O cenário confuso da economia mundial está derrubando velhos tabus e tornando previsões de analistas mais incertas do que costumam ser. Os ricos Estados Unidos, União Europeia e Japão atravessam dificuldades históricas para sair da estagnação, agravada pelas turbulências de 2008 e 2009 e pelo rescaldo de pesados déficits fiscais. Ao mesmo tempo, grandes emergentes, como China, Brasil e Índia, usufruem como nunca benesses da ascensão material enquanto sofrem as dores desse mesmo crescimento, representadas por inflação em alta e infraestrutura saturada.
O avanço dos emergentes, por sinal, levou o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, a um ato traduzido pelos especialistas como “puro recalque”. Preocupado em minimizar o declínio político dos sete países mais ricos e enquadrar as pretensões das economias em desenvolvimento, Obama reconheceu o crescimento de China, Brasil e Índia, mas ressaltou que os EUA e a Europa continuam tendo peso decisivo. “Dizem que essas nações representam o futuro e que o tempo de nossa liderança já passou. Esse raciocínio está errado. O tempo para a nossa liderança é agora”, disse.
Independentemente da posição norte-americana, nesse mundo chamado por Paul Krugman, Nobel de Economia, de “louco e misturado” todos os países vivem crescente apreensão quanto aos próximos capítulos da surpreendente rearrumação internacional. As tensões atuais desafiam estudiosos, empresários e governantes, que tentam antever desfechos de graves temas colocados na mesa, como o estouro do teto da dívida norte-americana (US$ 14,3 trilhões), a forte oscilação dos preços das commodities (produtos básicos cotados internacionalmente) e o duro ajuste fiscal a ser feito pela Zona do Euro.
A soma de todos esses medos é a desordem cambial, cujos sintomas já são percebidos na valorização de moedas de emergentes, sobretudo o real, complicando políticas domésticas de juros. Com as economias cada vez mais interdependentes, o pior prognóstico é de que distorções resultantes de crises passadas levem a outras ainda mais devastadoras. “Conforme o desdobramento do colapso financeiro da Grécia, assistiremos à quebradeira geral de bancos, com riscos maiores que os da década passada”, alerta o economista José Luiz Oreiro, da Universidade de Brasília (UnB).
Na sua opinião, as consequências de um eurodesastre sobre a frágil retomada dos EUA podem ser ainda piores para os emergentes. “O Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) deve exagerar o recurso excepcional de que dispõe, de imprimir dólares, fortalecendo mais outras moedas. Com isso, o Brasil e outros pagariam a conta do ajuste dos países ricos”, ressalta Oreiro. Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), a dívida bruta do governo dos EUA saltou de 62% do PIB em 2007 para 99,5% em 2011, devendo chegar a 112% em 2016. No Japão, a relação já é de 210%.
Com déficit público de 10,5% do Produto Interno Bruto (PIB, a soma de todas suas riquezas) em 2010, só restou à Grécia, segundo Oreiro, duas saídas: dar calote sobre o principal de sua dívida pública próxima de 150% do PIB ou abandonar o euro, ressuscitando com maxidesvalorização a divisa local, o dracma. Apesar do socorro bilionário dado pelo Banco Central Europeu (BCE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI), Irlanda e Portugal poderão viver o mesmo dilema, seguidos depois por Espanha e Itália.