Jornal Estado de Minas

SENSACIONALISMO

Polêmica: Secretária de Defesa Social de Contagem repercute no Instagram


A Secretária Municipal de Defesa Social de Contagem, Viviane França, publicou em seu perfil no Instagram nesta terça-feira (8/2) uma postagem que repercutiu na rede social. Em uma foto ilustrativa com a manchete do portal Metrópoles que dizia “Mãe processa escola por obrigar filho de 4 anos a ir em parada LGBT”, a secretária de Defesa Social questionou aos seus seguidores o que achavam sobre o caso.





Sem aprofundamento sobre o conteúdo da reportagem – o que foi corrigido posteriormente com uma edição da postagem e uma outra publicação de retratação –, ela afirma que o caso, que ocorreu em South Norwood, na Inglaterra, em 2018, é polêmico e que gostaria de saber mais sobre o ponto de vista de outras pessoas. “Pois bem, sem meias palavras, dêem a opinião de vocês sobre o assunto”, escreveu ela na postagem do Instagram.
 
 

A unidade de Contagem do Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual de Minas Gerais (CELLOS/MG), em parceria com a União de Juventude Socialista de Contagem (UJS Contagem), publicou, também no Instagram, uma nota de repúdio afirmando que Viviane França “encontra-se na contra-mão das proposições políticas, éticas e acadêmicas de combate à LGBTQIAP+fobia e de promoção a uma cultura de paz”.

Reações

 
Internautas se dividiram quanto às opiniões sobre o teor da postagem. Uns questionaram o motivo de a secretária de Defesa Social de Contagem estar publicando sobre um caso antigo que ocorreu na Inglaterra, enquanto outros apoiaram o levantar da discussão sobre a obrigatoriedade da presença de crianças em atividades extracurriculares nas escolas.





“Estou super horrorizada com as publicações de incentivo a desavenças entre os comentários. Não tem nenhuma solidificação o post da secretária. Uma reportagem antiga, de outro país, que não tem pé nem cabeça. Sinto que ela agiu de má fé em sua postagem para causar discussões que não nos levar a lugar nenhum”, disse uma usuária. “Não quer dizer que não podemos falar sobre o assunto abordado, claro que devemos falar, entender, nos posicionar, mas com sabedoria e sem preconceito, com a mente aberta para mais informações e aprendizado”, completou.

“Um post que conseguiu captar vários pensamentos e críticas ao assunto. Mas devemos lembrar que não é o fato de obrigar a criança a ir em uma parada LGBT, mas sim obrigá-la sem a permissão de sua mãe. Toda festa e excursão que as escolas fazem sempre requerem a autorização antecipada dos pais ou responsáveis para que o filho possa participar”, disse outra internauta. O que está errado no ocorrido é a escola, que não poderia obrigar a criança sem autorização dos pais”, acrescentou.

Um usuário afirmou que muitos dos comentários não seguem a proposta da secretária de Defesa Social de Contagem. “Desbolsonarizar o Brasil não é uma tarefa fácil. Por essas e outras, vejo cada vez mais como uma tarefa árdua. O nível de dissonância cognitiva coletiva é assustador. E não afeta apenas a extrema-direita. A postagem em si, virou um mero detalhe. O que ela se propõe passa longe da maioria dos comentários”, escreveu.





Outro internauta chega a questionar a capacidade de Viviane França para ocupar o cargo de secretária. “Sensacionalismo, falta de sensibilidade, falta de cuidado. Sua postagem é o exemplo de tudo isso e escancara sua inabilidade para o cargo que ocupa” afirmou ele.

Resposta

 
Com a repercussão, Viviane França acabou fazendo uma segunda postagem sobre o assunto, informando sobre sua própria opinião sobre o caso e a maneira como foi publicado.

“Convidei as pessoas a se posicionarem sobre o fato ocorrido na Inglaterra em 2018 e que está em julgamento por esses dias. Como eu mesma disse na descrição, é um assunto polêmico. As polêmicas, opino, devem ser discutidas de forma livre e sem qualquer interdição. Até mesmo para que possamos enfrentá-las”, escreveu ela. “Compartilho, mais do que a minha opinião sobre, fato, mas também um pouco de esclarecimento do que realmente está em julgamento na Inglaterra”, completou.





Entre as imagens do post, ela afirma que foi o próprio portal de notícias Metrópoles que causou sensacionalismo. “Em menos de 24 hora, quase 20 mil pessoas haviam curtido a postagem com mais de 1700 comentários. O título da matéria induz os comentários sem a leitura completa do fato”, disse.

A reportagem do EM entrou em contato com a Secretaria de Defesa Social de Contagem, que emitiu uma nota a respeito da repercussão do caso; leia na íntegra:

"Sobre a repercussão de uma postagem que fiz na minha conta pessoal no instagram no dia 07 de fevereiro de 2023, esclareço:

1 – Trata-se de uma notícia veiculada na imprensa sobre o julgamento em andamento de um caso ocorrido em 2018, na Inglaterra, em que uma mãe processa uma escola por, supostamente, obrigar uma criança de 04 anos de idade a participar de uma parada LGBT;

2 – Na minha postagem eu reproduzo a manchete de um Portal de Notícias (Portal Metrópoles), atribuindo a autoria ao referido portal e convidando os meus seguidores para se posicionarem sobre o tema. A citação do Portal, a atribuição da autoria e a pergunta na descrição deveriam bastar para mostrar que estou, como é de hábito nas minhas redes sociais, chamando para uma discussão, uma reflexão, inclusive de como o Portal aborda um tema tão sensível em um país como o Brasil, com recordes intolerância e violência contra a população LGBTQIAPN+;

3 – O meu posicionamento sobre o assunto está disponível em postagem realizada hoje que diz:
'No entanto, ao pesquisar sobre o ocorrido, há uma versão de que não se tratava de uma parada LGBT externa à escola, mas, sim uma atividade da escola de promoção da diversidade e de combate ao bullying. Segundo reportagem do Jornal O Globo, o tema está em julgamento por essas semanas. Daí a razão pela qual voltou à tona depois de cinco anos.

