A intenção do fotógrafo Marcelo Horta é contribuir para a autoestima das detentas de uma ala de pessoas trans da Penitenciária Professor Jason Albergaria, em São Joaquim de Bicas, na Grande BH. Horta passou dois dias fotografando as detentas, e as imagens se transformaram em painéis gigantes, de 1,20m por 80cm, que integraram a exposição "Gente de Bicas".
As fotos estavam expostas nos gradis do Parque Municipal Américo Rennè Gianetti e integram as atividades da XIII Semana de Direitos Humanos e o aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
"Todas as fotos tiveram os rostos marcados com um objeto cortante, uma faca ou um estilete. Algumas, foram arrancadas e queimadas", relata o fotógrafo.
O artista foi comunicado que as fotos foram impressas novamente e levadas para o Arquivo Público e Museu Mineiro. Os autores dos atos de vandalismo ainda não foram identificados. "Como artista eu não sei dizer qual foi o motivo", diz. Ressalta, porém, o quanto o ato é uma agressão e a importância de os autores serem identificados e responsabilizados.
Transfobia
A deputada federal eleita Duda Salabert (PDT) vê motivação transfóbica nos atos de vandalismo. "A motivação transfóbica é bem clara. Aponte uma outra exposição de arte no Brasil em que todas, literalmente todas, as obras foram vandalizadas? Não consigo me recordar de nenhuma", afirma. Duda argumenta que a transfobia se revela no ato deliberado de destruição de todas as fotos.
"Isso por si só já mostra que há algo maior do que um simples vandalismo genérico, o que há é a intenção de destruir essa exposição específica porque retrata vidas de pessoas LGBTI+ e em especial de pessoas trans", diz.
Duda ainda pondera que a maneira como as obras foram danificadas é um "recado de grupos de ódio". "É muito simbólico que a forma de violar essas obras tenha sido rasgar o rosto de mulheres trans e travestis. Por meio do ataque às fotografias, os autores buscam simbolizar o ataque às nossas vidas e modos de viver, algo muito parecido com as ameaças de morte que venho recebendo, que me atacam, mas nisso atacam todas as pessoas LGBTI do país", diz.
Mas Duda reforça que o ato não vai barrar os avanços da população LGBT. "Não vamos nos acovardar e não vamos deixar sem resposta", completa.
Responsabilização
A parlamentar destaca que há diversas formas de responsabilização tanto criminal quanto administrativa. "Além da motivação transfóbica, as impressões das fotos são de propriedade do governo do Estado, então, é um patrimônio público sendo vandalizado", diz. O gabinete está em diálogo com o Ministério Público, a Guarda Municipal, o Governo de Minas e outras instituições para que possam agir.
A penitenciária
As fotografias retratam mulheres trans em privação de liberdade na primeira penitenciária do Brasil a receber pessoas LGBTQIAP . As fotos foram realizadas em um trabalho na Penitenciária Professor Jason Albergaria lá do São Joaquim Bicas. "Eu fui fazer o trabalho, porque, no ano passado, aumentou o número de suicídio lá". Depois de ler uma reportagem, Marcelo entrou em contato com a Secretaria de Direitos Humanos para propor um trabalho para contribuir com a autoestima das detentas.
O que diz o Palácio das Artes
Em nota a Fundação Clóvis Salgado, mantenedora do Palácio das Artes, explicou que a exposição Gente de Bicas cumpriu período expositivo na área externa do Parque Municipal Américo Rennè Gianetti, entre 5 e 10 de dezembro, tendo sido desmontada no domingo (11/12), para ocupar outros equipamentos culturais da cidade.
A fundação informou que os arquivos, danificados no último dia da mostra, já foram reimpressos para a itinerância da exposição, que será realizada no Arquivo Público Mineiro e no Museu Mineiro, a partir de terça-feira (13/12), até 2 de janeiro de 2023.
"A Fundação Clóvis Salgado lamenta, profundamente, o ocorrido com as obras. Esse é um importante trabalho documental do fotógrafo Marcelo Horta para evidenciar a diversidade de Minas Gerais por meio de 30 imagens realizadas na Penitenciária Professor Jason Soares Albergaria, na cidade de São Joaquim de Bicas."