Encarregado de anunciar a meta deste segundo ano de gestão da presidente Dilma Rousseff de fazer a economia do Brasil crescer de 4% a 5%, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, surprendeu em matéria de otimismo. Afinal, a semana foi marcada pela má notícia da queda de 23,5% do ritmo da criação de empregos formais no país em 2011 e pelo agravamento da crise europeia, que ameaça as exportações nacionais e impacta os preços de bens minerais e de produtos agrícolas cotados no mercado internacional com forte participação na produção brasileira. Como um pouco de prudência e canja de galinha não fazem mal a ninguém, conforme diz o conhecido ditado, economistas e empresários de diversos setores ouvidos pelo Estado de Minas preferem não embarcar nas projeções oficiais. A taxa é considerada exagerada por sete dos nove representantes de instituições de empresários, trabalhadores e do governo mineiro consultados pela reportagem.
Mais dependente que o Brasil do comércio com o exterior, Minas Gerais pode estar ainda mais distante de acompanhar um crescimento aparentemente otimista demais. Ainda que apresentem os melhores resultados as sete molas do crescimento da economia eleitas na reunião de Dilma com seus ministros na última segunda-feira – entre elas o aumento da oferta de crédito, a redução das taxas de juros, os investimentos em infraestrutura e nas obras para o país receber os jogos da Copa do Mundo, além do financiamento facilitado da casa própria – as projeções no mundo real da economia, o das empresas e do cidadão comum, estão concentradas na faixa de 3% a 3,5% em 2012.
“Qualquer estimativa de crescimento econômico, agora, é muito preliminar. Não há como fazer previsões num cenário ainda muito instável lá fora, mas pensar em 5% é algo exagerado”, vai avisando Frederico Gonzaga Jayme Júnior, coordenador do programa de pós-graduação em economia do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da UFMG. Raciocinar sobre o desempenho da economia de Minas Gerais, então, requer um ingrediente adicional também incerto: a expansão da China, que responde por cerca de 30% das exportações do estado, dominadas pelas vendas de minério de ferro, café e produtos siderúrgicos, os três cotados no mercado internacional, no grupo das chamadas commodities.
O melhor a fazer neste mês, recomenda o economista Frederico Gonzaga, é pôr as barbas de molho, com atenção aos desdobramentos da crise europeia. A toada chinesa de crescimento também tende a perder fôlego daqui para frente, lembra o professor do Cedeplar/UFMG. “Ou diversificamos a nossa produção e os mercados do país e do estado no exterior, ou se cria uma dependência maior”, afirma.
Tomando como referência o conjunto da produção de bens e serviços de Minas, medida pelo Produto Interno Bruto (PIB), o setor mínero-metalúrgico responde por 40% desse bolo, lembra Lincoln Gonçalves Fernandes, presidente do Conselho de Política Econômica e Industrial da Federação das Indústrias de Minas (Fiemg). A instituição trabalha com uma das metas mais modestas de crescimento para o Brasil este ano, de 3,4%, e de 2,8% em Minas. “Num ano que já se mostra mais crítico, com crise na Europa e nos Estados Unidos, que motivo o Brasil terá para crescer se não houver uma política vigorosa de investimentos?”, indaga o industrial.
Investimentos públicos
No discurso do ministro Mantega, parte do crescimento estaria garantido nos recursos previstos para as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do Minha casa, minha vida, de subsídio à moradia popular, e nos projetos para o Brasil receber a Copa do Mundo, mas há muitas críticas à velocidade dos projetos. “O que nós já vimos é que o PAC empacou e os investimentos relacionados à Copa estão chegando com atraso”, afirma o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Minas (Faemg), Roberto Simões.
A instituição prevê um ano de dificuldades para o agronegócio, tanto no Brasil quanto em Minas. A seca nas regiões produtoras de alimentos do Sul deverá afetar a produção brasileira, apesar da expectativa de que parte dessa redução seja compensada pela manutenção ou aumento dos preços. Em Minas, o maior problema está na queda esperada dos preços das commodities agrícolas este ano. Para contrabalançar, estão lançadas esperanças num ciclo virtuoso do café, carro-chefe do agronegócio estadual.
O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil de Minas Gerais (Sinduscon-MG), Luiz Fernando Pires, concorda com a preocupação de Simões quanto aos investimentos. “A capacidade pequena de gestão do governo é que atrapalha, não se trata propriamente de falta de recursos. Há dificuldades em todas as fases de licitação de projetos”, diz o empresário.
Alavanca nos juros baixos
Os custos das obras públicas de infraestrutura têm se mostrado ainda muito altos no Brasil, para o economista Márcio Salvato, professor do Ibmec, instituto educacional especializada em mercado de capitais. Ele observa que o início do governo Dilma foi atropelado por um começo de crise externa que mostra a necessidade de mudança da rota de crescimento do país que foi muito dependente, na gestão de Luiz de Inácio Lula da Silva, da expansão da economia mundial e dos preços das commodities. Enquanto elas se mantiveram em elevação, as exportações brasileiras e as mineiras, em especial, surfaram com destreza. Agora é diferente. “Temos de mudar a estratégia colocando o foco no mercado interno, mantendo o crescimento do crédito, sem deixar de reduzir o preço do dinheiro”, afirma o economista.
O presidente da CUT Minas, Marco Antônio de Jesus, defende que a mão do governo vá além da promessa do ministro Mantega de estimular o crédito dos bancos públicos. “Falta ainda maior contribuição dos bancos privados, que cobram taxas absurdas e com isso conseguem altos lucros”, critica. Associado a isso, ele prega novos cortes da taxa básica de juros (Selic), aquela que remunera os títulos do governo no mercado financeiro e serve de referência para as operações nos bancos e no comércio. Margem para mais reduções existe, observa Wanderley Ramalho, coordenador de pesquisas da Fundação Ipead, vinculada à UFMG. “Ainda há espaço para queda dos juros, inclusive para o país manter o crescimento econômico”, diz.
Política central para estimular o consumo, juros baixos e crédito se juntam ao estímulo aos investimentos, fechando o ciclo da lógica do crescimento, segundo a ex-ministra Dorothea Werneck, secretária de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais. Ela aposta no aumento dos investimentos estrangeiros no Brasil, além dos recursos das empresas nacionais. “Minas deverá acompanhar esse padrão, tendo em vista o grande número de potenciais investidores que têm nos procurado. O problema é que o nosso crescimento está muito condicionado ao cenário externo e à manutenção das altas taxas de crescimento da China”, afirma.