Às 15h de 23 de julho de 2010, o empresário Thales Maioline seguia de táxi de um hotel para o Terminal Rodoviário do Tietê, em São Paulo, enquanto dezenas de investidores aguardavam-no para uma reunião de negócios no escritório da empresa Firv Consultoria e Administração de Recursos Financeiros, no Bairro Buritis, em Belo Horizonte. Um ano depois do suposto golpe (classificado como falência pelos defensores de Maioline), sem saber o paradeiro dos cerca de R$ 100 milhões que teriam sido subtraídos dos investidores, advogados tramam silenciosamente estratégias para reaver parte do montante do patrimônio de seus clientes. Numa corrida para saber quem consegue primeiro obter na Justiça um dos poucos bens, por enquanto, descobertos em nome de Thales, da empresa ou de seus dois sócios – Yanni Márcia Maioline e Oséas Marques Ventura –, vale tudo para obter vantagens e apenas os primeiros terão seu dinheiro de volta. O Madoff mineiro, como Maioline ficou conhecido com a repercussão do caso, numa analogia ao norte-americano Bernard Madoff, acusado de ter aplicado também o golpe da pirâmide financeira, continua preso.
Representante de mais de 20 investidores da Firv, com cotas que variam de R$ 5 mil a, em alguns casos, cifras que superam R$ 1 milhão, o advogado Rodolfo Rezende esconde a estratégia usada por ele e outros representantes do escritório para não atrair a atenção de outros defensores. “É uma disputa para ver quem consegue chegar primeiro aos bens. Todo mundo quer chegar ao poço d’água. Por isso, é preciso resguardar os procedimentos, para que no fim meus clientes possam beber da água”, afirma, explicando que o motivo da disputa silenciosa é a insuficiência de bens para cobrir o calote milionário.
Uma forma de atenuar a corrida judicial seria realizar perícia nas contas do Madoff mineiro para apontar o destino do dinheiro das contas bancárias de Thales Maioline. Caso ele tenha feito transferências para contas no exterior, por exemplo, como indicado nos primeiros meses de investigação, acentua-se a acusação de estelionato. Além disso, cria-se a possibilidade de se usar esses montantes para pagamento das dívidas com funcionários e investidores. “O procedimento tem que ser feito por alguém especializado. Aí pode aparecer o patrimônio e mostrar qual tipo de operação ele fazia e quais contas ele usava”, afirma Rezende.
Investigação paralela
Apesar de os processos cíveis serem públicos e estarem disponíveis para acesso, o advogado Olavo Mourão se encontra em situação semelhante à de Rezende. Defensor de outros 20 investidores (inclusive um brasileiro que reside nos Estados Unidos) em ações contra a Firv e Thales Maioline e seus sócios, ele faz uma investigação paralela para identificar todo o patrimônio em nome dos suspeitos e possibilitar a recuperação do valor perdido por seus clientes. Uma das estratégias usadas para a investigação foi entrar em contato com pessoas próximas a eles, em Araçuaí (cidade natal do Madoff mineiro) e outros municípios do interior. Mas apesar de afirmar ter identificado alguns supostos bens dos proprietários da Firv registrados em nome de ‘laranjas’, ele prefere preservar as fontes. “Se falar quais bens, eu ando para trás com meus clientes”, adverte Mourão, sabedor que, inclusive, mesmo depois de anos de processo, os investidores podem ficar sem um centavo. “É um risco geral”, admite o advogado.
Uma das ações previstas por ele é atacar os bens em nome dos sócios e não somente aqueles registrados pela Firv Consultoria e Administração de Recursos Financeiros. No entanto, não bastasse a insuficiência patrimonial na ordem preferencial, os créditos trabalhistas são pagos primeiro. Por isso, além da concorrência entre escritórios, os investidores só receberão depois do pagamento das dívidas com ex-funcionários. “Caso os recursos identificados sejam suficientes só para pagar os direitos trabalhistas, são eles que recebem primeiro”, afirma a promotora Juliana Pedrosa. Ela indica que a elucidação do destino do dinheiro não é preponderante para o processo criminal e a investigação de evasão de divisas deve ser feita paralelamente. “O dinheiro foi parar em algum lugar. Ele não gastou todo esse dinheiro nesse tempo”, reitera a promotora.
O advogado de Maioline, Marco Antônio Andrade, questiona a destinação do dinheiro. Segundo ele, quando forem feitas perícias nas contas bancárias será confirmado que não tratou-se de um golpe e, sim, da falência da empresa, tendo em vista que seu cliente não se beneficiou do prejuízo alheio. Ele afirma que, atualmente, Thales tem patrimônio inferior a R$ 3 milhões e os bens estão bloqueados.
Daqui para o futuro
As últimas testemunhas arroladas pelo Ministério Público e pela defesa devem ser ouvidas até agosto, por meio de carta precatória. Depois disso, deve ser marcada data para o interrogatório de Thales Maioline. Antes de ser definida a sentença, é dado prazo para que ambas as partes façam suas alegações finais, apresentando os argumentos para que o réu seja ou não condenado. Como o processo foi desmembrado, os mesmos procedimentos adotados no caso de Thales devem ser adotados em relação a Yanni Márcia Maioline e Oséas Marques Ventura, os outros dois sócios da Firv.
Entenda o casp
O investidor Thales Maioline operava um clube de investimentos e prometia lucro mensal mínimo de 5% a 12% de bonificação a cada seis meses. Em 23 de julho, ele desapareceu sem deixar pistas para os investidores, dando um calote de R$ 100 milhões em cerca de 2 mil pessoas. Foragido da Justiça e escondido na selva amazônica, ele decidiu voltar ao país em dezembro e entregar-se à Polícia Civil, depois de peregrinar por países sulamericanos para escapar da fúria dos investidores.