A cerimonialista da posse de Fernando Haddad como ministro da Fazenda se dirigiu ao público com "todos, todas e todes". A linguagem neutra é utilizada para se referir a pessoas que não se identificam com o gênero masculino nem com o feminino, e demonstra um movimento de inclusão da comunidade LGBTQIAPN+ do novo governo.
Repercussão do 'todes'
O termo “todes” figurou no trending topics do Twitter esta semana, devido ao uso nas cerimônias de posse dos ministros do novo governo. Enquanto muitos criticavam o uso do termo, e utilizando a linguagem neutra para ironizar a pauta, a sinalização de inclusão foi vista como positiva pela comunidade LGBTQIAPN+.
Gregory Rodrigues, Coordenador Nacional de Comunicação da Aliança Nacional LGBTI+, afirma que é necessário compreender que todas as demandas presentes na sociedade precisam ser avaliadas para serem entendidas.
“A língua portuguesa é viva, e precisa ser inclusiva de modo a abraçar todas as pessoas. Esta atitude do novo governo, ao meu ver, busca trazer luz sobre um debate há muito silenciado, demostrando preocupação com a diversidade existente na sociedade brasileira", afirma Gregory.
O colunista do Estado de Minas Arthur Bugre afirma que além do uso do “todes” nos eventos oficiais, também é possível outras substituições de palavras, de forma abraçar todas as pessoas por meio da comunicação. Por exemplo: “vamos nos reunir com líderes do setor” por “vamos nos reunir com lideranças do setor”.
“E espero que a linguagem neutra não seja a única ação do governo Lula voltada para a comunidade grupos LGBTQIAP+. Mas diante dos últimos 4 anos de tantos retrocessos, a adoção da linguagem neutra nas cerimônias de posse do novo governo demonstra que as demandas dessa comunidade podem voltar a avançar e traz um pouco mais de esperança”, afirma Arthur.
Oposição ao pronome neutro
A utilização do pronome neutro foi duramente criticada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, juntamente com o que foi chamado de “ideologia de gênero”. “Uma parte da garotada nem sabe português e quer a linguagem neutra. É impressionante. Antes de explicar o pronome neutro pergunta se sabe a diferença do pronome pessoal do caso reto, do caso oblíquo”, disse.
A atual ministra do Turismo, Daniela Carneiro, criticou a “ideologia de gênero nas escolas” e o “lobby para a linguagem neutra”, em vídeo divulgado em 2022. Como deputada chegou a apresentar um projeto de lei na Câmara Federal contra o uso da linguagem neutra em escolas públicas e privadas, definindo-os como "deturpação da Língua Portuguesa".
“Uma língua é adquirida, é aprendida, não é inventada; e não é aceitável que essa ilegítima invenção seja reproduzida justamente no local onde os estudantes deveriam aprender a utilizar a Língua Portuguesa de acordo com as regras gramaticais”, afirma o texto do PL.
Origem da linguagem neutra
O primeiro país onde se usou a linguagem neutra por pessoas não binárias, que não se sentem confortáveis sendo tratadas no masculino ou feminino, foi a Suécia. Na língua sueca existe palavra “Hen”, que pode ser usada para descrever qualquer pessoa, independente do sexo ou gênero.
Desde então, movimentos LGBTQIAPN+ de outros países começaram a adotar a linguagem neutra também. É o caso dos Estados Unidos, onde pessoas não binárias utilizam o pronome plural “They”, uma vez que não há identificação de gênero no termo. Além disso, na língua inglesa não há definição de gênero para objetos ou adjetivos, ou seja, grande parte da língua naturalmente neutra.
No caso do Brasil e outras línguas latinas, há a definição de gênero para quase todos os termos utilizados no dia a dia. Originalmente o Latim tinha três formas: feminino, masculino e neutro, mas com o tempo caiu em desuso, e hoje utilizamos apenas as duas primeiras formas, sendo convencionado que o plural seria colocado no masculino.
Para tornar a língua portuguesa neutra, algumas soluções como o uso do “x” ou do “@”, chegaram a ser utilizadas, principalmente nas redes sociais. Entretanto, o mais usado e aceito é o uso do “e” e do “u” para substituir a marcação de gênero, por exemplo: Ele/ela se torna “elu”, brasileiro(a), se torna “bresileire”, todos/todas, se torna “todes”.
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