Em 3 de abril, a desembargadora Ana Paula Nannetti Caixeta, 3ª vice-presidente do TJMG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais) e superintendente da Gestão de Inovação, assumiu, interinamente, o comando do Poder Judiciário mineiro, sendo a primeira mulher a ocupar o cargo em 150 anos de órgão. Apesar da conquista, sua gestão já começou tendo vida curta e se encerrou em 9 de abril.
O TJMG, no entanto, interpretou o fato como conquista e comemorou. O presidente, desembargador José Arthur de Carvalho Pereira Filho, afirmou que esse é um marco histórico e que se trata de uma conquista significativa.
“Ao lado dela, estão milhões de mulheres anônimas, que lutam todos os dias por mais igualdade de gênero, bem como a legião de mulheres que entraram para a história ao abrirem caminhos em diferentes campos. Sabemos que ainda há muitos muros a serem quebrados, mas hoje podemos celebrar mais uma muralha que é derrubada”, declarou durante a cerimônia de posse.
Presidência interina
A desembargadora assumiu de forma interina por seis dias por conta da ausência de seus imediatos, mas também afirma reconhecer o fato como um marco histórico para o Tribunal mineiro e para sua vida pessoal e profissional.
“Esse ato simbólico reflete a normalização de enxergar a mulher em qualquer espaço de poder, de gestão, e isso é muito importante para as magistradas, para as servidoras e para as mulheres que atuam em cargos de chefia, como empresárias, médicas, dentistas, professoras, em toda a atividade civil”, conta.
O desembargador Renato Dresch, 2º vice-presidente e superintendente da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (Ejef), afirma que sua presidência não deve ser interpretada apenas como um ato simbólico. “Trata-se de uma mudança de paradigma, em nossa tentativa de buscar mais igualdade, no nosso enfrentamento da assimetria que existe em nossa sociedade, na qual a mulher, historicamente, sempre foi relegada a segundo plano”, afirma.
“A simetria nos fortalece, com a soma de cada um, que possui uma força própria. Por isso, este é um acontecimento muito importante para o Poder Judiciário mineiro. Ainda que seja uma Presidência por apenas alguns dias, o ato demonstra que há boa vontade no sentido de que a igualdade impere no nosso Tribunal”, complementa Dresch.
Pessoalmente, a presidência interina ainda é uma conquista para a desembargadora, que conta sobre seu histórico no Tribunal mineiro.
“Sempre fui muito acolhida pelos colegas que estão na direção do TJMG. Agradeço a cada um deles. Ser tratada sem sofrer nenhuma exclusão de gênero, neste momento profissional da minha vida, é algo que me fortalece”, afirma.
Presença feminina em cargos de poder
Ana Paula Caixeta é formada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e atua há 32 anos na magistratura. Entrou no TJMG em outubro de 2012 por meio de concurso público e coleciona medalhas e condecorações recebidas ao longo da trajetória profissional.
“Sinto que tenho uma vocação muito grande para esse ofício, pois além da questão jurisdicional. Sempre fui muito tocada pelas questões que hoje nós chamamos de políticas públicas judiciárias. Temos a possibilidade de compatibilizar a legalidade dos procedimentos judiciais com a humanização”, conta.
Ana Paula Caixeta também pontua a necessidade e o crescimento do fortalecimento da presença das mulheres nos Três Poderes, relembrando da Resolução do Conselho Nacional de Justiça n° 255/2018, que instituiu a Política Nacional de Incentivo à Participação Feminina no Poder Judiciário.
“Houve uma sugestão, uma recomendação de que os Tribunais adotassem a participação feminina, e isso, na verdade, é um movimento mundial que vem se fortalecendo cada vez mais. Temos, inclusive, algumas orientações da ONU [Organização das Nações Unidas] sobre isso”, explica.
Para ela, é importante que mulheres ocupem cargos de poder, mas que ainda é preciso que haja uma mudança drástica na sociedade para que isso seja visto sem estranhamento.
“[A equidade de gênero] poderá vir naturalmente, ou não. Existe uma cultura ligada ao patriarcado que precisa cair. É preciso mudar o olhar da sociedade, porque a sociedade ainda não enxerga a mulher em espaço de poder com naturalidade. Por isso, muitas mulheres não fazem carreira, muitas não se inscrevem [em concursos públicos], são vários fatores, mas já existe um movimento no sentido de que haja uma paridade de gênero com homens e mulheres tendo oportunidades iguais”, declara ela.
O desembargador Alberto Vilas Boas, 1° vice-presidente, concorda que ainda há muito chão a ser percorrido para que haja, de fato, a equidade de gênero, mas ressalta a importância de casos como o da desembargadora.
“A circunstância de a desembargadora Ana Paula Caixeta assumir, interinamente, a Presidência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais implica a necessidade de refletirmos sobre os caminhos que a sociedade brasileira deve percorrer para que exista uma efetiva igualdade de gênero, especialmente nas esferas mais elevadas do poder”, comenta ele.
“É preciso que, à mulher, seja dada a devida e imprescindível visibilidade a que tem direito no contexto de um Poder que integra a estrutura do Estado Democrático de Direito, mas ainda é dominado por uma constante maioria masculina”, complementa.
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