O Banco Central quebrou um padrão nessa quinta-feira com a divulgação da ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) da semana passada. Ao assumir, em um documento oficial, que é elevada a probabilidade de a taxa básica de juros (Selic), fixada em 10,50% ao ano, chegar a um dígito nos próximos meses, a autoridade monetária se aproximou do Federal Reserve (Fed, o BC dos Estados Unidos) com o objetivo de dar mais transparência aos seus movimentos, indicando aos investidores o que pode fazer nos passos seguintes. No mês passado, o Fed decidiu que era hora de passar a divulgar as projeções de juros de seus integrantes.
Segundo o economista Carlos Thadeu Filho, da gestora de recursos Franklin Templeton, essa mudança de discurso já vinha sendo desenhada pelo BC de Alexandre Tombini havia há alguns meses, quando o Copom passou a falar em “ajustes moderados” da Selic. Até então, a retórica do Copom era a de que os rumos da taxa de juros dependiam dos “cenários prospectivos” para a inflação. Ou seja, o BC não se comprometia com uma queda ou uma alta da Selic explicitamente. Cada reunião do Copom era precedida de muita tensão. Nessa ata, as expressões foram excluídas em troca de mais clareza.
No entender de Thadeu, tudo indica que, nos próximos dois anos, o BC já terá condições de fazer como o Fed: mostrar como os seus integrantes veem as taxas de juros por um período de três ou quatro anos à frente. “Será um ganho e tanto para a economia, pois o Copom reduzirá os riscos das empresas e os riscos de crédito”, disse. “Teremos um mercado futuro de juros bem menos volátil.”
Para especialistas, o BC de Tombini deixou claro que está preocupado com o crescimento do país e quis, com o comunicado, pressionar para baixo os juros das operações de crédito sem ter que adotar medidas efetivas. O efeito foi imediato: o mercado de juros futuros no Brasil reagiu às palavras do BC e todos os contratos registraram recuo nas taxas. “Se alguém tinha dúvidas do que o Banco Central ia fazer, agora não tem mais”, observou André Perfeito, economista-chefe da corretora Gradual Investimento.
Queda real A declaração do BC tem potencial para afetar os juros na vida real mais do que o corte de 0,5 ponto percentual na Selic. Como as instituições financeiras se baseiam nas expectativas para determinar os custos dos financiamentos, essa sinalização tende a derrubar as taxas das operações para consumidores e empresas. O problema, na visão de Newton Rosa, economista-chefe da SulAmérica Investimentos, está no ano que vem. “Em janeiro de 2013, o BC será obrigado a voltar a subir os juros. A economia deve se aquecer demais no segundo semestre deste ano e gerar pressões inflacionárias”, argumentou.
Na visão de Perfeito, a ata indicou que haverá continuidade da agenda econômica que mistura arrocho fiscal com afrouxamento monetário. “Tombini deve ter tido uma garantia da própria presidente Dilma Rousseff de que haverá contenção das despesas públicas. Sem isso, seria temerário promover tantos cortes na Selic”, afirmou
Ajuda do governo
Com a equipe econômica prestes a anunciar os cortes de gastos no Orçamento de 2012, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, deixou claro nessa quinta-feira que o governo pretende conter as despesas para permitir a continuidade da queda da taxa básica de juros (Selic), que chegaria a um dígito. Segundo ele, a ideia é contingenciar verbas que seriam usadas no custeio dos ministérios, livrando os investimentos em infraestrutura, necessários ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB, a soma das riquezas geradas no país). Mantega não quis se comprometer com um valor para a redução orçamentária, mas as estimativas de analistas vão até R$ 70 bilhões.