Durante o primeiro show da banda Evanescence em Belo Horizonte, que aconteceu na última quarta-feira (25) no Arena Hall, localizada na Região da Savassi, pessoas com deficiência relataram falta de preparo da equipe do local, o que atrapalhou a experiência.
Na manhã desta sexta-feira (27), Renata Pam compartilhou nas redes socias sua experiência como mulher autista no evento.
“Em cada portaria que eu passei, os seguranças perguntavam onde que estava a pessoa com deficiência que eu estava acompanhando. Não souberam reconhecer o cordão que eu estava usando, que é usado internacionalmente e aprovado em lei brasileira como identificação oficial de pessoas com deficiências ocultas”, contou Renata.
Em janeiro deste ano, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) sancionou a Lei 11.444/22, que regulamenta o uso do Cordão Girassol como símbolo de identificação de pessoas com deficiência ocultas, garantindo atendimento prioritário em repartições públicas, empresas prestadoras de serviços públicos e estabelecimentos privados para os portadores.
Renata também contou ter ouvido um comentário infeliz de dois seguranças que estavam trabalhando no local, que disseram que ela era ‘muito bonita para ser autista’.
Ana Carolina Alamino, que tem deficiencia auditiva, visual, física e deficits cognitivos, também relatou dificuldades. Alamino só conseguiu sair da arquibancada para a área PCD após mostrar sua carteira de identidade — onde consta as deficiências — para o chefe de segurança.
“Eles foram muito eficientes comigo, mas eu tive que cobrar tudo. Eles não estavam munidos de treinamento e informação sobre o tema. Faltou capacitação da equipe de segurança para saberem lidar melhor com as pessoas com deficiência, eles já deviam ter esse preparo de saber deslocar o pessoal para os seus devidos lugares com total segurança”, contou Ana Carolina.
‘Era pra ser um momento inesquecível’
Para Renata, o show seria a realização de um sonho. Evanescence é a sua banda favorita há 20 anos e, pela primeira vez, se apresentou em solo mineiro.
“Desde o momento que eu pisei lá, eu tive problema. Cada situação vai sugando a energia, principalmente da pessoa com deficiência, que já está ali precisando de energia para conseguir ficar bem no espaço, sabe? Então, já na portaria, os problemas de não saber informar onde era a portaria PCD, eu já vi a primeira barreira. Depois, os seguranças não reconhecerem o cordão de girassol, aí eu já vi que eles não estavam nem um pouco treinados. Eu me senti invisível”, contou.
Por conta da correria e falta de divisórias, Renata comparou o momento de entrada para a arena com o ‘portão do Enem’. “Eu me senti em risco, as pessoas esbarrando em mim. Ali, eu já comecei sentir que eu ia entrar em crise. Chegando lá dentro mais e mais problemas. O sentimento é que se a gente, como pessoa com deficiência, não lutar, não gritar, não manifestar o nosso direito, ele nunca vai ser garantido. Isso consome uma energia muito grande”.
Por conta dos acontecimentos, Renata experienciou ‘shutdown’, que está ligado a sobrecargas emocionais, sensoriais ou até sociais que os autistas podem sentir em diversas situações.
Durante essas crises, há uma desconexão total ou parcial do momento, sem nenhum tipo de comunicação com o que está acontecendo.
“Eu simplesmente sentei na cadeira. Fiquei apática, olhando para o show e eu não conseguia sentir nada. Era a banda da minha vida. Era Para Ser um momento inesquecível. Eu vi as pessoas saindo de lá chorando, falando que foi maravilhoso e eu estava apática. Era para ter sido o show da minha vida e eu não senti nada, sabe?”, relatou Renata.
A partir de uma perspectiva PCD, Renata fez algumas sugestões de melhoria, como treinameinto dos seguranças e das pessoas que liam ingressos e de todo mundo que está ali no atendimento ao público, para que estejam preparados para lidar com esse público. Também sugeriu uma melhoria da área PCD, que também servia como passagem das pessoas do público geral.
“A área PCD tem que ser cercada, é necessário garantir a segurança física das pessoas. Parece que foi totalmente feito de última hora, assim como as cadeiras, que eram as cadeiras prioritárias e cadeiras de pessoas com deficiências. Elas simplesmente eram as primeiras cadeiras da fileira da arquibancada, onde tinha um adesivo colado nelas, mas a cadeira era minúscula. Tinha um cara do meu lado com muleta, sem um osso na perna, ele usava uma prótese por cima e precisava ficar com a perna esticada, mas ele não podia, porque a passagem das pessoas era ali”.
Estatuto da pessoa com deficiência
Conforme o Estatuto da Pessoa com Deficiência, que está em vigor desde janeiro de 2016, os direitos das PCDs são:
- Direito à acessibilidade
- Direito à igualdade e não discriminação
- Direito ao atendimento prioritário
- Direito à educação
- Direito à moradia
- Direito à saúde
- Direito ao trabalho
Posicionamento Arena Hall
A reportagem do Estado de Minas entrou em contato com a Arena Hall, que se pronunciou através de nota:
"Recebemos, com consternação, a informação de que pessoas PCDs tiveram problemas de atendimento durante o show do Evanescence, na última quinta-feira, 26 de outubro.
Lamentamos profundamente e vamos apurar com afinco as ocorrências, juntamente com as empresas responsáveis pelo evento e pela segurança.
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