De topete para o alto e camiseta regata justinha, o supervisor de telemarketing Daliton Ribeiro de Araújo, de 24 anos, ainda não tinha parado para fazer as contas. Se assustou com o resultado: mensalmente gasta mais de R$ 400 com beleza, saúde e bem-estar. A cifra soma gastos com mensalidade de academia (musculação cinco vezes por semana), suplementos alimentares (proteína, creatina e massa magra), e os cuidados com o cabelo. A pomada de R$ 60 e a escova progressiva de R$ 100 consomem tempo e dinheiro do rapaz, que gasta sem ver, sem dor e com pose: “É investimento que vale para a gente se sentir bem”. O crescimento da classe C, que já soma 52% da população brasileira, é um dos principais motores para a expansão dos segmentos de saúde, beleza e bem-estar: a classe média, e isso inclui os homens, quer mais é ficar bonita.
Um dos mercados que cresce impulsionado pelo avanço do poder de consumo da população, a venda direta (no porta a porta com catálogos de produtos de beleza, por exemplo) tem batido recordes. O mercado no Brasil é um dos maiores do mundo, ficando atrás apenas do Japão e dos Estados Unidos. No primeiro trimestre, o volume nominal das vendas foi de R$ 5,8 bilhões, segundo a Associação Brasileira de Empresas de Venda Direta (ABEVD), resultado 8,9% maior do que o registrado em igual período de 2010. O diretor regional da Natura, Luís Bueno, diz que a ascensão da classe C cria oportunidades para o país e para a indústria nacional com o crescimento do consumo. Segundo ele, no segundo trimestre a marca atingiu 1,3 milhão de consultores, que trabalham em todo o país. O crescimento reflete a aceleração do mercado consumidor brasileiro como um todo.
BOA FORMA
As academias de ginástica representam outro mercado que toma impulso no aquecido consumo da nova classe média, a única que não para de crescer no Brasil. O presidente do Encontro Nacional de Atividades Físicas (Enaf), Sebastião Paulino, confirma: “O número de academias no país registra crescimento anual de 20 a 25% e as expectativas são altas, uma vez que as pessoas decidem investir em saúde, beleza e bem-estar como uma das prioridades, assim que sobra um pouco de dinheiro no orçamento familiar”. O mercado informal, marcado por academias que abrem as portas sem registro, já chama a atenção dos conselhos regionais, mas não é, ainda, preocupante, segundo Paulino, que coordena a 25ª edição do Enaf, que termina hoje no Chevrolet Hall, em Belo Horizonte.
O investimento na saúde e beleza do corpo entrou definitivamente no orçamento da agente de vendas Isabel Cristina Silva, de 31 anos. “Depois que a gente se casa, tem que cuidar mesmo, senão desanda. Gasto com beleza e saúde sem nem fazer conta”, destaca, entre uma e outra série pesada de flexões abdominais na bola de ioga. Ela enfrenta via sacra diária para manter a forma: mora no Bairro Pirajá, trabalha no Santo Agostinho, Região Centro-Sul de BH, e malha no Centro. Faz o percurso de ônibus. “Vale pelo custo/benefício”, justifica, revelando que gasta R$ 49 com mensalidade da academia, mais R$ 200 de suplementação alimentar. No cabelo, as luzes saem mais caro que a tintura convencional, como ela calcula: “O vidro de tinta custa R$ 12, as luzes R$ 150. Mas vale cada centavo”.
Na planilha de planejamento mensal da estagiária Gabriela Santos Pires, de 24 anos, o item academia não corre o risco de cair tão cedo: “Depois que a gente se habitua e começa a sentir os resultados, vicia mesmo. Acho difícil isso deixar de ser prioridade na minha vida, daqui para frente”. O comerciante Armenaque Sarkis, de 38 anos, faz coro. “O dia a dia já é muito estressante. Faz parte do ciclo: a gente trabalha muito também para poder gastar o dinheiro em bem-estar. Se não tiver como tirar uma horinha por dia para malhar, já era”, diz ele, que ainda desembolsa R$ 60 mensais em xampu especial antiqueda: “Meu pai é careca, sabe como é”.
Palavra de especialista
Cansou do jump, vai pro spinning
“A emergência da classe C impulsiona o mercado de academias do Brasil, em especial as unidades dos bairros, que experimentaram no último ano aumento substancial no número de alunos. É cliente mais fiel, público menos rotativo. A tendência desses empreendimentos é a diversificação na oferta de atividades, justamente para manter o cliente. Como é trabalho que exige disciplina e determinação, esse portfólio variado é carta na manga para quando faltar motivação do aluno.”
Descontões para fisgar clientes
Os departamentos de marketing das academias de ginástica desovam na praça promoções com focos específicos na classe C. Uma das unidades da academia Malhação, na Avenida Amazonas, Hipercentro da capital mineira, tem mais de 1,5 mil clientes – a grande maioria pessoas que trabalham por perto e aproveitam o horário do almoço ou o fim da tarde para suar a camisa no salão de musculação ou nas aulas coletivas. Descontões chegam a reduzir a mensalidade a R$ 49, com direito a usar a academia à vontade. “A aula de axé, por exemplo, é exclusividade dessa unidade, com foco nessa turma da classe C”, assegura Júlia Gauzzi, gerente de marketing do grupo que tem ainda outras oito unidades. Na Zona Sul, o axé vira aerodance, “menos popular”, define Gauzzi.
O Brasil é o país que mais consome desodorantes e produtos infantis de perfumaria. Surfando na onda favorável, a empreendedora Heloísa da Silva estabeleceu seu negócio na Região de Venda Nova, em Belo Horizonte, onde comercializa produtos de beleza, cosméticos e higiene pessoal. Há 20 anos no setor, Heloísa viu sua clientela crescer. Ela diz que consegue facilitar a compra para suas clientes com pagamentos parcelados e com isso abrange todas as classes sociais, principalmente a classe média e as faixas de mais alta renda. “Hoje todo mundo trabalha maquiado, até para fazer faxina.”
A empreendedora usa seus conhecimentos também para orientar as clientes: “Procuro mostrar a importância dos produtos, por exemplo o filtro solar.” Outro ponto que favorece as vendas, segundo Heloísa, são os lançamentos constantes. “Sempre temos novidades para oferecer aos clientes.”
Nivaldo Lima, da AICMG, diz que o Brasil apresenta gastos com cosméticos bem elevados por habitante. Segundo ele, em 2013 a população vai gastar em média US$ 178 ao ano, crescimento de 22% em relação a 2010, quando os gastos por habitante somavam em média US$ 146 ao ano. (FB e MC)