A dobradinha indesejável formada pela inflação alta e as taxas de juros bancários mais baixas dos últimos 16 anos no Brasil alimenta a inadimplência, antes mesmo de o país perceber com clareza os efeitos da nova crise que abate as economias da Europa e dos Estados Unidos. Os últimos dados da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH) indicaram em agosto o maior número de consumidores inadimplentes depois dos registros influenciados pela turbulência que varreu as bolsas de valores do mundo no fim de 2008. Na prática, o universo de inadimplentes na capital está pouco abaixo – apenas 0,45% a menor – das estatísticas de agosto de 2007.
A CDL-BH não divulga o total de inadimplentes, no entanto vê o movimento de alta, ao acompanhar o nível das contas em atraso. A estatística de agosto confirma o levantamento mais recente do Banco Central sobre a inadimplência. Em julho, 21,13% da renda das famílias estava comprometida com dívidas bancárias, maior percentual de toda a série histórica acompanhada pela instituição desde janeiro de 2005. O ano começou com um endividamento que consumia 19,98% dos rendimentos, patamar superior, inclusive, ao de 18,26% verificado em setembro de 2008, quando a crise financeira mundial estourou.
Os dados do Relatório de Estabilidade Financeira divulgados pelo BC em setembro já mostram aumento da inadimplência neste ano. Do total das operações de crédito do sistema financeiro nacional, 5,06% sofriam atraso superior a 90 dias em fevereiro, fatia que subiu a 5,29% em junho. O sinal amarelo foi aceso e é mais que válido para o consumidor diante de pelo menos três fatos ligados ao consumo no Brasil. O primeiro deles está na elevação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que em setembro acumulou alta de 0,53%, a maior registrada para o mês desde 2004. Outro ponto essencial é que a média dos encargos cobrados nos empréstimos dos bancos ficou em 6,69% ao mês em setembro, taxa mais baixa contada a partir de 1995 na série estatística da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac).
Por fim, mais um ingrediente deve deixar o consumidor com as barbas de molho. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) revisou a expectativa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, de 3,8% para 3,4% neste ano. O PIB retrata a produção de bens e serviços no país. Significa uma desaceleração da atividade, com impactos que tendem a atingir o emprego e a renda da população.
Para fugir do risco de cair na inadimplência, além de não perder de vista os desdobramentos da crise na Europa e nos EUA, o consumidor deve seguir lições aparentemente simples. É fundamental planejar os gastos para as compras mais desejadas, evitar despesas supérfluas e, se possível, guardar umas gordurinhas para poder comprar à vista. Segundo Reinaldo Domingos, autor do livro recém-lançado Livre-se das dívidas , a alta inadimplência está diretamente ligada a três fatores: táticas agressivas do marketing financeiro; crédito fácil e o que chama de analfabetismo financeiro. Este último fenômeno, segundo Reinaldo Domingos, assola todas as classes socioeconômicas, dos mais pobres aos mais ricos, e cria uma ciranda de problemas. Por isso, é bom prevenir sempre.