O Banco Central Europeu (BCE) intensificou suas advertências de que uma reestruturação da dívida soberana da Grécia poderia trazer consequências graves para o sistema bancário da Europa. O diretor do BCE, José Manuel González-Páramo, disse hoje que o impacto no sistema financeiro global poderia ser maior do que o do colapso do banco Lehman Brothers, em 2008.
Nos últimos dias, dirigentes do BCE têm confrontado as especulações persistentes nos mercados de que a Grécia terá, inevitavelmente, que renegociar o todo ou parte de sua dívida de 340 bilhões de euros. Essas especulações voltaram a se intensificar hoje, depois de o escritório de estatísticas da União Europeia (UE), o Eurostat, confirmar que o déficit orçamentário da Grécia em 2010 foi equivalente a 10,5% do Produto Interno Bruto (PIB). O valor supera a meta original do governo grego, de 9,4% do PIB, e leva à imposição de cortes de gastos ainda mais profundos.
A notícia levou os juros que a Grécia precisa pagar por seus bônus a novas máximas. Além disso, o custo para assegurar a dívida grega contra uma falência (default) também subiu para nível recorde.
Para o BCE, uma reestruturação de dívida por qualquer dos 17 países que integram a zona do euro teria consequências dramáticas para a economia e o sistema bancário do bloco. "Qualquer reestruturação implicaria numa violação de obrigações legais que, provavelmente, teria um efeito sistêmico mais negativo do que a catástrofe do Lehman Brothers", disse González-Páramo durante uma conferência acadêmica em Córdoba, na Espanha.
Segundo o dirigente do BCE, uma reestruturação de dívida por algum país da zona do euro prejudicaria o sistema bancário europeu como um todo. "O governo grego está implementando reformas. Não faz sentido travar essa discussão", acrescentou. O BCE, que vem mantendo os bancos gregos à tona com operações especiais de financiamento, teme que uma reestruturação da dívida do país leve ao colapso do sistema bancário da Grécia e provoque grandes perdas nos balanços patrimoniais de bancos de toda a Europa.
Outra preocupação é que uma reestruturação grega deixaria os investidores nervosos quanto à situação da Irlanda e de Portugal. Os custos da dívida desses países também têm subido, à medida que os investidores se protegem contra o risco de defaults.
Reformas fiscais
Em entrevista publicada no site da rede alemã de televisão ZDF, outro diretor do BCE, Jürgen Stark, advertiu que "num pior cenário, a reestruturação da dívida de um país membro da zona do euro deixaria a insolvência do Lehman Brothers na sombra". Para ele, países que optassem por reestruturar sua dívida seriam afastados dos mercados de capital e de fontes estrangeiras de financiamento por um período indeterminado.
Stark também disse que a única maneira para países altamente endividados lidarem com seus problemas financeiros é implementar reformas fiscais e pagar pela ajuda que tiverem recebido. "Não há caminho livre de dores", acrescentou. Na semana passada, o presidente do BCE, Jean-Claude Trichet, também havia dito que a Grécia precisa se concentrar em reduzir seus déficits.
Até agora, os investidores parecem não estar convencidos de que os programas combinados de redução da dívida e do déficit da Grécia serão suficientes para evitar uma reestruturação. No começo deste mês, o governo grego anunciou novas medidas de austeridade, no valor de 26 bilhões de euros, e reafirmou seu compromisso de levantar 50 bilhões de euros com privatizações ao longo dos próximos cinco anos.
O primeiro teste do progresso na implementação desses planos fiscais virá em meados de maio, quando o governo levará essas propostas à votação pelo Parlamento do país. Os sindicatos já convocaram uma greve geral para 11 de maio e o descontentamento está crescendo dentro do Partido Socialista (governista).
Também em maio, delegações da União Europeia, do BCE e do Fundo Monetário Internacional (FMI) chegarão a Atenas para julgar a elegibilidade da Grécia para receber a próxima tranche do programa de ajuda financeira de 110 bilhões de euros. Como parte dessa revisão, a chamada "troika" vai fazer sua primeira avaliação sobre se a dívida pública da Grécia é sustentável ou se o país está tecnicamente insolvente.