Depois de acusar o Banco Central (BC) de ser inativo, na semana passada, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) mira agora sua artilharia para outra área do governo: a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). De acordo com o órgão antitruste, a Anatel é lenta para fazer suas análises sobre novas operações na área e isso tem prejudicado o trabalho da autarquia. A crítica do Cade é de que, enquanto outros órgãos gastaram pouco mais de três meses, em média, para fazer suas análises prévias em 2010, a Anatel precisou utilizar-se de três anos e um mês. A demora é 12 vezes maior, ou seja, uma diferença de 37 meses.
A mira na Anatel, que apresenta ao conselho pareceres prévios a respeito do impacto de novos negócios para o mercado e a concorrência no setor de telecomunicações, não chega a ser uma novidade. A Agência já foi alvo de muitas reclamações de conselheiros. A diferença agora é que o discurso se transformou em números.
Conforme pesquisa do Cade obtida pela Agência Estado, a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda e a Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça gastaram 92 dias, em média, para instruírem processos e encaminharem ao Cade no ano passado. A Anatel levou 1.159 dias no mesmo período. "Estamos cansados. Já
Além da demora, a avaliação do conselho é de que a análise prévia da Anatel tem sido pouco proveitosa e isso tem se refletido negativamente no trabalho da autarquia. Mais uma vez, o órgão antitruste se apoiou em números para embasar sua acusação. Enquanto o Cade demorou 40 dias, em média, para julgar os casos provenientes da SDE e da Seae em 2010, precisou dispensar 110 dias para avaliar os processos que chegaram da Agência.
"A quantidade é quase três vezes mais", comparou Furlan. "Isso porque o processo chega até dez anos após o fato e temos de buscar novas informações para ver se a realidade mudou ou porque a quantidade de diligências que precisamos fazer é maior, pois as investigações estavam incompletas."
A Anatel rebateu as acusações por meio de nota, enfatizando que, em seus 14 anos de existência, a Agência adquiriu ampla expertise e que o setor de telecomunicações possui especificidades que o diferenciam dos demais casos que passam pelo Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC). "É apropriado, portanto, preservar essas competências no âmbito de um organismo com conhecimentos mais específicos sobre o setor, especialmente no momento em que a convergência tecnológica impulsiona intenso movimento de fusões e aquisições empresariais", alegou a Anatel.
No comunicado, a agência evitou entrar em conflito com os demais integrantes do SBDC, salientando que eles possuem "notória capacidade e versatilidade". Enfatizou, porém, que a Anatel possui conhecimentos profundos em relação ao setor que a tornam importante para a melhor instrução dos processos. "A necessidade de analisar adequadamente as peculiaridades do setor é a razão pela qual parte das competências no campo concorrencial tenha sido atribuída à Anatel pela legislação."
Por fim, a Agência destacou que há, atualmente, 13 processos na casa - 12 são atos de concentração e um refere-se a infrações à ordem econômica - e que dois deles estão suspensos por decisões judiciais, o que também ocorreu em casos anteriores, acabando por retardar a tramitação na Anatel. Desde 1998, conforme a agência, foram encaminhados ao Cade 165 atos de concentração e 29 processos ligados à infração à ordem econômica. "Nenhum deles foi rejeitado ou contestado pelo Cade - comprovação do bom trabalho da Agência."
Furlan destacou, no entanto, que, em muitos casos, a autarquia opta por aprovar determinada operação porque as condições de mercado já foram modificadas e os efeitos de uma restrição após tanto tempo seriam inócuos. Na semana passada, relatores de dois processos de telecomunicação que passaram pelo conselho votaram pela suas respectivas aprovações, alegando que muitas mudanças já haviam acontecido no mercado desde o fato que gerou o caso até aquele dia. "É pior a emenda que o soneto agora...", considerou o conselheiro Carlos Ragazzo. O colega Olavo Chinaglia salientou que a tentativa de se fazer um controle preventivo posteriormente é uma "aberração".
O assunto foi longamente debatido depois que o conselheiro Ricardo Ruiz mostrou insatisfação com o voto dos colegas que recomendaram aprovações por causa dessa defasagem. "Me incomoda supor tudo isso... Essa análise ex post não faz sentido. É ilógico isso", argumentou Ruiz. O tema serviu, mais uma vez, para os conselheiros pressionarem pela votação, no Congresso, do projeto de lei que dá mais poderes ao órgão antitruste, o Supercade. Entre outros pontos, está prevista a análise prévia das operações pela autarquia antes de serem consolidadas.