Nas últimas semanas de folia, a mensagem "Travesti não é fantasia de Carnaval" invadiu milhares de perfis espalhados pelas redes sociais mais utilizadas do país, uma crítica ao uso acrítico da alegoria.
Poucas pessoas, a maioria cisgênero, defendem o uso por motivos culturais.
O verbo travestir, que deu origem ao termo apropriado para definir o grupo identitário, significa vestir (alguém ou a si próprio) de modo a aparentar ser do outro sexo, condição ou idade.
"Existem inúmeros problemas em um homem se vestir de mulher, de travesti, fazer a caricatura de quem somos e ir desfilar nas ruas esbanjando falsa feminilidade e trejeitos engraçados. Travesti é uma identidade de gênero, é uma constante de lutar por direitos e pela vida", diz a artista Bianca Manicongo, 21, conhecida como Bixarte. A jovem é travesti.
Ela afirma ser considerado cômico fazer a caricatura durante as festas carnavalescas. Mas, fora do período, "ridicularizam, não empregam, sexualizam, marginalizam e nos negam o acesso a direitos básicos, como o ir e vir. Curtem o que é, na verdade, é dor".
Bianca faz parte de uma geração que busca dar ao termo travesti um novo significado. Para esse grupo, a palavra carrega injustamente uma perspectiva negativa imposta historicamente pela sociedade brasileira.
A violência contra pessoas LGBTQIAP+, especialmente transexuais e travestis, é crônica no Brasil. No último ano, 131 indivíduos foram mortos no país, segundo levantamento da Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais).
As críticas à vestimenta vêm em uma toada de revisionismos de fardas carnavalescas. Antes bem difundidas, personificações de indígenas, por exemplo, hoje não são bem-vistas.
O levante contra os homens travestidos também tem a participação de instituições de apoio à comunidade LGBT+.
"A proibição de nossa presença no Carnaval foi usada durante anos de forma institucional e direta. E, nos últimos tempos, mais sofisticada e indireta. Os locais de grandes bailes e blocos, em geral, não são seguros para nossos corpos", declarou a associação.
Bruna Benevides, coordenadora política da Antra, diz não ser o escárnio dos corpos trans e travestis exclusividade de populares em farra pelas ruas.
"Escolas de samba têm uma dívida histórica com as travestis. O posto de rainha de bateria foi criado por Joãozinho Trinta [famoso carnavalesco brasileiro] para a travesti Eloína dos Leopardos, nos anos 70. Se olharmos hoje, além de sermos poucas e sem qualquer destaque, o ambiente das escolas, seja nos desfiles ou quadras, são altamente inseguros para nossos corpos", afirma ela.
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