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Estado de Minas HIV

PrEP: Novos usuários aumentaram 84% em MG, e BH tem fila de espera de meses

Tratamento teve início ao final de 2017. Método de prevenção consiste no uso de medicamento para reduzir o risco de infecção pelo HIV


07/06/2023 19:29 - atualizado 07/06/2023 19:29
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Marcone é um homem negro de cabelos crespos. Ele usa uma camisa vermelha e segura em suas mãos um frasco de PrEP
Marcone Santos é usuário de PrEP desde 2018 e procura desestigmatizar o uso da medicação em seus círculos sociais (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A. Press)
O número de novos usuários de Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) cresceu 47% no Brasil e 84% em Minas Gerais entre 2022 e 2023, de acordo com o Painel PrEP do Ministério da Saúde. Em Belo Horizonte (MG), já são 1.824 pessoas vinculadas ao tratamento da PrEP, mas a fila de espera pode durar meses.

O tratamento com PrEP é recente no Brasil – um dos únicos países da América Latina que oferecem distribuição gratuita – e é feito pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Além da disponibilização da medicação, também são oferecidos serviços de testagem de ISTs e acompanhamento médico constante.

"Na rede SUS-BH, nós temos a PrEP, que é o método de prevenção que consiste no uso de um medicamento para reduzir o risco de infecção pelo HIV. Mas muito além e antes dele, nós oferecemos o acompanhamento, o cuidado dessas pessoas, vinculando-as aos serviços de atendimento especializados em infectologia", explica Renata Mascarenhas, diretora de Assistência à Saúde da Secretaria de Saúde da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH).

A PrEP é a combinação de Tenofovir com Emtricitabina (TDF/FTC), medicamentos que bloqueiam alguns "caminhos" que o HIV usa para infectar o organismo. O tratamento pode ser diário ou sob demanda, e para iniciá-lo é preciso fazer um agendamento em unidades de saúde especializadas.
 

Os grupos prioritários para o uso da PrEP são pessoas com maior vulnerabilidade à infecção pelo HIV:
  • Gays e outros homens que fazem sexo com homens (HSH)
  • Pessoas trans e travestis
  • Trabalhadoras(res) do sexo
  • Parcerias sorodiferentes (uma das parcerias vive com HIV)

Aumento do uso

O aumento do número de novos usuários de PrEP nos últimos anos é bastante expressivo. No Brasil, somente nos três primeiros meses de 2023, foram 12.343 novos usuários, em comparação aos 8.393 de 2022 no mesmo período.

A fila de espera para o tratamento é dinâmica e leva em consideração se a pessoa é ou não público alvo da medicação. No entanto, apesar de a Secretaria de Saúde da PBH trabalhar para a expansão do atendimento, a fila pode chegar a mais de meio ano de espera, como conta Sosti Reis, de 35 anos, que foi procurar pelo tratamento após o término de um relacionamento e precisou esperar por sete meses para ter acesso à PrEP.

"Como eu estava solteiro na época, resolvi fazer meus testes [de ISTs] e me cadastrar para tomar a PrEP. Isso foi no ano passado, em 2022, mas demoraram muito para me chamar. Foi só depois de sete meses que, em janeiro deste ano, comecei a tomar o medicamento. Hoje em dia é ótimo: já faço o tratamento e todo o atendimento via SUS, volto de quatro em quatro meses para fazer novos exames, além do acompanhamento com um infectologista", explica ele.
 
Uma mão negra segura um frasco de PrEP
Procura pelo tratamento com PrEP cresceu nos últimos anos (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A. Press)
 
De acordo com o doutor em Infectologia Dirceu Greco, o que Sosti faz é importante, já que a testagem recorrente e o repasse de informações sobre a prevenção de outras ISTs para além da Aids e do vírus da HIV – que a PrEP cobre – evitam que outras infecções sejam contraídas e/ou transmitidas, já que o uso da PrEP é frequentemente associado à diminuição do uso de preservativos.

"Na prática, a PrEP é um complemento. Também precisamos desmistificar que, usando a medicação, não é mais preciso usar preservativos, porque ela previne apenas o HIV. Outras ISTs, como gonorreia, clamídia e HPV são transmitidas pelo mesmo caminho e o uso da PrEP não impede sua contaminação", explica o infectologista.

