Jornal Estado de Minas

POLÊMICA

Campanha francesa contra assédio sexual gera polêmica nas redes sociais

Nesta semana, o governo francês iniciou uma nova campanha para combater a violência e o assédio sexual em espaços públicos. Apesar de várias ações nos últimos anos, essa questão continua sendo um sério problema no país: nove em cada dez mulheres francesas adotam estratégias diárias para evitar serem vítimas de condutas sexistas nas ruas. Contudo, a abordagem do Ministério do Interior na campanha se tornou alvo de críticas e ironias nas redes sociais.





A partir de terça-feira (30), policiais e agentes de segurança pública em toda a França foram mobilizados para escolher locais de grande movimento e distribuir panfletos informativos sobre a segurança das mulheres nas ruas. A campanha visa conscientizar a população sobre como agir e encorajar as vítimas de violência sexual e sexista a denunciar esses crimes e registrar boletins de ocorrência.

A ação acontece às vésperas do verão no Hemisfério Norte, época em que as temperaturas aumentam, os corpos ficam mais expostos e o assédio nas ruas tende a crescer. O Ministério do Interior da França pretende distribuir cinco milhões desses panfletos informativos até o final de setembro.

O sexismo ainda afeta as mulheres francesas. De acordo com o último relatório do Alto Conselho para a Igualdade entre Mulheres e Homens, divulgado em janeiro, 47% dos homens franceses acreditam ser normal abordar uma mulher desconhecida na rua para convidá-la para sair. Um quarto dos homens entre 25 e 34 anos acha que às vezes é necessário recorrer à violência para ser respeitado. O relatório também revela que 37% das mulheres francesas já passaram por situações de não-consentimento sexual.





Porém, a campanha governamental tem gerado controvérsias. A escolha do formato da campanha foi alvo de críticas de internautas nas redes sociais. Os panfletos aconselham as vítimas de violência sexual a 'fazer barulho', 'alertar as pessoas ao redor' e 'chamar a polícia o mais rápido possível'. Além disso, recomendam que testemunhas tentem intervir, confrontando o agressor e filmando os atos.
Usuários das redes sociais questionam a eficácia da campanha e apontam a falta de punição adequada aos agressores. Além disso, destacam que a própria polícia francesa, que recentemente protagonizou graves agressões durante protestos contra a reforma da Previdência, agora é responsável por instruir a população sobre violências.

O ministro do Interior, Gérald Darmanin, também é lembrado por internautas por ter sido acusado de estupro por uma mulher em 2017, caso encerrado por falta de provas no início deste ano. Embora não tenha sido comprovado o não consentimento, mensagens trocadas entre o ministro e a suposta vítima mostraram que a relação sexual ocorreu em troca de favores.





Organizações feministas reagem ao lançamento da campanha e apontam que muitos policiais franceses não foram treinados para acolher mulheres vítimas de violência sexual e sexista. A principal organização feminista da França, Nous Toutes (Nós Todas), questiona o impacto que a campanha terá, considerando que serão distribuídos apenas cinco milhões de panfletos em um país com 67 milhões de habitantes.

Diariata N'Diaye, diretora da associação 'Resonantes', que luta contra as violências sexuais e sexistas, questiona por que a nova campanha não se dirigiu diretamente aos homens, já que em 86% dos casos de crimes e delitos sexuais e sexistas na França, as vítimas são mulheres. 'Acho problemático distribuir esses folhetos às mulheres. Elas já sabem que podem telefonar para a polícia se sentirem ameaçadas', afirma.
Apesar das críticas, ativistas feministas reconhecem que qualquer iniciativa é válida para incentivar as mulheres a denunciarem as violências às autoridades. No final de 2022, o Ministério do Interior da França informou que, nos últimos cinco anos, houve um aumento de 77% nos registros de agressões contra mulheres. Entretanto, esses números representam apenas uma parte do problema, já que menos de 10% das vítimas de crimes e delitos sexuais fora do âmbito familiar procuram a polícia e registram ocorrências, segundo estudo publicado em 2020 pelo Serviço de Estatísticas do Ministério do Interior da França.