O Tesouro Nacional vem usando o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para fazer superávit primário. Em vez de colocar recursos do Orçamento da União para bancar o subsídio do programa Minha casa, minha vida, a montanha de dinheiro a fundo perdido destinada às moradias de baixa renda sai do patrimônio líquido do fundo. No ano passado foram R$ 4,5 bilhões, este ano mais R$ 5,5 bilhões e mais R$ 4,4 bilhões estão previstos para o ano que vem. Esse é o principal motivo para que a equipe econômica seja contra a idéia de aumentar a rentabilidade das contas dos trabalhadores via distribuição de parte do lucro líquido obtido a cada ano, um projeto que dorme na gaveta dos técnicos há pelo menos dois anos.
As críticas à entrada do governo com forte ingerência na gestão do Fundo de Garantia dominou o cenário do seminário que deveria comemorar os 45 anos da existência do FGTS. O ex-conselheiro Celso Petrucci, que representou por seis anos a Confederação Nacional do Comércio (CNC) no Conselho Curador do Fundo, fez uma análise dura da situação. Apesar de reconhecer a atual excelência do desempenho do FGTS ele demonstrou preocupação com ações que podem comprometer o futuro do maior fundo privado do país.
As críticas de Petrucci são encampadas, em parte, até pela Central Única dos Trabalhadores (CUT). Jacy Afonso de Melo que até a semana passada representava a organização no Conselho Curador reconheceu que é preciso discutir uma forma de aumentar a rentabilidade garantida pelo governo às contas vinculadas – hoje, TR mais 3% ao ano – porque a inflação vem ganhando espaço, o que significa que os trabalhadores estão perdendo. “Já perdemos 2% no ano passado e vamos perder mais este ano”, observou. Jacy Afonso defende não só a distribuição de parte do lucro líquido obtido a cada ano como também que o FGTS passe a ter rendimento igual ao garantido às cadernetas de poupança, que equivale à TR mais juros de 6% ao ano.
Patrimônio Líquido
O representante da CUT também vê com preocupação o fato de o FGTS estar bancando, praticamente sozinho, todo o subsídio dado pelo governo às famílias de baixa renda para que elas consigam ter acesso à casa própria. “ O FGTS é um fundo privado e o governo deveria aumentar a sua participação no subsídio”, criticou. De acordo com o orçamento do programa Minha Casa, Minha Vida, o Tesouro Nacional vem colocando apenas 17% do subsídio para o programa, enquanto que o FGTS entra com o bolo restante.
O subsídio para o Minha Casa, Minha Vida sai do lucro líquido do FGTS que pode ser comparado, por exemplo, ao lucro líquido de um banco. É a parte do dinheiro que sobra depois que a Caixa Econômica Federal faz as contas. Se todas as contas com saldo em nome dos trabalhadores fossem pagas de uma única vez, o FGTS precisaria ter em caixa R$ 222,8 bilhões (dados do balancete do fundo de junho deste ano). Acontece que o FGTS possuía, em dezembro de 2010, R$ 35,8 bilhões a mais.
É com esse recurso que, na verdade, pertence aos trabalhadores, que o governo vem fazendo cortesia com o chapéu alheio, disse um participante do seminário que preferiu não se identificar. O patrimônio do FGTS cresceu nos últimos anos graças à boa gestão, mas também ao fato de o governo remunerar mal os trabalhadores. “Praticamente todo o lucro líquido do FGTS em 2010, que foi de R$ 5,3 bilhões, foi gasto com o subsídio habitacional que, no mesmo ano, alcançou R$ 4,5 bilhões. Embora justificado socialmente, esse é um dinheiro que não volta para o fundo, enquanto que a distribuição de parte do lucro líquido como rendimento para as contas não só melhoraria a remuneração do trabalhador como seria um dinheiro que permaneceria dentro do FGTS, para ser usado em habitação e saneamento básico”, explicou.