Incentivos

Um dos grandes incentivos ao uso da PrEP é o atendimento proporcionado pelas unidades de saúde especializadas. De acordo com Renata Mascarenhas, a cidade de Belo Horizonte conta com um plano de educação permanente para profissionais da saúde que atendem em unidades de atendimento específicas.

"Essa temática é pautada todos os anos em nosso planejamento de Saúde, porque sabemos da importância de um tratamento como esse. Nós também temos oito equipes de Consultório na Rua, além das equipes do programa BH de Mãos Dadas Contra a Aids, que são profissionais que estão ativamente em todos os territórios para divulgarem a PrEP, tendo contato com pessoas que são público-alvo do tratamento e chamando a atenção para a importância de um acompanhamento", explica ela.

Sosti é um dos usuários que elogia o tratamento humanizado dos Centros de Testagem da rede SUS-BH.

"Sempre gostei muito dos enfermeiros e dos médicos. Você tem plena certeza de que eles têm um treinamento diferente, tanto de acolhimento quanto de esclarecimento sobre ISTs. É uma tranquilidade para perguntar sobre a sua vida sexual sem moralismo, o que é uma coisa muito importante, porque você fica à vontade para falar, e acho que a informação começa com a gente naturalizando essas coisas. É um trabalho sensacional", afirma ele.

Para Marcone Santos, usuário de PrEP desde 2018 que já precisou da dispensação da medicação em outras regiões do país, o tratamento que recebe dos profissionais de saúde da capital mineira é diferenciado.

"Durante a pandemia, eu fui para São Paulo e, lá, precisei procurar um posto de saúde para continuar a manutenção da PrEP. Não consegui devido às filas gigantescas, tanto para o atendimento inicial quanto para o uso do medicamento, além de ter me deparado com uma situação que até então nunca tinha vivenciado, que foi ser atendido por uma médica extremamente homofóbica", relata ele.

"Foi um atendimento demorado e muito violento, então preferi não fazer meu acompanhamento por lá, porque em Belo Horizonte, desde o início, eu sempre fui muito bem tratado e muito bem acolhido. Até encontrar um centro de atendimento mais acolhedor na região metropolitana de São Paulo, fiquei cerca de quatro meses sem usar a PrEP", complementa.

O período em que ficou sem tomar a PrEP não foi suficiente para que Marcone desanimasse e desistisse do tratamento. Atuante na área da saúde e pesquisador, ele conta que teve receio, a princípio, de começar a tomar uma medicação pouco conhecida, mas que verificou sua eficácia e, hoje, incentiva pessoas de seu círculo social a iniciarem o tratamento.

"Pelo menos uns três amigos tiveram interesse de buscar tratamento com a PrEP, ou pelo menos buscaram pensar se essa política de promoção de saúde se adequa às suas rotinas e aos seus comportamentos sexuais. Porque é, de fato, um direito. Está no SUS e faz parte de uma política de saúde pública, é um direito que deve ser acessado e apropriado por nós", explica.

Barreiras

Apesar do aumento de novos usuários de PrEP e do incentivo à procura pelo tratamento, ainda há diversas barreiras que impedem ou dificultam o acesso à medicação de determinados públicos.

Dirceu Greco, que trabalha com o projeto PrEP 15-19 – estudo realizado pela UFMG, USP e UFBA que conta com financiamento da Organização Mundial da Saúde (OMS)/Unitaid e do Ministério da Saúde –, conta que grande parte dos usuários iniciais da PrEP não faziam parte de grupos tão vulnerabilizados, e que muitas políticas públicas não costumam chegar em áreas marginalizadas por falta de informação.

"Quando a PrEP começou a ser liberada pelo SUS, a população que mais estava acessando esse direito eram homens brancos, a maioria com mais de 12 anos de estudo. É um grupo que tinha mais acesso à informação, então havia uma necessidade de chegar em populações mais vulneráveis", explica o infectologista.

Programas como o PrEP 15-19 auxiliam na divulgação e na promoção do direito ao tratamento com PrEP para jovens vulnerabilizados. O projeto atua no Centro de Referência das Juventudes, localizado no Centro da cidade, próximo à Praça da Estação.

Em dezembro de 2021, a Secretaria de Saúde do Município ampliou a rede de atendimento de tratamento com PrEP e hoje já atende a demandas de cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte, disponibilizando atendimento especializado.

