Uma pesquisa realizada pelo Sebrae Minas (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais) mostrou que mulheres têm maior dificuldade em empreender que os homens. De acordo com o relatório publicado hoje (7/3), 69% das empreendedoras são responsáveis pelos cuidados da casa, número que cai para 31% quando se trata dos homens.
Em Minas Gerais, o número de empreendedoras cresceu 22,5% entre 2019 e 2021. Dentre as atividades com maior concentração de mulheres, estão serviços domésticos (42,1%), vendas de roupas, sapatos e acessórios (23,8%), e serviços de alimentação (14,1%). Elas representam 46% de empreendedores em estágio inicial (empresas de até 3,5 anos) e apenas 31% de empreendedores em estágio estabelecido (a partir de 3,5 anos).
“O percentual de mulheres que sobrevivem no empreendedorismo [mais de 3,5 anos de existência de empresa] é menor que o dos homens, porque há uma dificuldade maior relacionada ao empreendedorismo feminino devido a uma sobrecarga de tarefas e funções. Os homens podem se dedicar mais ao negócio porque não precisam se encarregar tanto, socialmente, pelos cuidados da casa e dos filhos”, explica Isabela Siqueira, analista do Sebrae Minas.
São elas, também, que sentem mais a sobrecarga de trabalhos domésticos e que percebem que mulheres sofrem mais com este fator que os homens, que não assumem tantas funções em casa quanto elas: 48% delas têm essa percepção em relação a apenas 24% dos homens. A pesquisa mostra que, por conta disso e de outros fatores, as mulheres têm maiores dificuldades de se firmarem no mercado.
“O que mais chama atenção é a sobrecarga de tarefas realizadas pelas mulheres em comparação aos homens. Sete em cada dez empreendedoras são as principais responsáveis pelos afazeres domésticos, enquanto, entre os homens, o percentual foi de três em cada dez. Essas múltiplas tarefas realizadas pelas mulheres geram uma maior pressão emocional”, afirma Siqueira.
Motivações para iniciar um negócio
As mulheres são maioria no mercado de trabalho brasileiro. De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), elas foram de 54,7% em 2012 para 55,8% em 2020. No mesmo ano, Minas registrou 54,8% delas e, em 2021, o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) registrou que cerca de 44,3% dos empregados nas micro e pequenas empresas (MPE) do Brasil eram mulheres, em relação a 43,9% das MPE no estado.
Apesar disso, elas recebem menos que os homens – em média, mulheres recebem 77,8% do salário dos homens no Brasil, e 81,5% em Minas Gerais – e ainda são minoria em cargos de liderança (29%), mas a proporção varia de acordo com o porte das empresas. De acordo com a pesquisa do Sebrae, em 2021, cerca de 31,3% das MPE em MG eram lideradas por mulheres.
Muitas das mulheres que decidem empreender o fazem por vontade de ser dona do próprio negócio e ter maior autonomia e flexibilidade de trabalho (65%), mas ainda há uma grande parcela delas que abrem seus negócios por necessidade financeira (45%).
“Um dos principais fatores da baixa conversão de empreendimentos de mulheres em estágio inicial para o estabelecido diz respeito à necessidade financeira pela qual as mulheres abrem seus negócios. A abertura por necessidade financeira é temporária, em períodos de piora na renda familar. Quando há uma melhora, essas mulheres tendem a abandonar seus empreendimentos”, afirma Isabela Siqueira.
Além desses dois fatores, mulheres também empreendem por vocação e desejo de empreender (42%) e por experiência na área em que abrem as empresas (29%). Dentre as empreendedoras, três em cada dez possuem outra ocupação como principal fonte de renda, enquanto, entre os homens, o percentual foi de dois em cada dez.
“Muitas vezes, as mulheres empreendem por necessidade e precisam conciliar o empreender com a sua vida pessoal e múltiplas jornadas. As tarefas que elas exercem estão culturalmente concentradas em serviços um pouco mais simples, então aqui no Sebrae trabalhamos para apoiá-las e capacitá-las cada vez mais para que elas consigam empreender em outros negócios mais complexos”, explica Bárbara Castro, membro da unidade de inteligência empresarial do Sebrae.
