As divergências entre os 153 membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) nas negociações da Rodada de Doha sobre a liberalização das trocas comerciais ameaçam a conclusão de um acordo este ano, advertiu nesta quinta-feira o diretor da OMC, Pascal Lamy.
As "divergências" em torno da redução das tarifas alfandegárias sobre os produtos industriais, e em particular a lista de setores cujos mercados teriam de se abrir por completo em certos países emergentes, "bloqueiam o processo e fazem pesar sérias dúvidas sobre a conclusão da rodada este ano", explicou Lamy.
"Fazemos frente a uma brecha política manifesta que (...), segundo ouvi em minhas consultas, não será solucionada agora", declarou Lamy, reconhecendo que a situação "é grave" para a Rodada de Doha.
No fim de janeiro, as principais economias do planeta comprometeram-se de novo em Davos (Suíça) a fazer todo o possível para fechar até o fim de 2011 as negociações que abririam amplamente os mercados mundiais, e que continuam sem dar frutos dez anos depois de seu início no Qatar.
Para chegar a esse acordo, os negociadores se comprometeram a apresentar antes da Páscoa textos sobre os principais assuntos em discussão (agricultura, produtos industriais, serviços, etc), para avaliar se é factível alcançar um acordo este ano.
Esses documentos, publicados nesta quinta-feira, desenham "um panorama impressionante e ao mesmo tempo realista", explicou Lamy em declaração divulgada juntamente a esses textos.
Impressionante por sua "extensão", já que cobre pela primeira vez a quase totalidade dos pontos discutidos. E realista porque revelam "os problemas que continuam dividindo os negociadores", completou.
Segundo Lamy, 80% do acordo que prevê importantes reduções de subsídios agrícolas está concluído. No entanto, nos últimos meses continuaram as divergências sobre a segunda parte do acordo, os produtos industriais.
Concretamente, Washington, que acredita ter feito grandes concessões no tema agrícola, deseja que os países emergentes como China, Índia e Brasil abram mais seus mercados a certos setores industriais, entre eles o químico e o eletrônico. As potências emergentes rejeitam essa exigência e defendem a posição de países ainda não desenvolvidos.
Apesar dessas divergências fundamentalmente políticas, Lamy quis mostrar-se otimista, assegurando que em suas negociações com os principais membros da organização notou "um desejo de trabalhar para encontrar uma forma de sair do atoleiro".
Lamy aproveitou para convidar os países integrantes a pensar no custo de um fracasso da Rodada de Doha, que segundo ele daria às economias do planeta um novo impulso.
"Trabalhem para cimentar o apoio à abertura comercial. Utilizem as próximas semanas para conversar e construir pontes", declarou. Os 153 Estados-membros da OMC se reunirão em 29 de abril para fazer um novo balanço da situação, e tirar as conclusões dos textos apresentados nesta quinta-feira.