Jornal Estado de Minas

TRANSIÇÃO DO GOVERNO

Com 'a cara do Brasil'?: como ficou a diversidade nos ministérios de Lula

O presidente eleito e diplomado, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), anunciou nesta quinta-feira (29/12) os nomes de mais 16 ministros e fechou a lista dos 37 do primeiro escalão do novo governo, com mandato entre 1º de janeiro de 2023 e 31 de dezembro de 2026. A cerimônia foi realizada no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), sede da transição em Brasília. Outros nomes já haviam sido anunciados entre os dias 9 e 22 de dezembro.





A futura primeira-dama, Rosângela Lula da Silva, a Janja, trabalhou para que a Esplanada dos Ministérios fosse composta com mais diversidade, mas negociações para o cumprimento da promessa de uma “frente ampla”, cobrada de Lula por aliados durante as eleições de 2022, tornou mais branda e menos pontual “a cara da sociedade brasileira” nos ministérios.

Lula havia prometido, no dia em que anunciou os primeiros nomes ao primeiro escalão do governo, que “vai ter mulher, vai ter homem, vai ter negros, vai ter indíos”, o que foi cumprido, mas especialistas defendem que diversidade está aquém do esperado.

Mudanças notáveis

Dos 37 ministros anunciados, 11 mulheres foram nomeadas – em números absolutos, o equivalente aos dois mandatos de Lula entre 2002 e 2009, contabilizando mulheres titulares e interinas  –, tornando o terceiro mandato do petista o que mais tem ministras na história do Brasil, com destaque à Sônia Guajajara (Psol), deputada federal anunciada como ministra dos Povos Indígenas.





No entanto, a representação desse grupo, assim como o de pessoas negras – característica mais complicada de ser comparada de forma precisa por depender de autodeclaração –, ainda não contempla a realidade brasileira e sua força política e eleitoral: atualmente, a população do país é composta por mais de 52% de mulheres e 54% de pessoas negras (contabilizando autodeclarados pretos e pardos). 

Entre as escolhas feitas por Lula para seus ministérios quando eleito em 2002 e agora, em 2022, o presidente eleito fez mudanças importantes, como nomear Nísia Trindade (Ministério da Saúde) e Luciana Santos (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações), a ministérios cujas áreas não são tradicionalmente atribuídas a mulheres. De acordo com Daniela Rezende, cientista política e professora na UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto), é importante que haja esse deslocamento para que a diversidade não fique limitada a espaços caracterizantes do tema.

“Os critérios de gênero e raça tendem a valer para pastas ministeriais específicas, em que os temas de raça e gênero são mais centrais, e menos presentes em pastas maiores com maior visibilidade e recursos . Entretanto, enquanto Lula indicou nomes importantes, como Silvio Almeida, Margareth Menezes e Anielle Franco, a representação racial ainda é deficitária”, afirma Rezende.





Nomeações reativas

Estudos sobre gênero e política indicam que governantes vinculados a partidos de esquerda tendem a nomear mais mulheres para o primeiro escalão, o que se confirma quando analisamos os governos brasileiros após a redemocratização do país: Lula teve 11 ministras – incluindo titulares e interinas – em seus primeiros dois mandatos e Dilma Rousseff (PT) teve 16, enquanto Jair Bolsonaro (PL) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB) tiveram duas, cada, e Fernando Collor (PTB), apenas uma.

No entanto, para Flávia Rios, pesquisadora no Afro-Cebrap e professora na UFF (Universidade Federal Fluminense), o presidente eleito e seu partido têm nomeado mulheres e pessoas negras para o primeiro escalão do governo mais de forma reativa que proativa. “É triste e problemático imaginar que, depois de tantos anos de crescimento do debate racial e de gênero no país, Lula e o PT já não partam dessa temática ”, explica Rios.

A pesquisadora também afirma que, apesar dos avanços de Lula em relação aos seus próprios mandatos anteriores, o novo governo ainda está aquém de outros governos progressistas latino-americanos, a exemplo do Chile de Gabriel Boric que, ao assumir o governo em 2022, anunciou 14 mulheres para os 24 ministérios do país.





