As irmãs Khloe e Kim Kardashian se destacaram na cultura pop como ícones de beleza curvilíneas. Exibiam as coxas grossas e o bumbum grande, bem ao estilo brasileiro, apesar de manterem a barriga chapada. Mas as curvas já são passado. Recentemente, a dupla passou por um processo de emagrecimento radical, que provocou, além da barriga chapada, a perda das curvas.
Leia Mais
Mulher 'demite' empresa por sofrer gordofobia em São Paulo'É possível ser gorda e plena': a modelo argentina que luta contra gordofobiaTiago Abravanel sobre gordofobia: 'saúde vai além da forma física'O movimento não passou despercebido, pelo contrário, como tudo que elas fazem, chamou a atenção dos seguidores e da mídia e acendeu alertas sobre a mudança drástica na forma física. Khloe, inclusive, supostamente era uma das adeptas do BBL - Brazilian Butt Lift -, técnica que implantava gordura nos glúteos para deixá-los com aspecto de “bunda brasileira”.
No MET Gala de 2022, Kim contou que perdeu sete quilos em 21 dias para usar o vestido de Marilyn Monroe, o que abriu espaço para críticas à influenciadora por supostamente incentivar distúrbios alimentares e o culto à magreza.
A mudança estética ainda pode ter sido influenciada pela volta da moda que era comum nos anos 2000, com calças de cintura baixa, piercing no umbigo e minissaias. Batizado de Y2K, o estilo se popularizou nas redes e nas passarelas, e conquistou também nomes como Anitta e Bruna Marquezine.
Assim como as Kardashians, as artistas brasileiras emagreceram e as curvas saíram de cena. Com essa mudança, a internet questionou se está se criando um novo “padrão de beleza” que exalta o corpo magro e difere do antigo padrão estético, que era curvilíneo.
Essa mudança no ‘‘tipo de corpo ideal’’ representado na mídia acarreta problemas de autoimagem e autoestima, principalmente entre jovens, que buscam se sentir parte da sociedade, aceitos e desejados. A pressão para alcançar esses padrões pode fazer uma pessoa desenvolver distúrbios de imagens e alimentares.
Mas, com o crescimento do "body positive", um movimento que fortalece a segurança das pessoas com os próprios corpos, os padrões estéticos estão perdendo força e há mais espaço para questionar que tipos de imagem são exaltadas na mídia. As manifestações pressionam marcas, estilistas e desfiles a mostrarem corpos diversos e criarem roupas para todo mundo.
O movimento contrário
A criadora de conteúdo Ana Paula Aguiar, conhecida como Aninha It-Gorda, afirma que a volta do culto à magreza está em um momento diferente dos anos 2000 e 1990, quando foi o auge do estilo Y2K, por conta do "body positive".
“Esse movimento cria um lugarzinho de conforto e apoio para essas pessoas que nunca vão ter o corpo da Anitta, da Bruna Marquezine e da Kim Kardashian”, afirma. A influenciadora comenta que as bolhas nas redes sociais fortalecem ideias.
O movimento do body positive se fortaleceu nos últimos cinco anos e produtos foram criados para atender corpos gordos. “Essas marcas vão continuar. Mas, eu tenho medo de como as tendências vão chegar para a gente. Isso é um problema para pessoas mais jovens”, explica Ana.
“Ou a pessoa é muito segura de si e vai sair com a barriga de fora, que é um percentual muito pequeno entre gordos. Ou vai ver todas as pessoas magras com umbigo de fora e se cobrir”, acrescenta.
‘A gorda na moda’
Em seus conteúdos, Ana procura usar tendências conforme se sente confortável: “Eu não quero usar a calça de cintura baixa. Mas aquele cintinho de strass não tinha do meu tamanho. Então, eu comprei uma corrente de brilhos, coloquei na cintura com a calça de cintura alta e arrasei”.
