A taxa básica de juros (Selic) ainda não bateu no teto, mesmo depois do ajuste na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que a colocou em 12% ao ano, a segunda mais alta do mundo, atrás apenas dos 18,24% da Venezuela. A ata desse encontro, considerada pelo mercado como a comunicação mais “hawkish” da gestão Alexandre Tombini à frente do Banco Central — termo importado da política externa norte-americana para dizer que uma autoridade é dura como um falcão —, mostra que o BC aumentou a dose do remédio contra a inflação. Agora, os analistas já calculam que o arrocho pode durar até o fim de 2011, com os juros atingindo 13% ao ano.
“É uma ata bastante dura, a mais hawkish da nova diretoria. Há uma clara sinalização de que houve uma reavaliação da estratégia de política”, avaliou Jankiel Santos, economista-chefe do Espírito Santo Investment Bank, que vai revisar suas projeções sobre a Selic para cima. “O sinal emitido é o de ‘vamos fazer o suficiente para trazer a inflação do ano que vem (para o centro da meta)’. Estava havendo uma perda de credibilidade do BC nesse sentido e, aparentemente, ele agora recupera isso.” Para Vladimir Caramaschi, economista-chefe do Crédit Agricole Brasil, os investidores também vão rever seus cálculos. “O mercado deve caminhar para duas altas de 0,25 ponto percentual ou mais, e não duas altas de 0,25 ou menos, como vinha ocorrendo até então”, disse.
A ata dá menos destaque para as medidas macroprudenciais para reduzir o consumo e a inflação, o que foi lido pelos especialistas como um sinal de que talvez tenham chegado ao limite e, a partir de agora, a política monetária atue apenas com a ferramenta tradicional: a elevação dos juros. “Nessa ata, o foco mudou. O BC dá mais ênfase ao aperto nos juros. As medidas não tiveram tanto peso”, avaliou Tatiana Pinheiro, economista do Banco Santander. Durante o Fórum Econômico Mundial da América Latina, o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Luis Moreno, elogiou o BC no combate à carestia.
Dúvidas
Se para o BC o cenário é de incerteza, para o mercado é de dúvidas em relação à eficiência da estratégia traçada pela autoridade monetária. Mesmo o objetivo de levar a inflação para o centro da meta em 2012 (4,5%), segundo especialistas, está comprometido. “O BC continua a trabalhar com hipóteses otimistas demais”, ponderou Tatiana Pinheiro. Para as gestoras de recursos, instituições que mais têm acertado as projeções para a inflação, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do ano que vem vai ficar em 5,19%, número que tende a piorar.
Na avaliação do Santander, a inflação de maio, junho e julho deve vir em nível bem abaixo do 0,80% da média registrada no primeiro quadrimestre do ano. Não por motivos estruturais, como a desaceleração do consumo, mas por fatores temporários, como a ausência de reajustes de preços administrados. Uma dinâmica que, para a instituição, não tem qualquer influência da estratégia do BC. “Uma das hipóteses otimistas do BC, de uma desaceleração mais forte no preço das commodities, também é pouco provável”, avaliou. “Apenas no primeiro trimestre, foram 9% de alta e não há nada no radar que indique uma desinflação forte o suficiente para rebater esse incremento e o do ano passado.”
INTERVENÇÃO NO BANCO MORADA
O Banco Central decretou, ontem, intervenção no Banco Morada S.A., instituição privada de pequeno porte com apenas uma agência, na cidade do Rio de Janeiro. O BC alegou comprometimento patrimonial do banco, descumprimento de normas do Conselho Monetário Nacional (CMN) e ainda o fato de seus controladores não terem apresentado um plano de recuperação viável para a instituição. O BC informou que cerca de 32% do total dos depósitos à vista e a prazo do Morada contam com cobertura do Fundo Garantidor de Crédito (FGC). Os pagamentos para os depositantes já começarão a ser feitos na segunda-feira. Todas as informações necessárias estarão à disposição do público interessado no site do FGC. (Vânia Cristino)