Na semana passada, a Reserva, marca de roupas carioca, foi acusada de apropriação cultural e racismo em sua nova coleção feminina, que recebeu o nome, a princípio, de “Arigatô: uma saudação ao Japão”. A proposta era ter inspiração na cultura japonesa, mas modelos amarelos (descendentes leste-asiáticos) não apareceram nas fotos do site e ficaram em segundo plano nas imagens de divulgação publicadas nas redes sociais.
Com um histórico problemático envolvendo dois casos relativamente recentes de racismo com manequins pretos, a Reserva fez as fotos da campanha no Bairro da Liberdade, em São Paulo (SP), conhecido pela forte presença da cultura japonesa, mas não deu protagonismo a quem dizia homenagear. Nas redes sociais, o caso repercutiu negativamente e fez a marca alterar o direcionamento da divulgação da coleção, mas não houve pronunciamento da empresa.
“Se nem as modelos protagonistas eram amarelas, imaginem quantas outras pessoas amarelas devem ter sido chamadas para esse projeto (maquiadora, estilista, pesquisadora…)”, escreveu uma internauta nas redes sociais. “E a gente fica realmente ‘servindo de enfeite’, algo que é bonito só de longe, nunca sendo realmente o foco”, respondeu outra.
Representação
A criadora de conteúdo Bruna Tukamoto publicou um vídeo falando sobre as problemáticas da campanha, relembrando, também, o caso da Arezzo, que escalou a ex-BBB Jade Picon para estampar os materiais promocionais de uma sandália que remete à ancestralidade africana. “O sentimento é basicamente o mesmo, a gente não se vê representado numa coleção que é, teoricamente, uma homenagem para a gente”, disse ela.
“Fazem de propósito, assim como a Arezzo, para gerar burburinho e vender mais. Como sempre, essas culturas ‘exóticas’ sendo exploradas”, comentou uma usuária do Instagram. “Amam usar a cultura japonesa para ganhar dinheiro, mas respeitar…”, complementou outra.
Outro ponto levantado pelos internautas foi a reprodução de estereótipos relacionados à cultura japonesa, que distanciam nipo-brasileiros (descendentes de japoneses nascidos no Brasil) da sensação de pertencimento ao país. “O próprio nome da coleção, Arigatô, reforça a ideia de estrangeirismo sobre nós. É uma das palavras que mais escutamos durante a nossa vida, até de pessoas que não conhecemos”, explica Bruna.
No banner da campanha exposto no site da marca, também era possível ler “Contemporânea, moderna e igualmente tradicional, a estética da coleção Arigatô visita elementos icônicos. Carpas, leques, flores e dragões aparecem pintados a mão ou estampados por meio de técnicas orientais milenares”. Em um comentário, um usuário do Instagram comentou que “os elementos para ‘homenagear’ são os mais estereotipados possíveis”.
“ uma marca de qualidade, porém falta muito embasamento nas campanhas deles. Acho que a equipe de marketing, designers e direção deveriam estudar mais para as campanhas. Estamos em 2023 e é um tipo de coisa que não deveriam mais pecar”, escreveu outro.
Consultoria
Apesar dos comentários apontando uma suposta falta de consultoria, a Reserva afirma nas publicações sobre a coleção que houve um trabalho conjunto com o Instituto Cultural Brasil-Japão mostrando, inclusive, parte do processo criativo das estamparias.
“O Instituto Brasil-Japão nos orientou e acompanhou pessoalmente durante todo o processo de criação e desenvolvimento da coleção com o objetivo de nos instruir e certificar que tudo estaria sendo verdadeiramente alinhado aos valores ‘orientais’”, disse Ivana Veríssimo em uma publicação no perfil da Reversa, linha feminina da Reserva.
Em atualizações recentes, a marca retirou o nome “Arigatô” da campanha no site substituindo por outras categorias, além de incluir fotos de uma modelo amarela para a exibição de alguns dos produtos.
Em um movimento contrário à campanha da Reserva, internautas começaram a indicar marcas independentes de pessoas amarelas nas redes sociais.