Brasília – O fantasma da inflação na América Latina tem preocupado os economistas e os sinais de alerta já se proliferam. Depois de o Fundo Monetário Internacional (FMI) chamar a atenção para o aumento dos preços na região na semana passada, agora foi a vez de o Banco HSBC, o segundo maior do mundo conforme o ranking da Forbes, fazer ponderações sobre o problema nos países latino-americanos, com destaque para o Brasil. O relatório da instituição britânica destacou que o país, e o Uruguai, são as duas nações onde os riscos inflacionários estão evidentes. “As perspectivas de deterioração da economia são grandes se não houver um controle maior para as metas de inflação”, alertou o estudo da instituição.
O pior cenário do HSBC para a disparada dos preços no subcontinente recai sobre Venezuela e Argentina, países com maiores projeções de inflação para este ano: 30,4% e 24,8%, respectivamente. Mas, quando considerado o tamanho das economias latinas, por seu porte, é o Brasil que mais preocupa. O índice de preço ao consumidor (IPC) projetado pelo banco inglês para o país já chega aos 6% em 2011, próximo ao teto de 6,5% admitido pelo governo para o ano. Comparadas à última medição feita na quarta-feira, que apurou, em abril, uma inflação anualizada de 6,44% na prévia mensal do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), as estimativas de fora parecem modestas, mas podem arranhar a imagem brasileira no exterior.
No caso do Uruguai, as projeções do HSBC apontam que a inflação deverá alcançar os 9,4% este ano, ficando bem acima dos 5% da meta do país. O cenário está mais tranquilo na Colômbia e no Peru, apesar de os índices estarem praticamente na meta. Já no Chile e no México, há um ambiente mais favorável. No Chile, em particular, o governo tem apresentado medidas mais firmes para manter a inflação dentro da meta. O IPC chileno, 2,7%, está próximo abaixo dos 3% da meta de inflação. Já o mexicano, de 3,6%, está acima da meta de 3%. De uma forma generalizada, o problema na América Latina ainda é reflexo da forte alta das commodities (produtos com cotação nacional), especialmente dos alimentos.
Contradição O maior dilema desses países é crescer pouco neste momento para tentar domar as pressões inflacionárias. No entanto, isso chega a ser contraditório com o discurso dos governos nos últimos anos, que tomaram medidas expansionistas para elevar o consumo interno como uma forma de minimizar os efeitos da crise financeira internacional. “Para países como o Brasil e o Uruguai, que estão em uma situação de forte aquecimento do mercado de trabalho, definitivamente, deveríamos ter alguns trimestres de crescimento abaixo do Produto Interno Bruto (PIB — soma de tudo o que é produzido no país) potencial”, afirmou ao Estado de Minas o economista André Loes, um dos organizadores do estudo do HSBC. Segundo ele, no caso do Brasil, isso significaria crescer entre 3,5% e 4% por mais ou menos um ano. “Isso permitiria reduzir um pouco o aumento muito forte dos salários que, nos níveis atuais, é claramente inflacionário”, completou.
Na avaliação de Loes, não é contraditório agora a necessidade de se puxar o freio de mão no crescimento econômico depois de dois anos de busca pela expansão a todo custo para sair da crise financeira de 2008 e 2009. “Em 2009 foram aplicados estímulos para evitar que tivéssemos uma recessão muito forte. A recuperação foi rápida, até mais do que se esperava. Com isso, o governo talvez tenha deixado os estímulos um pouco mais de tempo do que deveria”, avaliou. “Mas é difícil calibrar mesmo. Se agora o Brasil está crescendo acima do que pode, é preciso dar uma freada. Como regra geral, o país deve crescer perto do crescimento do PIB potencial, nem muito acima nem muito abaixo. E no médio prazo, deve-se privilegiar o investimento e a educação, pois assim esse crescimento do PIB potencial vai ficando mais alto”, disse.
Após a recessão global de 2009, as economias emergentes conseguiram se recuperar mais rapidamente do que as desenvolvidas. “Os latino-americanos se recuperaram mais rapidamente, mas agora atravessam o dilema de conter o crescimento e reduzir os gastos públicos”, comenta o economista Frederico Turolla, da consultoria Pezco. “Na hora de sair da crise, todo mundo quer gastar, mas agora o momento é para conter os gastos do governo e dos consumidores”, completa.