No interior da grande estrutura de concreto tombada pelo patrimônio histórico, cercado por valas abertas na terra, o Mineirão mostra para quem passa por lá que logo estará pronto para sediar grandes partidas de futebol. O que essas pessoas não conseguem ver é que o gigante canteiro de obras se tornou um microuniverso de experiências. O aprendizado da primeira profissão, o primeiro emprego, a primeira promoção e até o encontro de um amor são histórias que ocorrem sob o som das britadeiras e do vai e vem dos 1,1 mil funcionários.
A carência de profissionais no setor da construção abriu oportunidade para Sidney Gonçalves, de 19 anos. Apaixonado por Futebol, saiu confiante de Itaobim (Vale do Jequitinhonha) para, em Belo Horizonte, bater na porta da empresa Minas Arena, formada pelas construtoras Construcap, Egesa e Hap Engenharia, responsável pela construção do complexo esportivo. “Eu senti que ia ter uma vaga para mim. Meu sonho era trabalhar nas obras do Mineirão para fazer parte da história da Copa do Mundo no Brasil”, afirma. Ele conseguiu e a carteira de trabalho foi assinada pela primeira vez.
Hoje, 28% dos empregados da Minas Arena têm entre 18 e 25 anos, destaca o diretor-presidente, Ricardo Barra. Para ele, apostar na formação de jovens é uma das maneiras de trabalhar no aquecido mercado da construção civil. “Tenho certeza de que os conhecimentos adquiridos aqui ficarão para toda a carreira”, disse. Ainda segundo ele, 5% dos empregados já foram promovidos dentro do estádio desde o início das obras, em julho de 2010. É o caso de Elias Barbosa, de 21 anos, nascido em Corinto (Região Central), que de servente passou a guincheiro em menos de três meses. “É resultado de experiência e esforço”, disse.
Subindo as escadas do corredor de acesso às arquibancadas, que receberão 64.500 assentos, a vista que surpreende não é mais do campo e da torcida. O que se vê dali do alto são máquinas, ferragens, poeira e, claro, uma massa de trabalhadores. É gente do país inteiro, atleticanos, cruzeirenses, são-paulinos, flamenguistas, vascaínos, santistas. Raimundo Santos, 22 anos, veio do Mato Grosso com um irmão e um cunhado. “É importante para ajudar nas contas de casa”, disse o recém-integrante da Máfia Azul, que um dia sonhou em ser jogador de futebol.
No corredor de acesso às arquibancadas, onde os bares deram lugar a almoxarifados, o baiano Manoel Mattos, de 19 anos, comemora o aprendizado de carpintaria. “Hoje sou servente, mas quero ser um bom carpinteiro. A oportunidade é boa”, afirmou. “É uma satisfação poder transmitir a minha experiência aos aprendizes”, completou o encarregado Geraldo Francisco da Rocha, de 56 anos, que lidera uma equipe de 12 pessoas.
Investimentos
A Minas Arena prevê chegar a 2 mil postos de trabalho no pico da obra, em maio de 2012, somando-se às atuais 346,7 mil vagas sustentadas pela construção civil mineira e aos 2,5 milhões de postos no país. Orçado em R$ 665,7 milhões, o Mineirão é uma grande obra, mas não a única. O secretário de Estado Extraordinário da Copa (Secopa), Sérgio Barroso, destaca que os investimentos em Minas Gerais podem atingir R$ 10 bilhões em virtude dos projetos de transportes, hotelaria e outros. “A capacitação de mão de obra é um legado em todos os setores. Para se qualificar, a pessoa deve procurar as unidades do Sesi, Senac e Sebrae mais próximas de casa”, exemplifica.
Conforme Antonio Carlos Gomes, da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), 89% das empresas da construção civil afirmam que a falta de trabalhador qualificado “é um problema”. A demanda maior que a oferta faz o custo aumentar para as empresas, pois o salário pode triplicar o valor do piso dos serventes (R$ 605), vigias (R$ 627), meios-oficiais, como ajudantes e iniciantes (R$ 699,60), e oficiais, a exemplo de pedreiros, bombeiros e eletricistas (R$ 926,20). Os dados são do Sindicato da Indústria da Construção Civil de Minas Gerais (Sinduscon-MG).
Levantamento do Ministério do Esporte estima que 700 mil empregos, entre permanentes e temporários, serão gerados por todos os setores em razão da Copa. Até o fim de 2013, serão capacitados 306 mil profissionais na cadeia do turismo. Segundo Daniel de Souza Galvão, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), entre 2011 e 2012 o governo abrirá 25 mil vagas de qualificação no setor da construção civil.
Personagens da notícia
No canteiro de obras, escondida atrás de capacete e óculos de segurança, a mineira Viviane Aline da Silva, de 26 anos, poderia não ter chamado a atenção do colega de trabalho baiano Otoniel da Silva Pinheiro, de 35 anos. Mas, ao pedir o favor de carregar um galão de 20 litros de água, o coração acelerou. “Foi paixão à primeira vista”, diz a responsável pelo rastreamento do cimento usado nas obras do estádio. O encontro avassalador, em abril, promete um amor de trecho. “Noivamos no Mineirinho, queremos casar na inauguração do Mineirão e seguir trabalhando em obras país afora. Serei feliz com Bibi (apelido carinhoso), como sou hoje, em cada um desses trechos”, afirma o auxiliar administrativo.