Brasília – A falta de regulamentação do aviso prévio pelo Poder Legislativo levou novamente o Supremo Tribunal Federal (STF) a exercer função que caberia ao Congresso. Por unanimidade, os ministros fixaram, em sessão plenária nessa quarta-feira, que a Corte irá definir a fórmula de cálculo do benefícioque deve ser pago ao trabalhador em caso de demissão sem justa causa. O modelo a ser desenhado valerá até que os parlamentares aprovem leis para a matéria.
De acordo com o artigo 7º da Constituição Federal, todo trabalhador tem direito ao aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de 30 dias. No entanto, por ausência de lei, atualmente os empregadores pagam apenas esse mínimo de 30 dias, independentemente do período em que o funcionário trabalhou na empresa.
Em plenário, os ministros do STF acataram o pedido de quatro trabalhadores demitidos pela mineradora Vale, no qual pleiteavam o direito ao aviso prévio proporcional. Um deles, José Geraldo da Silva, trabalhou quase 30 anos na companhia.
O julgamento, no entanto, foi encerrado sem que os ministros tenham definido a fórmula de cálculo. Pelo menos quatro propostas chegaram a ser sugeridas, mas, em função do impasse em estabelecer o mecanismo, o relator do processo, ministro Gilmar Mendes, sugeriu a suspensão da sessão para que os magistrados tenham tempo para analisar qual é a melhor opção. A avaliação deve ser retomada somente em agosto, já que o semestre do Judiciário será encerrado na semana que vem, com o início das férias.
O mandado de injunção, usado pelos ex-funcionários da mineradora para recorrer ao STF, é um instrumento voltado para proteger o cidadão da omissão legislativa em matérias previstas pela Constituição. Ao julgar um pedido feito por sindicatos sobre o direito de greve, em 2007, o STF tomou o lugar do Congresso e estabeleceu a aplicação das regras do direito de greve na iniciativa privada para os órgãos públicos até que o Legislativo elabore lei sobre o tema.
No julgamento dessa quarta-feira, o ministro Carlos Ayres Britto ponderou que o Supremo não pode legislar. Ele defende que os parâmetros a serem fixados pelo STF valham apenas para as partes do processo em questão, e não normativamente para todo e qualquer caso. "Podemos falar da inércia do legislador, mas apenas para o caso concreto. O que o mandado de injunção nos autoriza é decidir o caso concreto na ausência de lei", afirmou Britto.
Propostas
O debate acerca do assunto resultou em uma série de propostas, sendo que a mais benéfica para os trabalhadores seria a do ministro Marco Aurélio Mello, que prega a proporcionalidade de 10 dias por ano, o que resultaria em 300 dias de aviso prévio caso o trabalhador demitido tenha 30 anos de serviço na empresa.
O ministro Ricardo Lewandowski, por sua vez, citou duas propostas. Uma do senador Paulo Paim (PT-RS) – que tramita no Senado – e outra nos mesmos termos de um projeto de lei do ex-senador Papaléo Paes (PSDB-AP). O texto prevê o pagamento de 30 dias corridos para aqueles contratados há menos de um ano; de 45 dias para os funcionários que trabalharam de um a 10 anos; e de 60 dias para os que foram demitidos depois de 10 anos de serviço.
Embora qualquer cálculo estabelecido pelo STF venha a proteger o trabalhador, os ministros Marco Aurélio e Ayres Britto citam que esse é um caminho de "mão dupla", uma vez que, segundo ambos, o cumprimento do aviso prévio pode pesar contra o trabalhador que eventualmente peça demissão e queira se desligar da empresa.