Jornal Estado de Minas

DESIGUALDADE DE GÊNERO

Mulheres do campo trabalham mais e recebem 20% a menos que homens, diz FAO


Um relatório divulgado nesta quinta-feira (13/4) pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) mostrou que as mulheres trabalhadoras com funções relacionadas a sistemas agroalimentares exercem atividades laborais em condições piores que os homens e recebem menos que eles.





O relatório “O Estado das Mulheres nos Sistemas Agroalimentares” mostra que a média é de US$0,82 para cada US$1 pago a trabalhadores do gênero masculino, apesar de a porcentagem de mulheres trabalhadoras na América Latina e no Caribe (36%) ser semelhante a de homens (38%) nesta área. Em alguns locais, como na África Subsaariana, 66% do emprego das mulheres está no setor, em comparação a 60% dos homens.


Um dos destaques da publicação é a marginalização do papel das mulheres e de suas condições de trabalho. Muitas vezes, elas trabalham em condições piores que as dos homens e em empregos irregulares, informais, de meio período, pouco qualificados ou intensivos em mão de obra.


Há, também, diferença na produtividade entre homens e mulheres: o nível é 24% mais alto para eles – consequência da discriminação e da desigualdade, de acordo com impactos mensurados pela FAO. As duplas ou triplas jornadas vividas pelas mulheres – com cuidado da casa, da família e estudos, além da pressão que acompanha o contexto – interferem no trabalho delas.





América Latina e Caribe

Outro aspecto pontuado pelo relatório é a precarização de ferramentas de trabalho adequadas às necessidades, além da falta de escuta das mulheres no trabalho. Apesar de 75% dos documentos de políticas sobre agricultura e desenvolvimento rural de 68 países reconhecerem a importância das mulheres no setor, apenas 19% estabelecem metas para trazer soluções para elas.


Para exemplificar, Úrsula Zacarias, representante da FAO no Brasil, contou à Agência Brasil sobre a experiência de mulheres que trabalham na classificação de batatas com auxílio de maquinário na Bolívia, onde elas representam 54% da força de trabalho do sistema agroalimentar.


"As mulheres tinham maior participação na classificação das batatas, mas, no momento em que foi feita a avaliação sobre a máquina, elas não participaram do debate. Logo, não puderam levar suas contribuições. Por isso, os investimentos aplicados não corresponderam à realidade. Elas levam mais tempo para exercer seu trabalho e com dificuldades, o que gera um desgaste".





O relatório ainda mostra que as mulheres estão mais suscetíveis a situações envolvendo choques climáticos e desastres naturais, porque, em geral, há restrições a elas na distribuição de recursos disponibilizados nesses casos. "Além disso, elas têm menor acesso ao crédito", acrescenta Zacarias.


Os especialistas da FAO, no entanto, também evidenciaram que os homens têm maior propriedade ou direitos de posse garantidos sobre terras agrícolas do que as mulheres em 40 dos 46 países que afirmam desenvolver ações de igualdade de gênero, fator considerado um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.


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Na América Latina e no Caribe, os governos têm enfrentado cada vez mais desafios relacionados às lacunas estruturais enfrentadas pelas mulheres rurais no acesso à terra, insumos, serviços, finanças e tecnologia digital. Ainda assim, existe um esforço para que políticas e programas sejam desenvolvidos e contribuam para acabar com as desigualdades.





A publicação também mostrou que a proporção de mulheres na força de trabalho agrícola é maior ou está aumentando em relação à de homens em áreas rurais com emigração alta e predominantemente masculina.


As mulheres, no entanto, têm mais insegurança alimentar do que os homens em todas as regiões do mundo – diferença que aumentou desde a pandemia de COVID-19. Globalmente, a diferença entre homens e mulheres na prevalência de insegurança alimentar moderada ou grave aumentou para 4,3 pontos percentuais em 2021, de 1,7 pontos percentuais em 2019, impulsionada em grande parte por diferenças cada vez maiores na América Latina e no Caribe, onde a diferença atingiu 11,3 pontos percentuais.

Resoluções e recomendações

De acordo com o relatório, eliminar as disparidades criadas pelo tratamento desigual entre gêneros aumentaria o PIB (Produto Interno Bruto) global em quase US$ 1 trilhão. Caso isso fosse feito, reduziria o número de pessoas com insegurança alimentar em 45 milhões.





Os benefícios dos projetos que empoderam as mulheres também são maiores do que aqueles que apenas levam em conta as questões de gênero. Os autores do relatório explicam que, se metade dos pequenos produtores tivesse intervenções de desenvolvimento focadas no empoderamento das mulheres, haveria um aumento significativo na renda de outros 58 milhões de pessoas e na resiliência de outros 235 milhões.


“Ao abordar as desigualdades endêmicas de gênero nos sistemas agroalimentares e empoderar as mulheres, o mundo dará um salto adiante para alcançar as metas de erradicar a pobreza e criar um mundo sem fome”, diz QU Dongyu, diretor-geral da FAO, no prefácio do relatório.


“Alcançar sistemas agroalimentares eficientes, inclusivos, resilientes e sustentáveis %u200B%u200Bdependerá do empoderamento de todas as mulheres e da igualdade de gênero. As mulheres sempre trabalharam nos sistemas agroalimentares. É hora de fazermos os sistemas agroalimentares funcionarem para as mulheres”, acrescentou ele.





 

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