De acordo com o professor Wanderley Ramalho, coordenador de pesquisa da Fundação Ipead, da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, para fugir do componente especulativo que ronda eventos como a Copa do Mundo, o locatário deve estar atento ao contrato. “É importante que haja atenção para os índices gerais de reajuste de preços desse mercado, que indicarão média razoável de variação, balizando a mudança no valor e impedindo que ela seja absurda.” Se o consumidor não fica atento, segundo o especialista, a tendência é embarcar nas “apostas em advinhação, que sempre caem na especulação e abrem caminho para preços que extrapolam a realidade do mercado”.
Na capital, a variação média de preços de imóveis comerciais acumula, nos 12 meses anteriores a setembro, alta de 12,58%, segundo pesquisa do Ipead, em parceria com o Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de Minas Gerais (Sinduscon-MG) e da Câmara do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (CMI). Ou seja, qualquer reajuste de aluguel acima desse índice está além da média de mercado. A inflação no mesmo período foi de 7,55%. O preço médio dos aluguéis comerciais apresentou elevação de 0,79% em setembro. Por tipos imobiliários, os valores de locação para andares corridos subiram 0,45%; casas comerciais, 0,88%; galpões, 1,75%; lojas, 0,66% e salas: 0,57%.
Na prática, há casos em que os números são bem maiores que isso. “Os imóveis estão supervalorizados. Os donos de imóveis estão contando com os ovos antes da galinha. A Copa do Mundo, por exemplo, só vai acontecer daqui a dois anos”, afirma Gessiara. Ela tenta negociar com o proprietário da loja redução no valor do aluguel. “Com as obras da Savassi, o movimento caiu em torno de 40 a 50%. Alguns proprietários de imóveis estão até dando descontos para os lojistas. Não há justificativa para aumentar o preço agora”, diz Gessiara. Ela afirma que se o movimento da loja estivesse igual ao do período anterior às obras da Savassi ainda daria para segurar mais um pouco o valor do aluguel. “O problema é que as pessoas não querem enfrentar o trânsito e a falta de lugar para estacionar”, diz.
Argumentação
Assim como Gessiara, pequenos empresários dos mais diversos ramos e de diferentes regiões da cidade estão tendo que usar todos os argumentos para evitar reajustes muito elevados na locação dos imóveis. A negociação está árdua. As obras de infraestrutura da cidade e a Copa do Mundo estão entre as principais justificativas apresentadas pelos locadores, principalmente nas áreas da Savassi e Pampulha, Mercado Central e regiões hoteleiras.
Gustavo Oliveira Quadros é dono da Nossa Loja, no Mercado Central, de utilidades domésticas. Ele está no Mercado há 12 anos. O seu contrato de aluguel acaba de ser reajustado em 22%. “O meu movimento não cresceu nessa mesma proporção. Eles já estão subindo o preço do aluguel em função da Copa, mas não dá para esperar até lá. O Mundial vai durar só um mês, é pouco tempo para tanto barulho. E o que vai sobrar é o aluguel alto para a gente”, diz Quadros.
Otávio Lara de Siqueira tem uma loja de laticínios e embutidos no mercado e levou um susto maior: o preço do aluguel da unidade, de 13 metros quadrados, subiu 50% “Eles já pensam no futuro e na Copa. Mas o movimento não vai crescer assim até lá. No meu caso, caiu 10% ultimamente”, destaca Siqueira. Ele conta que tentou negociar o preço do aluguel, mas sem sucesso.
E, se o susto de Quadros e Siqueira foi grande com o índice de reajuste de aluguel no mercado, o que dizer de João Mossato, dono da Casa Segredo de Umbanda: seu aluguel subiu 180%. A loja, que vende artigos religiosos, está na mesma área há 10 anos e ocupa quatro metros quadrados. “Eu tentei negociar esse valor, mas não teve jeito. Como eu não tinha condições para abrir loja em outro lugar, tive que ficar”, diz. Ele prevê novos reajustes até o Mundial. “Eles acham que a gente vai ficar milionário com a Copa, mas meu movimento caiu em torno de 70% no último ano”, observa Mossato.
Pressão é a mesma em outras regiões
“A Copa do Mundo está aí, vocês vão ganhar muito dinheiro com os turistas.” A frase tem sido rotineira entre os proprietários de imóveis no ramo da hotelaria e alimentação, informa Paulo César Pedrosa, presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Belo Horizonte e Região Metropolitana (Sindhorb). Ele revela que vários empresários do ramo estão sofrendo reajuste abusivo no preço da locação de imóveis. “Estamos sendo pressionados, sendo que muitos comerciantes já estão no ponto há muito tempo”, diz Pedrosa.
O hotel de Paulo César, no Centro da capital, era alugado há três anos por R$ 2,5 mil. Na recente renovação do contrato, o preço dobrou: passou para R$ 5 mil. “Eles alegaram que o preço estava defasado e que vem a Copa do Mundo aí. Tudo hoje é Copa, mas é difícil arcar com o aumento dos custos até lá”, ressalta o presidente do sindicato. Esse movimento, diz, acaba refletindo de forma negativa no mercado de aluguel. “Temos visto muitas lojas fechadas para alugar. Isso significa que o preço está muito alto, fora da realidade”, observa.
Na Pampulha, comerciantes de segmentos diversos também estão sendo surpreendidos com a notícia de reajuste de aluguel. “Houve supervalorização do aluguel na região. Vamos ter um mês de festa com a Copa do Mundo. O problema vai ser voltar à realidade, depois. Os gringos vão embora e tudo volta ao normal aqui depois”, observa Marcus Vinícius Bezerra, um dos sócios dos restaurantes Filé, pizzaria Massa e Sushi House, na Aavenida Fleming, região de grande concentração de bares e restaurantes.
Demanda
Para Ariano Cavalcanti de Paula, presidente da CMI e do Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (Secovi-MG), o movimento não é detectado ainda com valor estatístico e tem mais a ver com lei de oferta e procura, marcada por contextos específicos, do que por antecipação do efeito Copa. “Haverá, é claro, movimentos que levem ao aumento dos preços de aluguéis para os hotéis que resultará em maiores tarifas, mas esperamos isso mais para quando a Copa acontecer.”
Segundo Cavalcanti, o caso da Savassi, “em fase complicada diante da revitalização de grande porte”, tem a ver com o resgate do ambiente de preços: “O pessoal reclama que o aluguel subiu muito, mas esquecem-se do quanto ele caiu até 2004. O mercado tende a cobrar essa diferença”. O Mercado Central experimenta, ainda de acordo com ele, a clássica pressão por demanda. “Se não tem oferta e o fluxo de interesse em determinada região é crescente, os preços vão subir mesmo. Precisamos mudar esse discurso de que o especulador é bandido. A especulação é legítima”, defende. (GC e FB)