Dificuldades ao empreender
Para Marcelo de Souza e Silva, presidente do Conselho Deliberativo do Sebrae Minas, a dificuldade que as mulheres têm de empreender parte, principalmente, da cultura machista e patriarcal, que influencia em como as mulheres utilizam seu tempo útil ao longo do dia.
“Mulheres têm mais dificuldades que os homens [ao empreender], podemos ver isso hoje e ao longo do tempo. Elas têm mais dificuldades por causa da cultura. A cultura do brasileiro é deixar a mulher cuidar dos afazeres de casa, então ela precisa cuidar de tudo isso e ainda empreender”, explica ele.
Dentre as principais dificuldades enfrentadas pelas mulheres empreendedoras, estão a gestão financeira (45%), a conciliação entre vida pessoal e profissional (35%), o acesso a crédito bancário (28%), o valor da carga tributária (27% e o acesso a mão de obra qualificada (25%).
A falta de apoio do Estado em relação ao empreendimento feminino também é um dado que chama a atenção. Das entrevistadas, apenas 10% afirmam que existe alguma lei ou iniciativa para fomentar negócios liderados por mulheres em seus municípios.
“Esse é um percentual ainda muito pequeno. É preciso que haja uma iniciativa maior do governo e vários atores precisam estar envolvidos para fomentar e apoiar essas mulheres, e o Sebrae é um deles. Nós temos diversas soluções, iniciativas e projetos com essa finalidade, além de uma articulação importante entre a comunidade empresarial”, conta Bárbara Castro.
Rede de apoio
Apesar de todas as dificuldades que mulheres encontram ao empreender, muitas delas formam uma rede de apoio importante para a consolidação de seus negócios. Elas motivam e são motivadas por outras mulheres – 53% tiveram contato com outra empreendedora que a inspirou ou a influenciou a abrir seu próprio negócio –; se ajudam entre si – 40% afirmou ter uma rede de contato com outras empreendedoras –; e preferem contratar mulheres a homens – 85% disse dar preferência a elas ao buscar mão de obra para as suas empresas.
“A mulher precisa de uma rede de apoio. A conexão da mulher com outras donas de negócio para aprender melhores práticas e lições para se fortalecerem”, conta Bárbara Castro.
Visando aprimorar a experiência de mulheres empreendedoras e por entender que o empreendimento feminino é ainda mais desafiador que o masculino por questões culturais da sociedade, o Sebrae Minas criou, em 2019, o Sebrae Delas - Mulher de Negócios, um programa que desenvolve pesquisas de gênero no empreendedorismo, além de programas de capacitação e redes de apoio entre mulheres empreendedoras.
A iniciativa atua em quatro frentes: Inteligência (pesquisas para entendimento do cenário empresarial feminino); Sensibilização (ações direcionadas aos colaboradores e fornecedores do Sebrae); Articulação e formação de rede (articulação interna e externa para integração de ações direcionadas ao empreendedorismo feminino); e Capacitação (ações de orientação em gestão, inovação, transformação digital e competências socioemocionais).
“É muito importante falarmos, aqui, sobre equidade de gênero. A pesquisa fala muito sobre desigualdade, principalmente na hora da divisão das tarefas e dos serviços de cuidado não remunerados. A sobrecarga de tarefas afeta diretamente na questão socioemocional das mulheres, então é necessário trabalhar em cima disso”, afirma Rachel Dornelas, analista do Sebrae e gestora do projeto de empreendedorismo feminino da instituição.
Para Dornelas, o empreendedorismo feminino precisa de uma rede de apoio para fortalecer seus negócios, tornando-os mais competitivos. “Às vezes, trabalhar o network não é algo tão comum para as mulheres quanto é para os homens. A mulher tem uma rede de contatos pobre, somos, muitas vezes, privadas de uma ampliação que é essencial para que elas cresçam no empreendedorismo”, afirmou ela.
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