Jornal Estado de Minas

HOMOFOBIA

André Valadão, investigado pelo MPF, poderá ser extraditado

As falas homofóbicas proferidas pelo pastor André Valadão, da Igreja Batista da Lagoinha, renderam um inquérito criminal do Ministério Público Federal (MPF) que apura uma possível prática de homotransfobia, crime que pode render prisão de até cinco anos. O religioso também poderia ser proibido de pregar e, como constantemente está nos Estados Unidos, pode ser extraditado.





Durante culto realizado em uma unidade da Batista da Lagoinha em Orlando, nos Estados Unidos, no último domingo (2/7), o pastor sugeriu que os evangélicos deveriam matar a população LGBTQIA+. “Agora é a hora de tomar as cordas de volta e dizer: Pode parar, reseta! Mas Deus fala que não pode mais”, disse Valadão.

Segundo a jurista e mestre em Direito Penal, Jacqueline Valles, o pastor também cometeu a prática de incitação ao crime, e explica como ele poderia ser extraditado de volta ao Brasil. “O artigo 7 do Código Penal impõe a territorialidade do Brasil mesmo aos crimes que não são praticados aqui, como é este caso. Se houver uma convenção com o país onde o crime foi cometido, o brasileiro pode ser extraditado para a aplicação das leis nacionais”, disse.

Para a jurista, não há elementos para o pedido de prisão preventiva contra o pastor, mas o MPF pode pedir aplicação de medidas cautelares para evitar que Valadão volte a cometer o crime.





“A prisão em flagrante existe para cessar o cometimento do crime. Neste caso, não se aplica mais. Mas, ainda assim, o artigo 282 do Código de Processo Penal prevê a aplicação de medidas cautelares para evitar a prática de novas infrações penais. Ou seja, há a possibilidade de o MPF solicitar que ele seja proibido de pregar, caso entenda, por exemplo, que há histórico de cometimento deste tipo de crime”, explicou Jacqueline Valles.
 

Qual a definição de transfobia?

A transfobia configura qualquer ação ou comportamento que se baseia no medo, na intolerância, na rejeição, no ódio ou na discriminação contra pessoas trans por conta de sua identidade de gênero. Comportamentos transfóbicos são aqueles que dizem respeito a quaisquer agressões físicas, verbais ou psicológicas manifestadas contra a expressão de gênero de pessoas trans e travestis.

O que é um ato transfóbico?

Atos transfóbicos podem ser cometidos por qualquer pessoa, mas geralmente partem de pessoas cisgênero que não compreendem ou têm aversão à comunidade trans, desencadeando ações como crimes de ódio.



Diferentemente de crimes comuns ou daqueles considerados passionais, a violência letal contra pessoas trans podem ter como fator determinante a identidade de gênero ou a orientação sexual da pessoa agredida.

A transgeneridade

Para entender melhor as relações entre identidade de gênero, é importante saber a diferença entre cisgênero e transgênero:
  • Cisgênero é aquela pessoa que se identifica com seu sexo biológico, seja masculino ou feminino (exemplo: uma pessoa que nasceu com genitália feminina e se identifica com o gênero feminino é uma mulher cis).
  • Transgênero é aquela pessoa que não se identifica com o sexo biológico que nasceu (exemplo: uma pessoa que nasceu com genitália masculina e se identifica com o gênero feminino é uma mulher trans).
  • Existem, também, diferenças entre mulheres transgênero e travestis que se concentram em suas identidades de gênero e maneiras de expressá-las.

O termo transgênero pode ser utilizado para se referir às pessoas que não se identificam com o seu sexo biológico e que podem buscar tratamentos hormonais ou cirúrgicos para se assemelharem ao gênero com o qual se identificam.

Já o termo travesti se refere uma identidade brasileira relativa apenas às pessoas com o sexo biológico masculino que se identificam com o gênero feminino e não necessariamente buscam mudar as suas características originais por meio de tratamentos.





Direitos das pessoas trans no Brasil

A Constituição Federal de 1988 não faz referência explícita à comunidade LGBTQIAP+, mas muitos dos seus princípios fundamentais englobam essa parcela da sociedade. É o caso do princípio da dignidade humana; da igualdade entre todos; e do dever de punir qualquer tipo de discriminação que atente contra os direitos fundamentais de todos.

Com eles, há dispositivos legais estaduais e municipais que tratam especificamente sobre a população LGBTQIAP e transfobia. Um exemplo é o Decreto 41.798 do Estado do Rio de Janeiro, de 2009, que criou o Conselho dos Direitos da População LGBTQIAP , que tem como finalidade e responsabilidade:
  • estimular e propor políticas públicas de promoção da igualdade e de inserção educacional e cultural dessa população;
  • adotar medidalegislativas que visam eliminar a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero;
  • receber, examinar e efetuar denúncias que envolvam atos discriminatórios contra membros da comunidade LGBTQIAP .

Outros avanços legislativos envolvem o reconhecimento em 2018, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), do direito das pessoas de alterarem seu gênero e nome civil nos cartórios – agora, sem a obrigatoriedade de passar por cirurgia de redesignação.



Há também a decisão do STF de 2019 de enquadrar crimes de LGBTfobia na lei do racismo – com as mesmas penas –, enquanto uma legislação específica não é elaborada.

Dados sobre a transfobia no Brasil

O Brasil ainda não possui dados oficiais sobre LGBTfobia em geral e os dados sobre a transfobia no país são divulgados pela Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) anualmente com base, principalmente, em notícias publicadas pela mídia.

Como já comentado, o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo – o que não configura apenas assassinatos, mas também inclui outras causas de morte, como suicídio e lesões em decorrência de agressões.

Brasil tem Secretaria LGBTQIA

Atualmente, o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania conta com a Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA , comandada pela travesti paraense Symmy Larrat.

Junto ao Ministério da Justiça, a Secretaria LGBTQIA articula projetos para proteção da população trans, inclusive com participação da Antra e das deputadas Erika Hilton (PSOL-SP) e Duda Salabert (PDT-MG), as primeiras parlamentares transgênero da história do Congresso Nacional.