Questionada há cerca de quatro anos na Justiça, uma dívida bilionária da Vale S/A, de sua coligada Samarco Mineração e da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) relativa ao recolhimento a menor da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem) de minério de ferro em Minas Gerais, alcançou R$ 2,6 bilhões, conforme levantamento realizado em 2010 junto ao Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM) pela Associação dos Municípios Mineradores do estado (Amig). Diante das proporções a que o débito chegou, um grupo de prefeitos das cidades beneficiadas pelos royalties pediu ao ministro de Minas e Energia, Edison Lobão que interfira pessoalmente e negocie com as empresas, para dar um fim aos processos.
Prefeitos de 13 municípios mineradores de Minas, dois do Pará e um da Bahia, filiados à recém-criada Associação dos Municípios Mineradores do Brasil (Amib), conversaram com Edison Lobão e entregaram ao ministro um documento pedindo solução para a pendência. Parte da cobrança dos débitos, que veio à tona em 2007 já entrou na fase de execução, mas tem sido protelada por sucessivos recursos interpostos no Judiciário. Conforme o Estado de Minas noticiou com exclusividade, àquela época o débito era estimado em R$ 2,2 bilhões e estava ainda na esfera administrativa do DNPM.
Fortalecidos na briga pelo aumento das alíquotas da Cfem, que o ministro de Minas e Energia chegou a defender publicamente, os prefeitos dos municípios mineradores pressionam para solucionar o problema, tendo em vista a interpretação de que parte dos valores estaria caminhando para a prescrição, o que reduziria as cifras, objeto de diferentes processos ajuizados. Há cálculos referentes a recolhimentos que as mineradores teriam deixado de computar desde 2001. O prefeito de Congonhas e presidente da Amib, Anderson Costa Cabido, diz que boa parcela desses recursos pode ser objeto de entendimento, conforme posição discutida e consensual dos prefeitos das cidades mineradoras.
“Percebemos agora um cenário mais aberto à negociação, num momento de preços em alta do minério de ferro e um lucro monumental da Vale (a mineradora apurou lucro líquido de R$ 30,1 bilhões no ano passado)”, afirma Anderson Cabido. A proposta dos prefeitos separa a parcela dos processos em que ainda houver dúvida jurídica para que eles continuem a correr. Qualquer tentativa de acordo, no entanto, depende do DNPM, que responde pela cobrança. Procuradas pelo Estado de Minas, a Vale, a Samarco e a CSN informaram, por meio de suas assessorias de imprensa, que não se pronunciam sobre o assunto, por se tratar de matéria em discussão judicial. O Ministério de Minas e Energia também não se manifestou sobre o pedido e o documento entregue ao ministro Edison Lobão.
Precedente
A nova investida dos prefeitos para receber o dinheiro tem um precedente favorável que envolve negociação. Em 2008, 24 municípios receberam quase R$ 90 milhões, ao todo, em decorrência de acordo que contou com a intermediação da Amig para recebimento extrajudicial de parte da dívida cobrada da Vale. O dinheiro teve origem em valores relacionados ao transporte de minério dentro das reservas deduzidos de forma indevida da base de cálculo dos royalties pagos pela mineradora. O pagamento, em fevereiro e março de 2008, resultou em acréscimo de cerca de 15% da arrecadação da Cfem que cabia às cidades mineradoras de Minas.
No Pará, a demora na execução da dívida da Vale levou a Superintendência Regional do DNPM a abrir processo no fim de fevereiro, para cassação da licença da mineradora, medida que acabou sendo suspensa pelo ministro Lobão. De acordo com a Amib, só o município paraense de Parauapebas teria ao redor de R$ 800 milhões a receber. Do débito total calculado em Minas, a parte que cabe às cidades mineradoras é estimada em R$ 1,7 bilhão, com base na partilha legal dos royalties que determina 65% da arrecadação para os cofres dos municípios mineradores.
Entenda o caso
>> A dívida das mineradoras começou a ser arbitrada em ação fiscal empreendida pelo DNPM em Minas Gerais e no Pará no fim de 2005.
>> Os débitos se referem ao recolhimento a menor da Cfem do minério de ferro, à época pela Companhia Vale do Rio Doce, Minerações Brasileiras Reunidas (MBR), Samarco Mineração e Companhia Siderúrgica Nacional.
>> A antiga MBR foi incorporada pela Vale e a Samarco também faz parte do conglomerado da atual Vale S/A.
>> Os valores apurados pelo DNPM são relativos à diferenças na forma como o recolhimento da Cfem foi calculado pelas empresas, envolvendo divergências quanto a incidência da contribuição no transporte dentro das reservas, o local e o momento da cobrança do tributo.
>> As mineradoras já chegaram a questionar o DNPM com o argumento de que falta consistência técnica e jurídica aos dados.
>> Processos administrativos de cobrança foram abertos a partir de 2006, parte deles finalizados e com débito inscrito em dívida ativa e em fase de execução fiscal.