A origem do queijo é milenar. Há relatos de seu consumo e produção até na Bíblia. Pastor de ovelhas, Davi costumava presentear Saul, rei de Israel, com a iguaria. "O queijo foi um dos primeiros alimentos processados, acompanha a história da humanidade desde os seus primórdios. Como as ovelhas eram animais domésticos, é bem possível que o homem primitivo tenha extraído leite delas. A partir daí, o leite coagulou e aquela massa acabou sendo processada de alguma forma", ressalta Elmer de Almeida, especialista em queijaria e consultor da Federação da Agricultura do Estado de Minas Gerais (Faemg).
Elmer é um dos convidados do 3º Festival do Queijo Minas Artesanal, que será realizado na Serraria Souza Pinto neste fim de semana. Domingo, ao lado do empresário Cássio Avelino, Elmer vai ministrar curso sobre maturação e conservação do laticínio. "A gente fará o apanhado da história do queijo, sua tradição, o processo de maturação. Damos dicas de conservação. A oficina é voltada para público mais específico, mas o festival abrange todas as pessoas. Há atividades para especialistas, leigos ou simplesmente para quem quiser experimentar queijos de qualidade", destaca.
O festival é o único evento voltado exclusivamente para o queijo minas artesanal feito com leite cru. Promoção da Faemg e do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), ele destaca a tradição do produto, declarado patrimônio cultural imaterial brasileiro pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
FRANÇA Altino Rodrigues Neto, superintendente técnico da Faemg, ressalta que essa edição do festival é muito especial. Em junho, Minas Gerais conquistou 51 medalhas no aclamado concurso Mondial du Fromage et des Produits Laitiers, realizado em Tours, na França. Mineiros enfrentaram 952 concorrentes de 15 países.
Queijeiros de Minas trouxeram a superouro, maior condecoração da disputa. A proeza coube aos produtos Vale da Gurita, Santuário do Mergulhão, Queijo do Ivair e Pardinho. O estado também ganhou medalhas de ouro, prata e bronze.
"Boa parte dos queijos premiados na França serão expostos no festival e alguns estarão à venda. Cada vez mais, o estado e suas sete regiões queijeiras (Araxá, Campo das Vertentes, Canastra, Cerrado, Serra do Salitre, Serro e Triângulo) conquistam reconhecimento não só no Brasil, como no exterior. Os prêmios são a prova de como o nosso produto é diferente e único", comemora Altino.
De acordo com ele, o queijo está em evidência no mundo e há a tendência de valorizar o produto artesanal. "Não só pelo sabor, mas pela qualidade e até por uma questão de saúde, pois ele não é industrializado."
Elmer de Almeida chama a atenção para a evolução do setor. Na primeira vez que o estado participou do concurso francês, ganhou apenas uma medalha. Na segunda, foram 12, e agora 51. "Nossos produtos a partir do leite cru têm nuances de sabor e aromas que agradam a quem realmente aprecia queijo, como franceses, italianos e portugueses. É uma diversidade enorme. Arrisco a dizer que o queijo mineiro é mais reconhecido lá fora do que aqui", observa.
A versatilidade é uma das principais características do queijo, um dos poucos alimentos que harmonizam com praticamente tudo – doce, salgado, amargo e ácido. No dois dias de festival, aliás, haverá oficinas de harmonização com cervejas e cafés artesanais.
"O sabor e o aroma do queijo têm a ver com a maturação. Quanto mais novos, mais ácidos – aí o doce casa muito bem. Os mais maduros, com textura firme e sabor muito intenso, são ótima pedida para acompanhar um vinho”, ensina Elmer de Almeida.
O festival vai abrir espaço também para outros produtos mineiros. Vinhos, cafés, azeites, cervejas artesanais, cachaças e mel poderão ser degustados e adquiridos pelo público.
