A cerimônia do Oscar 2023, que aconteceu na noite desse domingo (12/2), teve número recorde de indicações e de premiações asiáticas e foi repleta de primeiras vezes num movimento que tende a diversificar a Academia cada vez mais. Ao todo, foram seis personalidades asiáticas a receberem a estatueta do Oscar, feito que nunca havia acontecido em toda a história da premiação.
O maior destaque da noite foi “Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo” (2022), que levou sete das 11 indicações: Melhor Filme; Melhor Direção; Melhor Atriz; Melhor Atriz Coadjuvante; Melhor Ator Coadjuvante; Melhor Roteiro Original; e Melhor Montagem. O filme se consagra como o mais premiado da história, segundo levantamento do IGN, colecionando 165 vitórias que incluem o Oscar, o Bafta, O Globo de Ouro, o SAG Awards, o Critic's Choice Award e muitos outros.
Anteriormente, o “hat trick” de indicações (agrupamento de Melhor Filme, Melhor Direção e Melhor Roteiro Original) só foi conquistado outras duas vezes por cineastas asiáticos: Bong Joon-Ho, com “Parasita” (2019) em 2020, e Chloé Zhao, com “Nomadland” (2020) em 2021. Ambos não conseguiram a premiação das três indicações, mas saíram com as estatuetas de Melhor Filme e Melhor Direção.
Com conquistas que envolvem desde Michelle Yeoh, a primeira mulher asiática amarela a receber a estatueta de Melhor Atriz – e segunda mulher racializada a ganhar o prêmio em 21 anos – até a trilha sonora de “RRR: Revolta, Rebelião, Revolução” (2022), que rendeu o primeiro Oscar de Melhor Canção Original ao cinema indiano, a cerimônia desta edição foi reconhecida pela diversidade asiática.
Nesta edição, repleta de primeiras vezes, o roteirista de “Living” (2022), Kazuo Ishiguro, entrou como primeiro asiático e sexto vencedor do Prêmio Nobel a ser indicado à categoria; e também foi a primeira vez em que o cinema indiano recebeu três indicações.
Em uma segunda vez, a diretora Domee Shi esteve presente como indicada com “Red: Crescer é uma Fera” (2022). Em 2019, ela ganhou o Oscar de Melhor Curta-Metragem de Animação com “Bao”.
Ao todo, foram dez personalidades asiáticas indicadas – das quais quatro foram em atuação – que renderam seis nomes premiados:
- Chandrabose e M.M. Keeravaani, indicados e vencedores da categoria de Melhor Canção Original
- Daniel Kwan (em parceria com Daniel Scheinert), indicado e vencedor das categorias Melhor Filme, Melhor Direção e Melhor Roteiro Original
- Domee Shi, indicada à categoria de Melhor Filme de Animação
- Hong Chau, indicada à categoria de Melhor Atriz Coadjuvante
- Kartiki Gonsalves, indicada e vencedora da categoria de Melhor Documentário de Curta-Metragem
- Kazuo Ishiguro, indicado à categoria de Melhor Roteiro Adaptado
- Ke Huy Quan, indicado e vencedor da categoria de Melhor Ator Coadjuvante
- Michelle Yeoh, indicada e vencedora da categoria de Melhor Atriz
- Shaunak Sen, indicado à categoria de Melhor Documentário de Longa-Metragem
- Stephanie Hsu, indicada à categoria de Melhor Atriz Coadjuvante
O recorde de indicações anterior a esta edição aconteceu em 2004, com Ben Kinsley, ator britânico de ascendência indiana, à categoria de Melhor Ator; de Shohreh Aghdashloo, atriz iraniana naturalizada estadunidense, à categoria de Melhor Atriz Coadjuvante; e de Ken Watanabe, ator japonês, à categoria de Melhor Ator Coadjuvante. Nenhum deles levou a estatueta para casa.
Oportunidades para asiáticos
Obras como “Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo” são responsáveis por trazer representações positivas para pessoas amarelas, que sempre estiveram acostumadas com personagens estereotipados. Michelle Yeoh, quando recebeu o prêmio de Melhor Atriz no SAG Awards 2023, afirmou que “Não é apenas por mim, é por cada menina que se parece comigo”.
A atriz nascida na Malásia já era uma grande estrela do cinema asiático e passou a receber convites para a indústria de Hollywood há pouco tempo. Hoje, com 60 anos, é a primeira vez em que teve a oportunidade de interpretar uma personagem que lhe rendeu um Oscar – e diversos outros prêmios históricos.
James Hong, ator que interpretou Gong-Gong no longa, também fala sobre a falta de oportunidades no cinema hollywoodiano para atores asiáticos. Apesar de sua longa trajetória, iniciada em 1955, ele recebeu apenas dois prêmios: o Annie Awards pela dublagem de Mr. Ping, em “Kung Fu Panda Holiday" (2010) e, agora, o SAG Awards 2023 na categoria de Melhor Elenco em Filme, por “Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo”.
Em seu discurso no SAG Awards, Hong relembrou como era a indústria antigamente. “Há 70 anos, preciso dizer, havia atores em filmes que usavam fitas para esticar os olhos, e falavam assim porque os produtores diziam que asiáticos não eram bons o suficiente e que não davam bilheteria. Mas olhe para nós agora”, disse ele.
Ke Huy Quan também passou por dificuldades ao longo de sua carreira como ator. Quando criança, conseguiu papéis de destaque em “Indiana Jones e o Templo da Perdição” (1984) e em “Os Goonies” (1985), mas bastou crescer um pouco que as ofertas começaram a sumir.
“Quando comecei minha carreira como ator mirim em Indiana Jones e o Templo da Perdição, me senti muito sortudo por ter sido escolhido. À medida que envelheci, comecei a me perguntar se era isso, se era apenas sorte. Por anos, tive medo de não ter mais nada a oferecer. Não importa o que eu fizesse, nunca superaria o que conquistei quando criança. Felizmente, mais de 30 anos depois, dois caras pensaram em mim. Eles se lembraram daquele garoto e me deram a oportunidade de tentar novamente", relembrou em seu discurso no Globo de Ouro.
Quan também disse que sua vontade de voltar a atuar ressurgiu com a estreia do filme “Podres de Ricos” (2018). Segundo ele, foi essa comédia romântica com elenco majoritariamente asiático que lhe deu esperanças de que poderia haver um crescimento da procura por atores como ele na indústria hollywoodiana.
“Liguei para um amigo meu, que é agente, e perguntei ‘Estou pensando em voltar a atuar. Você gostaria de me representar?’ Literalmente, duas semanas depois, ele me liga e diz que ‘Tem este filme escrito pelos Daniels e protagonizado pela Michelle Yeoh, e tem um papel que você poderia fazer, que é o de marido dela”, disse ele em entrevista à Variety.
Ainda falta diversidade
A cerimônia do Oscar 2023 foi histórica pela grande expressividade de artistas asiáticos com direito a um momento bastante simbólico entre as únicas duas mulheres racializadas a terem recebido a estatueta de Melhor Atriz: Halle Berry, a única mulher negra a receber o prêmio – em 2002 por “A Última Ceia” – anunciou e entregou a vitória à Michelle Yeoh, única e primeira amarela a receber o Oscar na categoria.
Apesar das conquistas históricas, também foi destaque o fato de que não houve nenhum ator ou atriz negros indicados às principais categorias de atuação, além da falta de mulheres na categoria de Melhor Direção.
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