A influenciadora recomenda que pessoas gordas sigam outros perfis com corpos similares para se inspirarem na hora de montar estilos. “A gorda que quer estar na moda tem que ser truqueira”, brinca.
Ana comenta que as blogueiras de moda gordas não têm o mesmo reconhecimento e recepção do público que as magras: “Para pessoas que não seguem pessoas gordas, o corpo gordo é fora do padrão. E o que está fora do padrão, de primeira, é considerado feio”.
“Quando eu saio de casa com uma roupa oversized, ou um cropped e uma bermuda, as pessoas me olham feio. É difícil comunicar que meu corpo é bonito. Para as pessoas da minha bolha, eu sou estilosa. Quem tá de fora, fala que eu sou sem noção”, acrescenta.
‘Corpo como tendência de moda’
Para Aninha It-Gorda, a volta do corpo magro como padrão estético não é uma surpresa por causa do ciclo da moda, que repete estéticas fashion de outras fases. E o formato do corpo segue essas mudanças para acompanhar as tendências.
É o caso, por exemplo, do desenho da sobrancelha, seja com pelo grosso ou fino, moldado conforme os estilos que estão em alta. “Mas, é muito louco a gente pensar em moda cíclica, que vai e volta, e corpo como tendência de moda”, afirma.
“Assim como o ganho de peso das pessoas deveria deixar de ser assunto, a perda também deveria. Mas é um mundo utópico", disse em entrevista ao Estado de Minas.
Influência da mídia no espelho
A imagem de celebridades e pessoas públicas influencia na auto imagem e autoestima do público. A professora do departamento de pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG, Ana Maria Lopes, explica que mulheres famosas são uma referência às garotas, o que cria um ideal de beleza.
“Imagens estimulam a construção do corpo, de certos valores de medidas, tudo isso vai levar a uma supremacia da imagem do corpo na forma de identidade a qual os jovens idealizam os corpos”, conta.
Mas, o que é valorizado e exaltado nas mídias muda conforme “o que está em alta no momento”. “Agora, valoriza a massa magra, magreza, de algo próximo do fisiculturismo, na busca de um corpo estruturado. Mas, isso muda de uma forma muito rápida. Aquilo que era idealizado em um momento, passa”, explica.
A professora afirma que as pessoas devem ser críticas a essa influência, principalmente quem é adolescente: “Tem que se perguntar: ‘será que tem que ser a Anitta?’”.
Ana Maria explica que os jovens, em sua maioria, não levam em consideração os multifatores que compõem o biotipo de uma pessoa e tendem a se forçar a encaixar no padrão estético. “O peso pode estar relacionado com mais de 90 tipos de contribuição genética e isso tem relação com o ambiente”, pontua.
“Na sociedade contemporânea, nós temos uma vida sedentária, uma alimentação muito rica em industrializados. É como se tivesse a luta de dois pontos: a pressão da magreza x sociedade obesogênica (contribui para o aumento de peso). A gente sabe que é muito mais fácil um artista ou uma pessoa que ganha dinheiro com o corpo que pode investir no corpo, mesmo que tenha predisposição, do que uma jovem que não tem o recurso financeiro para investir em cirurgias plásticas. E muitas vezes, esses corpos são moldados em photoshop”, comenta.
O que é o culto à magreza?
O culto à magreza é uma expressão para comportamento social que relaciona o corpo magro à beleza. “Ideal da magreza ligado à ideia de fama, sucesso, relações amorosas e popularidade”, afirma a professora Ana Maria.
Esse comportamento social cria a ideia de que as pessoas devem ser magras para serem felizes. Mas vários fatores fazem um corpo ser magro. “Há pessoas que já trazem consigo uma predisposição inclusive genética para a magreza. Elas apresentam o corpo mais magro. Exemplo: uma paciente com transtorno alimentar, anorexia, o grande incômodo dela é ver que as amigas comem muito mais que ela e tem um corpo magro”.