendo vários ataques, vários retrocessos em relação às políticas públicas, principalmente direcionada à população negra quilombola, e apesar de termos muitas pessoas parceiras, precisamos de alguém que pertença à nossa comunidade e que tenha propriedade para discutir e criar políticas públicas e leis que venham a nos defender”, explica Edna, candidata a deputada federal.

As candidatas

Edna Gorutuba, candidata a deputada federal, é mulher negra quilombola, mãe de cinco filhos e avó. Já aos 5 anos de idade, serviu de barreira humana no enfrentamento da grilagem de terra no Quilombo do Gurutuba e, durante a adolescência e início da vida adulta, trabalhou como empregada doméstica, diarista e catadora de materiais recicláveis. Graduada em Serviço Social, foi a única brasileira a conseguir uma bolsa de aprendizagem do DGM-Global do Banco Mundial e, hoje, é líder e militante dos direitos quilombolas.

Ela defende a pauta da igualdade racial, social e de gênero, além do fortalecimento da agricultura familiar, da saúde e da educação. Já atuou como vice-presidente da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos); coordenadora da Coqui’norte (Comissão das Comunidades Quilombolas do Norte de Minas Gerais); e presidente da Federação Quilombola, afastada em razão de sua candidatura em 2022.

Para Edna, sua candidatura é um desafio por muitos fatores, que envolvem conflito de interesses no parlamento e até mesmo dentro do partido. “Ter um quilombola nesse espaço onde se retira nossos direitos é ter um instrumento de defesa de luta do nosso povo”, comenta. “Não só o PT, mas todos os partidos não querem que a negritude ocupe esses espaços políticos, porque já diz o ditado ‘Quando a senzala aprende a ler, a Casa Grande pira’. Eu encontrei o desafio de consolidar meu nome enquanto candidata porque decidiram me podar em questão de recursos por ter me recusado a me aliar a mulheres ou homens brancos para receber meu recorte do setorial de combate ao racismo”, complementa.


Lara Luisa, candidata a deputada estadual, é a criadora da primeira linha de pesquisa científica sobre quilombolas no Brasil, mestre em Educação, empresária, palestrante e mãe. Foi a primeira mulher negra a disputar a prefeitura de sua cidade natal, Paracatu e criou, lá, a Bolsa Faculdade.

Ela, que é vice-presidente da Federação Estadual dos Quilombolas, defende pautas voltadas para educação, saúde, proteção da mulher e empreendedorismo local, além da defesa dos direitos quilombolas. “Aqui em Paracatu, temos a maior mineradora de ouro a céu aberto, e ela fica dentro de uma comunidade quilombola. O dinheiro vai todo para os cofres da prefeitura e nada volta para a comunidade, então foi aí que vi a necessidade de nós [quilombolas] ocuparmos o espaço da política”, explica ela.

Lara também conta que há cerca de 12 comunidades quilombolas em sua cidade, mas que, por conta da não demarcação de terras, muitos territórios foram perdidos. “Nós ganhamos o testamento em nome da minha bisavó de uma terra que era nossa, mas construíram uma cidade em cima da nossa comunidade. Meu tataravó, Ambrósio, liderou 57 comunidades quilombolas. Patos de Minas, Uberlândia e Araxá eram terras quilombolas que foram invadidas. Nossos arquivos foram queimados, mas a UFMG e a OAB estão nos ajudando a recuperá-los”, afirma.

 
Juhlia Santos, cocandidata a deputada estadual pela bancada Mulheres Negras Sim, é mulher travesti e única quilombola da candidatura coletiva, que conta com mais duas mulheres negras: Lauana Chantal e Tainá Rosa. Suas pautas defendem a cultura, o direito das mulheres e o combate ao racismo e à LGBTfobia.
 
Em suas falas, costuma defender o 'enegrecimento' e o 'aquilombamento' dos parlamentos. "Somos nós as maiorias sociais e não estamos representadas na política institucional, nem nas mesas de negociação onde são decididos orçamentos e recursos. Consequentemente, as políticas públicas não chegam até nossas comunidades, aldeias, quilombos e favelas. Chega de falarem por nós. Conhecemos as necessidades dos nossos grupos sociais. Nós estamos lado a lado com nossas comunidades", afirma o manifesto da candidatura.

 
Maria Alves, candidata a deputada estadual, é assistente social, educadora popular, agricultora familiar e mãe de quatro filhos. Nascida e criada no Quilombo Santa Cruz, localizado no Vale do Mucuri, em Ouro Verde de Minas, é fortemente ligada aos trabalhadores rurais, e sua militância sempre foi voltada para movimentos sociais sindicalistas e quilombolas.

Já atuou como conselheira de Saúde de Minas Gerais e é, atualmente, conselheira  licenciada do Conselho Estadual de Saúde e Segurança Alimentar e Nutricional, e secretária agrária do PT de Minas Gerais e do Coletivo Agrário Nacional. Maria defende pautas voltadas para direitos sociais e humanos, qualidade de vida de jovens, idosos e trabalhadores do campo, além de saúde, lazer, cultura e educação.

“Somos mais de 1 mil comunidades quilombolas no estado de Minas Gerais e, ainda hoje, não temos uma quilombola parlamentar, eleita na Assembleia Legislativa. Caso eleita, serei, ainda, uma representatividade dupla, porque também não temos uma trabalhadora rural na Assembleia. Eu me vejo, na verdade, como um instrumento do povo, e minha voz será a voz do povo ameaçado”, afirma ela.


Quilombo nos Parlamentos

A população brasileira, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, é composta por 56% de pessoas autodeclaradas pretas e pardas. No entanto, apenas 17,8% dos parlamentares no Congresso são negros e, dentre eles, não há nenhum quilombola.

Para aumentar a visibilidade de candidaturas quilombolas nas eleições de 2022, a Conaq e a Coalização Negra por Direitos criaram a plataforma Quilombo nos Parlamentos, uma iniciativa que visa fomentar a construção de bancadas negras comprometidas com as lutas sociais.

Foram identificadas pelo menos 17 candidaturas, dentre as quais oito são mulheres concorrendo individualmente, e nove são chapas coletivas que incluem homens e mulheres em 13 unidades federativas. As candidaturas defendem direitos constitucionais quilombolas e foram organizadas em um mapa interativo, no qual é possível identificar os candidatos por estado e acessar suas plataformas políticas e propostas de campanhas.
 
*Estagiária sob a supervisão de Márcia Maria Cruz 


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