Para Daniela Rezende, ainda é preciso considerar que, apesar de não justificar a baixa porcentagem de mulheres e negros no primeiro escalão do governo, “em um cenário de colaização do governo, há outros critérios a serem atendidos”, mas que quando Lula indicou apenas homens em seu primeiro anúncio de ministros – Fernando Haddad, Rui Costa, Flávio Dino, José Múcio Monteiro e Mauro Vieira, no dia 9 de dezembro —, houve uma quebra de expectativas em relação à campanha do petista, que teve forte apoio de minorias e a promessa tardia de paridade ministerial.

Diversidade partidária

Também foi cobrado do petista que seus ministérios fossem compostos por uma diversidade partidária a fim de compor uma “frente ampla”. Com isso, legendas do chamado “centrão” – MDB, PSD e União Brasil, vão compor pastas importantes do governo. Este último, ao qual está filiado o senador eleito Sergio Moro, opositor de Lula, será base do petista no Congresso.

Lula também anunciou os nomes dos líderes do governo na Câmara, Senado e Congresso Nacional: José Guimarães (PT-CE), Jaques Wagner (PT-BA) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Apesar de não divulgar os presidentes da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil, o petista antecipou que os dois bancos serão comandados por mulheres.





"Depois de muita conversa, muitos ajustes, terminamos de montar o primeiro escalão do governo. Não menos importante, a partir da posse a gente vai começar a discutir o segundo escalão, os cargos do governo federal em cada estado para que a gente possa dentro de pouco tempo estar tendo todas as informações para fazer a máquina funcionar porque o povo brasileiro não pode esperar", frisou Lula.

Confira a lista dos nomes confirmados para primeiro escalão do governo Lula:

  • Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio: Geraldo Alckmin (PSB)
  • Ministério da Fazenda: Fernando Haddad (PT) 
  • Ministério da Justiça: Flávio Dino (PSB) 
  • Casa Civil: Rui Costa (PT)
  • Ministério da Defesa: José Múcio Monteiro (PTB)
  • Ministério das Relações Exteriores: Mauro Vieira
  • Ministério do Desenvolvimento Social: Wellington Dias (PT)
  • Ministério da Saúde: Nísia Trindade
  • Secretaria Geral da Presidência: Márcio Macêdo (PT)
  • Ministério da Educação: Camilo Santana (PT)
  • Secretaria das Relações Institucionais: Alexandre Padilha (PT)
  • Ministério do Trabalho: Luiz Marinho (PT)
  • Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações: Luciana Santos (PCdoB)
  • Ministério dos Direitos Humanos: Silvio Almeida
  • Ministério da Igualdade Racial: Anielle Franco
  • Ministério dos Portos e Aeroporto: Márcio França (PSB)
  • Ministério da Cultura: Margareth Menezes
  • Ministério das Mulheres: Cida Gonçalves
  • Ministério de Gestão e Inovação: Esther Dweck
  • Ministério de Minas e Energia: Alexandre Silveira (PSD-MG)
  • Ministério do Meio Ambiente: Marina Silva (Rede-SP)
  • Ministério do Planejamento e Orçamento: Simone Tebet (MDB-MS)
  • Ministério da Previdência: Carlos Lupi (PDT)
  • Ministério dos Transportes: Renan Filho (MDB-AL)
  • Ministério das Cidades: Jader Filho (MDB)
  • Ministério dos Povos Indígenas: Sônia Guajajara (Psol-SP)
  • Ministério dos Esportes: Ana Moser
  • Gabinete de Segurança Institucional: Gonçalves Dias
  • Secretaria de Comunicação Social: Paulo Pimenta (PT-RS)
  • Ministério da Agricultura e Pecuária: Carlos Fávaro (PSD-MT)
  • Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional: Waldez Góes (PDT-AP)
  • Ministério da Pesca e Aquicultura: André de Paula (PSD-PE)
  • Ministério das Comunicações: Juscelino Filho (União Brasil-MA)
  • Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar: Paulo Teixeira (PT-SP)
  • Ministério do Turismo: Daniela do Waguinho (União Brasil-RJ)
  • Advocacia-Geral da União (AGU): Jorge Messias
  • Controladoria-Geral da União (CGU): Vinícius Carvalho

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* Estagiária sob supervisão do subeditor Thiago Prata