Depois do tsunami que atingiu o mercado financeiro no início de agosto – que derrubou o Ibovespa (principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo) para patamares abaixo de 50 mil pontos –, é hora de os investidores revisarem mais uma vez as opções de investimento. Nesta nova rodada, é a queda da taxa básica de juros (Selic) para 12% que motiva a reavaliação. Para o mercado, a redução da Selic em 0,5 ponto percentual (p.p.) na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em 31 de agosto, foi apenas o início. Segundo o Relatório Focus divulgado nessa segunda-feira, economistas das principais instituições financeiras ouvidos pelo Banco Central (BC) estimam que a Selic feche 2011 em 11%, ante previsão de 12,38% há uma semana.
A perspectiva também é compartilhada pelo analista-chefe da XP Investimentos, Rossano Oltramari, que acredita em corte de 0,5 ponto percentual a cada nova reunião do grupo colegiado até o final do ano. “Diante deste cenário, a atratividade dos investimentos de renda fixa começa a ser menor”, avalia. Aplicações com rentabilidade atrelada à Selic, como fundos DI e CDBs acabam perdendo espaço, abrindo possibilidade para opções pré-fixadas e até mesmo para a bolsa de valores.
“Se for um cenário permanente, a tendência é de que comecem a ser priorizados ativos de risco maio, como a própria Bovespa, havendo uma migração natural. Todo cenário de corte de juros privilegia ativos de risco”, observa o sócio da gestora de investimentos DLM Invista, Luiz Iani. Para Oltramari é exatamente isso que vai começar a acontecer a partir de agora, com reflexos diretos no Ibovespa. “A bolsa vai subir”, prevê, mesmo diante de um cenário turbulento e nada animador nos mercados internacionais.
Quanto a recorrer a investimentos com taxas pré-fixadas, há divergências. Apesar de serem boa forma de garantir rentabilidade em caso de quedas ainda maiores da Selic, Oltramari acredita ainda ser precipitada a migração para títulos como Letras do Tesouro Nacional (LTN) e Notas do Tesouro Nacional – Série F (NTN-F). “Há duas semanas, a tendência era da taxa básica de juros continuar subindo. O cenário inverteu para retração. Dizer que esta tendência vai se manter nos próximos 12 a 18 meses ainda é muito prematuro”, pondera.
Risco X Segurança
O retorno dos pré-fixados é estabelecido no momento da aquisição, sendo possível saber exatamente o quanto a aplicação vai gerar. Para o analista, assumir posição pré-fixada no cenário atual é arriscado. “Aplicações pós-fixadas ainda são a melhor alternativa”, avalia Oltramari. Já para Lucas Roque, sócio da corretora V10 Investimentos, diante de uma previsão futura de queda, como avalia o mercado, partir para os pré-fixados está entre as alternativas aconselháveis. “O investidor fica garantido”, avalia.
Outra boa saída para os recursos seria recorrer a investimentos atrelados à inflação que registraram uma das maiores rentabilidades diante da escalada do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Entre eles, estaria a Nota do Tesouro Nacional Série B (NTN-B), que tem atualização ligada a variação do indicador de preços oficial do governo. “A inflação vai continuar pressionando, por isso é bom recorrer a esses títulos”, orienta Oltramari.
Roque alerta que, antes de ingressar nestas aplicações, é preciso avaliar a perspectiva futura de variação da inflação. “Tem que pensar nos próximos 12 meses porque o que passou não tem influência. O que interesse é quanto vai ficar daqui para frente. Se o IPCA ficar dentro da expectativa ou abaixo, é melhor ficar no pré-fixado”, orienta.
Inflação não dá sinal de arrefecer
Na esteira de queda da Selic, a previsão do mercado para fechamento da inflação no ano subiu de 6,38% para 6,45%, a apenas 0,05 ponto percentual do teto da meta estipulada pelo governo, de 6,5%, segundo o Relatório Focus. Entre os que sofrem mais com a fúria do dragão inflacionário está a população de baixa renda. Somente em agosto, o Índice de Preços ao Consumidor – Classe 1 (IPC-C1), que mede a variação de preços para este grupo variou 0,33%, segundo da Fundação Getulio Vargas (FGV). No ano, o indicador acumula alta de 3,73% e, em 12 meses, de 7,30%.
Entre os itens que exerceram maior pressão, estão a alimentação (0,52%), habitação (0,43%) e cuidados pessoais (0,46%). Neste último caso, o destaque fica por conta dos salões de beleza. Pesquisa do site Mercado Mineiro mostra que o preço médio do corte feminino variou de R$ 51,12, em novembro de 2010, para R$ 57,31, nos primeiros dias de setembro, alta de 12,11%. Os preços da maquiagem tiveram ritmo mais lento, com variação de 4,98%, passando de R$ 79,26 para R$ 83,21. Semelhante ao da depilação completa, que subiu 4,91%, saltando de R$ 58,46 para R$ 61,33.
O setor de serviços tem sido um dos principais responsáveis por impulsionar a alta da inflação no país. Somente em agosto, a alta foi de 0,5% no IPCA, chegando a 6,83% no ano e 8,93% nos últimos 12 meses, muito acima da média geral do indicador (7,23%).
Meta distante
São poucas as esperanças de que o cenário se inverta nos próximos meses. Se não bastasse a política de queda de juros, o dólar – importante ferramenta de controle de preços – chegou nessa segunda-feira a cotação de R$ 1,71, a maior desde 17 de dezembro de 2010 (leia mais sobre a alta do dólar na página 16). No novo patamar, a moeda americana ajuda a pressionar o preço de bens de consumo, já em franca expansão.
Para Sílvia Matos, coordenadora do Boletim Macro IBRE da FGV, o impacto também será sentido pela indústria brasileira. “Há uma forte importação de bens intermediários e matéria prima que chegarão mais caros e terão os preços repassados para o consumidor”, prevê. Diante do câmbio em R$ 1,70, ela não vê a convergência do índice para o centro da meta. “Para este ano prevemos fechamento em 6,6%. Diante do comportamento da moeda americana, nem mesmo em 2012 ficará no centro da meta do governo”, avalia. (PT, colaborou Pedro Franco)