Outro impedimento para o uso da medicação por muitas pessoas é o medo do preconceito. A associação da PrEP à Aids ainda é motivo de desconfiança para aqueles que desconhecem a função do tratamento, e para além de profissionais da saúde, usuários têm um papel importante na desestigmatização antiretrovirais.
 
Marcone é um homem negro de cabelos crespos. Ele usa uma camisa vermelha e carrega uma ecobag preta
Marcone diz que alguns de seus colegas tomaram conhecimento sobre a PrEP a partir de relatos seus (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A. Press)
 
"Eu comecei a usar a PrEP bem no início da disponibilização pelo SUS, então eu percebi que muitas pessoas, até do meu nicho social, tinham certos preconceitos com a PrEP por conta de estigmas associados ao HIV e à Aids por puro desconhecimento mesmo. Mas fui me empenhando para socializar os conhecimentos sobre a medicação nos espaços em que frequentava e vi que, de fato, algumas pessoas tomaram conhecimento da PrEP por mim, principalmente a partir do momento em que ela se tornou parte da minha rotina", conta Marcone.

Atendimento

De acordo com Mayara Marques, coordenadora de IST/Aids e Hepatites Virais da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais, há um trabalho constante para a ampliação de serviços de atendimento especializado no estado.

“Nós iniciamos em 2018 com cinco serviços atendendo às demandas de PrEP e, hoje, em 2023, já contamos com 45 serviços. Nem no cenário da pandemia da COVID-19 nós deixamos de ampliar esse número. Atualmente, nós estamos trabalhando para que todos os 75 serviços de atendimento especializado atendam a essas demandas”, explica ela.

"A gente observa, ainda, uma grande dificuldade de alcançar as populações vulneráveis, mas percebemos que isso não é só no estado de Minas Gerais, mas sim uma dificuldade de âmbito nacional que a gente só vai superar levando informação às pessoas", completa Mayara.

Para entrar na lista de espera do tratamento com PrEP, é preciso fazer um agendamento, no qual o possível usuário passa por uma avaliação e é ou não aprovado, dependendo de suas condições, que podem ou não se encaixar nos públicos-alvo do atendimento.

‌O encaminhamento de residentes de outras cidades ocorre por meio da Secretaria de Saúde do município de origem, uma vez que Belo Horizonte disponibiliza vagas de atendimento para a região metropolitana.

O agendamento de consultas pode ser realizado nas seguintes unidades de saúde:
 
CTA Hipercentro - Shopping Caetés
R. Caetés, 466, Piso Caetés - Centro | 3246-7007

CTA/SAE Sagrada Família
R. Joaquim Felício, 141 - Sagrada Família | 3277-5757

CTR/DIP Orestes Diniz
Al. Vereador Álvaro Celso, 241 - Santa Efigênia | 3277-4341

URS Centro-Sul
R. Paraíba, 890 - Funcionários | 3277-5356
 

Já o tratamento é realizado nas unidades:
 
Hospital Eduardo de Menezes
R. Dr. Cristiano Rezende, 2.213 - Bonsucesso | 3328-5055

CTA/SAE Sagrada Família
R. Joaquim Felício, 141 - Sagrada Família | 3277-5757

CTR/DIP Orestes Diniz
Al. Vereador Álvaro Celso, 241 - Santa Efigênia | 3277-4341

URS Centro-Sul
R. Paraíba, 890 - Funcionários | 3277-5356

PrEP x PEP

Não se deve confundir a PrEP (profilaxia pré-exposição) com a PEP (profilaxia pós-exposição). A PEP é o uso de medicamento anti-HIV em caráter de urgência, consumido após uma situação de risco, por somente 28 dias, e já está disponível no Brasil pelo SUS desde 2010. Já a PrEP é o uso programado: a pessoa começa a tomar antes da próxima exposição e toma por um tempo indefinido. Os medicamentos usados na PrEP e na PEP são diferentes.

Para tratamento com PEP, há redes de atendimento de acordo com a situação (não sexual, sexual consentida e sexual não consentida/violência sexual; gênero; idade)

A PrEP e a PEP são apenas dois dos vários tratamentos do SUS que fazem parte das estratégias de prevenção combinada do HIV. Dentro do conjunto de ferramentas, há também a testagem para o HIV; a distribuição de preservativos; o diagnóstico oportuno e o tratamento adequado de ISTs; redução de danos; gerenciamento de vulnerabilidades; supressão de replicação viral pelo tratamento antirretroviral; e imunizações.


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