FESTIVAL DO QUEIJO MINAS ARTESANAL
Sábado (27), das 10h às 22h, e domingo (28), das 10h às 20h. Serraria Souza Pinto. Avenida Assis Chateaubriand, 809, Centro. 1º lote/individual: R$ 15 (inteira) e R$ 7,50 (meia-entrada). Passaporte/dois dias: R$ 24 (inteira) e R$ 12 (meia). Entrada franca para menores de 12 anos. Oficinas: R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia), com vagas limitadas. Informações: www.festivalqma.com.br. Ingressos on-line no site Sympla
Queijo à moda do chef
Durante o festival, chefs apresentarão pratos com a iguaria. Cada um representará uma região produtora. Os pratos custarão de R$ 15 a R$ 30. Paulo Henrique Vanconcellos, do Bravo Catering, representante da Serra do Salitre, vai preparar três receitas. O tradicional cacio e pepe italiano (queijo e pimenta), com pasta de grano duro finalizado dentro do queijo; o burger angus, com queijo meia cura, cebola caramelizada na cachaça e goiabada; e o arroz de costela no fogo de chão com ora-pro-nóbis e queijo fresco.
“Vou mostrar a diversidade do queijo, utilizando o fresco, o meia cura e o bem curado. A região do Salitre, assim como as demais, é muito conceituada, oferece produtos com infinitas possibilidades. O queijo já era bastante utilizado na gastronomia, mas essa presença se intensificou com a qualificação e a profissionalização”, assegura.
O especialista Elmer de Almeida diz que o produto mineiro, por muito tempo, foi considerado subproduto. “Queijos finos sempre eram associados ao brie e ao camembert, mas nunca ao nosso cru. A partir da maior profissionalização, da criação da identidade geográfica e dos selos, ele passou a ser reconhecido. Isso se refletiu até no preço. Alguns exemplares chegam a ser bem caros, justamente pelo processo a que são submetidos, ao tempo de maturação", informa.
Outro fator que contribuiu para a valorização foi a presença do afinador, responsável por acompanhar todas as mudanças que influenciam o sabor, a textura e a complexidade da iguaria. "Esses profissionais pegam o queijo bruto e o transformam completamente, dando-lhe sabores e aromas que não seriam possíveis dentro de uma queijaria tradicional. Alguns têm criado verdadeiras pérolas”, conta o especialista.
O brasileiro consome 4kg de queijo por ano, em média. "Para você ter ideia, o francês consome 25kg e os argentinos, 9kg. O mineiro tem média superior à brasileiro (5kg), mas poderia ser melhor”, conclui Elmer de Almeida.
NA MESA
Chefs criaram pratos com queijos de sete regiões mineiras
BRUNA MARTINS
» Região: Triângulo
» Pratos: Costelão cozido com purê de mandioca e queijo. Bolinho de queijo queima-língua com ketchup de pimentão. Romeu e Julieta (palitos de goiabada fritos com calda de queijo).
CAETANO SOBRINHO
» Região: Cerrado
» Pratos: Sorrentino (ravióli de queijo com molho de tomates italianos e basílico). Sorvete de queijo com calda quente de doce de leite Rocca, farofa de castanhas brasileiras e paçoquinha. Pastel de queijo com chutney de cebola caramelizada.
EDSON PUIATI
» Região: Campo das Vertentes
» Pratos: Risoto das Vertentes (arroz cremoso com queijo decorado na telha). Queijo minas in carrozza (sanduíche de queijo empanado e frito, crocante por fora e cremoso por dentro, acompanhado de molho).
EDUARDO MAYA
» Região: Canastra
» Pratos: Pizzas (margherita e lombinho com bacon, pesto de baru, molho de tomates maduros, muçarela e queijo canastra. Há opção vegana). Pão com linguiça artesanal, molho branco de canastra, opções de pesto e goiabada.
FLÁVIO TROMBINO
» Região: Araxá
» Pratos: Rigatone pepper (massa com molho branco, queijo e condimentos). X-Araxá (pão de batata, blend de carnes dianteiras, cebola caramelizada no vinagre de jabuticaba e queijo).
GABRIEL TRILLO
» Região: Serro
» Pratos: Arroz de forno gratinado com queijo. Coxinha de rabada com queijo. Tilápia com farinha de pão de queijo.
PAULO HENRIQUE VASCONCELLOS
» Região: Serra do Salitre
» Pratos: Cacio e pepe (pasta de grano duro finalizado dentro do queijo). Burger angus com queijo meia cura, cebola caramelizada na cachaça e goiabada. Arroz de costela no fogo de chão com
ora-pro-nóbis e queijo fresco.