Eldridge virou na véspera alvo de inquérito policial aberto pela Decrin, delegacia especializada em crimes discriminatórios, sob a asa da Polícia Civil do Distrito Federal. Motivo: no domingo (19), ele fez um discurso considerado de ódio contra a população LGBTQIA+, revestido de pregação cristã, num congresso da Umadeb (União das Mocidades das Assembleias de Deus de Brasília).
A Folha de S.Paulo tentou falar com o pastor por redes sociais e email, sem resposta em nenhum canal. Também procurou a Umadeb, mais uma vez sem retorno.
Com auxílio de um tradutor, Eldridge pregou em inglês que aqueles que ele vê como desviados não são merecedores do céu. Inclui nesse pacote até quem usa calça apertada, o que na sua opinião incorpora o espírito da homossexualidade.
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"Todo homossexual tem uma reserva no inferno, toda lésbica tem uma reserva no inferno, todo transgênero tem uma reserva no inferno, todo bissexual tem uma reserva no inferno, toda drag queen tem uma reserva no inferno", disse o pastor à plateia de jovens evangélicos. "Você, rapaz, que está usando calça apertada, que é um espírito de homossexual, você vai pro inferno. Você, moça, que quando sai da sua casa a sua saia é tão curta e tão apertada, você sabe o que está fazendo? Você tem uma reserva no inferno."
A fala do pastor americano lhe garantiu uma possível reserva na Justiça brasileira. O Ministério Público do Distrito Federal diz, por meio de seu Núcleo de Enfrentamento à Discriminação, que aguarda a conclusão do inquérito policial "para análise e eventual denúncia". Reforça ainda que "considera as falas homotransfóbicas do pastor norte-americano muito graves".
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Não poderiam dizer o mesmo líderes evangélicos de grande projeção. Muitos deles até concordam que a forma de Eldridge se posicionar foi acima do tom, mas subscrevem o conteúdo homofóbico.
"A palavra de Deus é clara sobre o pecado e também sobre o pecador", diz o apóstolo César Augusto, à frente da igreja Fonte da Vida. "Deus ama o ser humano, aquele que peca, e abomina o pecado. Adultério, prostituição, homossexualismo [sic], tudo é prática pecaminosa. Todos que praticam o pecado... Não é a vontade de Deus levá-los para o inferno, mas eles fizeram opção de andar pelo caminho pecaminoso. Consequentemente, irão para o inferno se não se arrependerem."
Vai além Silas Malafaia, pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, que 13 anos atrás espalhou outdoors pelo Rio de Janeiro com a mensagem "Em favor da família e preservação da espécie humana. Deus fez macho e fêmea".
Ele evoca o artigo 5º da Constituição, que assegura a liberdade de consciência e de crença. "Ninguém pode violar minha liberdade em crer em quem vai para o céu e quem vai para o inferno. É inviolável o lugar do culto. Estou lendo na Constituição: ninguém será privado de direitos por motivos de crença religiosa e de convicção filosófica ou política."
Se Eldridge pregou num ambiente de culto, "que banzé é esse?", questiona Malafaia, "No Carnaval debocham da nossa fé, fazem pilhéria com Jesus no Porta dos Fundos, e não tem problema, não é discurso de ódio. Mas, quando a gente prega a Bíblia em que nós cremos, é discurso de ódio. Manda essa cambada plantar batata, ok?"
É um ponto de vista que tem ecoado entre líderes evangélicos: Eldridge poderia, sim, ter pegado mais leve, mas tinha direito de dizer o que disse, até porque a própria Bíblia dá respaldo a tanto.
De fato, está lá no Levítico, livro do Antigo Testamento: "Não te deitarás com um homem, como se fosse mulher: isso é uma abominação".
Mas indagam os que acham indevido o uso das Escrituras para justificar a LGBTQIA+fobia: é para se levar tudo ao pé da letra? Porque Levítico também afirma que Deus abomina quem veste roupa com dois tipos de tecido, por exemplo. Vai mandar para o inferno a irmã que misturou seda e algodão no vestido do culto?
O pastor Pedrão, líder da Comunidade Batista do Rio e responsável por celebrar o casamento do deputado Eduardo Bolsonaro (PL), foi um dos que viram excesso na colocação do colega americano. "O pastor foi infeliz ao determinar que existe lugar [para LGBTQIA+] no inferno."
"O assunto é por demais polêmico, mas como o próprio Cristo disse: não julgueis para não ser julgado. Ninguém tem as chaves dos céus. Não nos cabe lotear o inferno ou o céu dizendo quem vai e quem não vai, não somos Deus."
Eldridge não é um pastor expressivo em sua terra de origem, mas encontrou no hemisfério sul um amplificador para sua palavra. Entusiasta de Donald Trump nos EUA, segue à risca a cartilha do conservadorismo que, no Brasil, ficou sob guarida do bolsonarismo.
A Umadeb, congresso anual realizado durante o Carnaval, já deu palco para o americano em anos anteriores. A participação deste ano, contudo, estourou a bolha e extravasou para fora da redoma evangélica.
A entidade assembleiana não se manifestou sobre as acusações de homofobia contra um dos principais pregadores de seu evento. O vídeo com a pregação de Eldridge sumiu de seu canal do YouTube.
Nas redes da Umadeb permanece em destaque uma frase do pastor: "Assim como existe o céu, existe o inferno. Talvez você não acredite no inferno, mas o inferno acredita em você".
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