A demanda maior por trabalhos como o do mestre de obra e o aumento de renda da população trouxeram peso maior para o bolso das famílias. A inflação no segmento de serviços está mais alta do que o aumento médio do custo de vida da população. O custo da mão de obra em alguns segmentos (como pedreiro, marceneiro e eletricista) chega a registrar alta de 13,4% de janeiro a outubro deste ano, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a evolução dos gastos das famílias com renda de 1 a 40 salários mínimos em Belo Horizonte. É mais do que o dobro da taxa média registrada pelo índice, que é de 6,15% nos dez primeiros meses de 2011.
O dragão está mais forte também em outros segmentos de serviços, como alimentação fora de casa, manicure e pedicure, depilação, aparelho dentário, médico, despachante e empregado doméstico. Todos esses setores registraram reajuste acima da média inflacionaria da capital neste ano. “Tivemos aumento real de renda da população. Muita gente nova, principalmente da classe C, passou a usar os serviços e elevar a demanda”, explica Wanderley Ramalho, coordenador de pesquisa e desenvolvimento da Fundação Ipead/UFMG. Ele ressalta que quando ocorre o movimento contrário e há queda de renda real, o setor de serviços é o primeiro a retrair o preço. “De qualquer forma, o consumidor deve estar atento aos preços, pois neste momento pode haver muita especulação”, observa.
Menos bens
Na nova classe média, que tem famílias com renda per capita entre R$ 326 e R$ 1,4 mil, os gastos com serviços chegam a superar os dos bens de consumo, segundo levantamento do instituto Data Popular, que pesquisa os hábitos da baixa renda no país. De cada R$ 100 desembolsados hoje por essa fatia da população, R$ 65,20 são com serviços e R$ 34,80 com produtos. Em 2002, essa proporção era mais equilibrada: 49,5% do orçamento ia para o segmento de serviços e 50,5% para compras.
No segmento de serviços, o maior gasto das famílias de classe média está na manutenção do lar (26,2%), seguido de outras despesas como cabeleireiro, manicure, sapateiro, lavanderia, alfaiate, entre outros. “É a primeira vez que detectamos gastos maiores de serviços do que com bens de consumo”, ressalta Renato Meirelles, sócio-diretor do instituto e responsável pelo estudo. Esse movimento, diz, pode ser explicado ainda pelo aumento de crédito em áreas do serviço, como o turismo. “As mulheres no mercado de trabalho também gastam mais no salão de beleza”, observa. O levantamento do Data Popular mostra que a alimentação fora de casa, os transportes urbanos e os serviços de saúde são outros três setores que têm ganhado parte grande da renda da classe média, com 5,5%, 3,1% e 2,7%, respectivamente.
Alta leva a mudança de hábito
A dona de casa Valéria Mesquita foi ontem fazer as unhas, no salão de beleza, e recebeu uma notícia: o preço do serviço subiu de R$ 29 para R$ 32. Ela pagou R$ 32 pela depilação, preço que também ficou acima das expectativas. Valéria ainda desembolsa cerca de R$ 200 todos os meses para tintura, corte e hidratação dos cabelos. O aumento do custo das sessões de beleza levaram Valéria a fazer alguns cortes. “A sobrancelha, eu faço agora em casa, com a ajuda de uma filha”, diz.
E não foram só os gastos com salão de beleza que encararam o serrote na casa de Valéria. Ela e o marido tinham o hábito de almoçar fora aos sábados e domingos. “Agora é no sábado ou no domingo. A conta do almoço ficava em torno de R$ 100, hoje fica em R$ 160”, diz Valéria. A saída à noite durante a semana foi cortada. O reajuste no orçamento sobrou até para os três genros de Valéria. Nos almoços fora de casa em família, seu marido tinha o hábito de pagar toda a conta. A última ficou em mais de R$ 700. “Agora é dividido por ele e os três genros”, diz.
O setor de serviços dá força para a inflação também nos índices nacionais. Nos últimos doze meses (até outubro) a inflação no segmento de serviços acumulou alta de 9% no Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S), sendo que a média de alta da taxa foi de 6,78% no período. “Com a economia aquecida há renda para incorporar novos serviços no consumo das famílias, como lavar carros, ir mais ao salão de beleza, consultórios médicos e restaurantes”, observa André Braz, economista do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Das sete capitais analisadas pela FGV, quatro tiveram aceleração no índice em outubro. Em Belo Horizonte o índice atingiu 0,44% no mês passado, contra 0,39% na divulgação anterior. “Há uma tendência de desacelaração do índice, pois o grupo de alimentação deve registrar taxas menores”, diz Braz.
Aperto
A dona de casa Jaqueline Adriana Rocha faz parte do grupo das famílias de classe C. Ela tem três filhos e o marido é o único que trabalha em casa, com renda média mensal de R$ 800. Mesmo com orçamento apertado, o casal não abre mão dos gastos com serviços: cada um tem dois números de celular e, em dezembro, planejam colocar TV a cabo em casa. Os gastos com salão de beleza fazem parte do orçamento de Jaqueline. Ela desembolsa de R$ 70 a R$ 80 com escova, relaxamento de cabelo e unhas todos os meses. “Tenho notado aumento de preço. A escova era R$ 10 e agora está R$ 12. A unha, que era R$ 7, está R$ 8”, diz.