Então, vamos lá: nas condições do Brasil, levar os alunos para uma atividade, seja ela política, cultural, esportiva fora da escola não cabe posicionamento. Somente com a autorização dos pais. Agora, a escola pode promover atividades de promoção da diversidade, da tolerância e etc? Não somente pode como deve. Por outro lado, considero inadequada a dispensa do aluno de uma atividade curricular que promove a diversidade, a tolerância, de acordo com as diretrizes curriculares.





Outro ponto que considero fundamental dessa discussão é como esse tema está sendo tratado pela imprensa brasileira. Daí também, a razão pela qual julgo importante discuti-lo. Problematizar. No perfil do instagram do Portal Metrópoles, em menos de 24 horas, quase 20 mil pessoas haviam curtido a postagem com mais de 1700 comentários com muitos declarados defensores da causa LGBTQIAPN+ apoiando a atitude da mãe e contra a escola. Ao que me parece, se posicionaram a partir de uma postagem que sequer cita que o caso é de 2018 e que poderia não se tratar de uma macha externa á escola, e sim de uma atividade curricular.'

4 – Qualquer publicação nas redes sociais está passível a interpretações, incompreensões e posicionamentos distintos do que realmente é a intenção de quem publica. Manifestações contrárias e críticas fazem parte do debate público democrático. Não faz parte do debate democrático ataques pessoais, colocar em questão minhas convicções políticas e ideológicas e muito menos insinuar ou defender minha punição ou retaliação política e institucional. Isso tem nome: violência política de gênero.  

O que precisamos ficar atentos é com a distorção do que é dito, inicialmente distorcer a minha postagem e, principalmente desconsideraram o meu histórico de posicionamentos a favor das liberdades, da autonomia e da defesa dos direitos das mulheres, dos negros e da população LGBTQIAPN+. São inúmeras as publicações nesse sentido, além de artigos, participação em debates e palestras ministradas. Ou seja: se as palavras da publicação não bastam, a minha história deveria ser levada em consideração. 

5 – Por fim, estou convicta de que a publicação, os comentários, as manifestações reforçam a necessidade de criarmos mais canais de diálogo para que o debate público seja verdadeiramente democrático, sem qualquer tipo de cerceamento, interdição e ameaça com vistas ao nosso silenciamento. E concluo reafirmando o meu papel como mulher, como ser humano de não me abalar por qualquer tipo de ataque, principalmente de julgamentos que sequer leram o post, buscaram a informação e desconsideraram a minha história. 





Como me ensinou Guimarães Rosa no Grande Sertão: Veredas: Coragem – é isso que a vida quer de nós.

Viviane França 
Secretária de Defesa Social de Contagem"
 

O caso

A reportagem à qual a secretária da Defesa Social de Contagem se refere trata de um caso envolvendo a Escola Primária Heavers Farm e uma mãe britânica conservadora, Izzy Montague, de 38 anos. A situação em questão ocorreu em South Norwood, na Inglaterra, em 2018 e, na verdade, não se tratava de uma parada LGBTQIA , mas sim de uma atividade extracurricular sobre diversidade e contra o bullying da escola.

Na interpretação de Izzy, a carta que recebeu da escola do filho, então com quatro anos de idade, indicava a promoção de uma “marcha do orgulho LGBT” e que, além da presença obrigatória dos alunos, todos os pais estavam convidados para participar do evento.

Uma semana depois, ela pediu dispensa do evento para o filho com a justificativa de que estava preocupada em expor a criança a esse tipo de encontro e que seria uma “exibição pública de adesão a pontos de vista que ela não aceitava por ser cristã devota”, A diretora da escola não aceitou o pedido para liberação.



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Os pais da criança processaram a escola e, durante a sessão, Izzy relatou que “parecia que estavam me dando um sermão sobre algo a ver com os valores britânicos e dizendo que, de alguma forma, não estávamos aderindo a esses valores”. De acordo com o portal Daily Mail, foi a primeira vez que o Reino Unido enfrentou a imposição LGBT nas escolas primárias.

O advogado que representou a escola leu uma parte da carta enviada aos pais, que dizia: “Em julho, celebrar o Orgulho é aprender sobre a diversidade de toda a nossa comunidade escolar e combater o bullying”, perguntando a Izzy logo em seguida se ela tem problemas em celebrar a diversidade e em combater o bullying, ao que ela respondeu: “Para mim, pessoalmente, não é algo que eu comemoraria. Acho bom que a comunidade mais ampla se reúna e aprendamos e vivamos juntos. Não sei se com ‘comemorar’ você quer dizer ‘fazer uma festa’. Não é algo que eu assistiria”.

Ela e seu marido foram descritos como “cristãos devotos renascidos” pelo juiz do caso, que ainda acrescentou: “Eles acreditam que as relações sexuais devem ser abstidas ou ocorrer dentro de um casamento vitalício entre um homem e uma mulher. Para eles, qualquer atividade fora desses limites é pecaminosa. Eles também dizem que o Orgulho é considerado o mais grave dos pecados capitais”.





O caso ocorreu em 2018, mas viralizou esta semana após uma publicação de Izzy nas redes sociais.
 

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