Brasília – A Grécia recebeu um novo cheque da Comunidade Europeia, mas desta vez não foi uma ordem de pagamento em branco, que o país possa gastar como quiser. Depois de uma reunião de mais de 13 horas que começou na segunda-feira de carnaval, entrou pela madrugada e ainda precisou ser retomada ontem, os ministros das Finanças da Zona do Euro aprovaram a liberação de um novo pacote, de 130 bilhões de euros. A boa notícia é que os recursos evitarão que o país, que tem pagamentos a fazer no próximo mês de 14,5 bilhões de euros, declare uma moratória desordenada. No entanto, relatório da União Europeia (UE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI) mostra que a lua de mel da Grécia com os credores pode durar pouco.
“Há uma tensão fundamental entre os objetivos do programa de redução da dívida e de melhora da competitividade, já que a desvalorização interna necessária para restaurar a competitividade da Grécia vai, inevitavelmente, levar a uma maior relação da dívida com o Produto Interno Bruto (PIB) no curto prazo”, diz o texto. “Diante dos riscos, o programa grego pode assim continuar propenso a acidentes, com dúvidas pairando sobre a sua sustentabilidade”, aponta o documento.
O acordo obtido reduzirá a dívida grega para 120,5% do PIB em 2020. O débito equivale, atualmente, a 160% do PIB ou 350 bilhões de euros – e a meta inicial era reduzi-la a 120% do PIB no mesmo período. O primeiro, concedido em 2010, foi de 110 bilhões de euros, mas se mostrou insuficiente ante os enormes problemas do país.
Os credores privados também aceitaram participar ativamente do esforço para tirar a Grécia do buraco. Eles concordaram em perdoar 53,5% da dívida do país, em vez dos 50% previstos originalmente, o que representará 107 bilhões de euros de um débito total de 200 bilhões de euros. Trata-se de uma reestruturação recorde na história das finanças mundiais, que supera até mesmo o calote declarado pela Argentina em 2002.
Garantias Apesar da vigilância a que será submetido o país – a Grécia terá que aceitar a presença permanente de inspetores da Comunidade Europeia, além de depositar num fundo separado os recursos necessários para o pagamento dos juros da dívida – o primeiro ministro grego, Lucas Papademos, comemorou. “Estou convencido de que o governo cumprirá com esse programa, já que ele é do interesse dos gregos”, declarou.
Para obter o novo acordo, Papademos cumpriu, a toque de caixa, os requisitos que lhe foram impostos pelas autoridades em troca da ajuda: o Parlamento deu seu aval ao plano de novos ajustes e os partidos da coalizão governamental garantiram que o plano será cumprido, independentemente de quem ganhe as próximas eleições legislativas de abril. Mais uma vez, a conta vai pesar para a população grega, pois serão necessários cortes adicionais de 325 milhões de euros nos setores de defesa e de gastos farmacêuticos, além de uma economia extra de 3,3 bilhões de euros este ano, entre salários e aposentadorias .
Economistas duvidam que o novo plano de resgate seja o último capítulo da crise grega. O temor é de que o ajuste exigido comprometa ainda mais a possibilidade de recuperação econômica do país. “O plano grego continua sendo frágil e vulnerável”, disse Sony Kapoor, diretor do centro de estudos Re-Define. Jean Pisani-Ferry, responsável do Instituto Brueghel, é ainda mais pessimista. Ele considerou que o plano não fará mais que adiar o inevitável, que é a saída da Grécia do euro.
BOLSAS Um dia após a euforia motivada pela perspectiva de acordo em torno do resgate financeiro da Grécia, as bolsas europeias fecharam ontem em baixa, com investidores embolsando os lucros das altas recentes. Apesar de o acordo com Atenas evitar o risco imediato de um calote desordenado da dívida, outras incertezas derrubaram os pregões. As maiores quedas foram registradas nas bolsas de Lisboa (0,7%), Frankfurt (0,58%), Madri (0,58%), Londres (0,29%) e Paris (0,21%). O acordo na Zona do Euro foi recebido sem muito entusiasmo nas principais bolsas da Ásia, diante de temores de que seja apenas um remédio de curto prazo para o problema grego. Enquanto a Bolsa de Tóquio caiu 0,23%, Xangai subiu 0,75%.
LINHA DO TEMPO
Veja a cronologia da crise econômica grega, que começou em 2009
2009
8 de dezembro
A bolsa e os bônus da Grécia desabam por causa de sua elevada dívida. A Comissão Europeia e o Banco Central Europeu (BCE) pedem ao país para tomar medidas
2010
5 de janeiro
A Grécia anuncia medidas para reduzir o déficit público, de acordo com o pacto de estabilidade
3 de fevereiro
A Comissão Europeia aprova o plano de austeridade grego
28 de abril
As dúvidas sobre a solvência da Grécia e o temor de contágio a outros países europeus arrastam o euro para índices mínimos em um ano. Pela primeira vez na história da Zona do Euro, a rentabilidade do bônus grego fica acima de 10%
2 de maio
Os países da Zona do Euro aprovam um empréstimo à Grécia no valor de 110 bilhões de euros para o período 2010-2012, do qual o FMI forneceria 30 bilhões
6 de maio
O Parlamento aprova o plano de ajuste
9 de maio
O Conselho Executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI) aprova o programa de
ajudas à Grécia
14 de junho
A Moody’s rebaixa a dívida grega a “bônus lixo”
7 de setembro
A UE aprova a segunda prestação de ajuda à Grécia
23 de novembro
UE e FMI aprovam o terceiro prazo de ajuda
2011
22 de maio
O governo grego adverte que se não receber em junho a quinta prestação da ajuda externa (12 bilhões de euros), a Grécia quebrará
23 de maio
Aprovadas novas medidas de austeridade para economizar 28 bilhões de euros até 2015 e privatizações para conseguir outros 50 bilhões
21 junho
O governo de Yorgos Papandreou recebe o apoio do Parlamento em uma moção de confiança
29 de junho
O Parlamento grego aprova o novo plano de ajuste que desbloqueia a ajuda de 12 bilhões de euros
21 de julho
A Zona do Euro acerta um segundo resgate à Grécia no valor de 109 bilhões de euros, no qual também participará o setor privado com o investimento de 49,6 bilhões de euros entre 2011 e 2014
2 outubro
A Grécia reconhece que não cumprirá com os objetivos marcados por UE e FMI e aprova novas medidas adicionais de ajuste para economizar 6,6 bilhões de euros
19 outubro
Greve geral de dois dias. Morre um sindicalista nos incidentes
21 outubro
O Eurogrupo autoriza a sexta prestação do resgate, de 8 bilhões de euros
27 outubro
A UE aprova as condições do segundo resgate, de 130 bilhões
de euros
31 outubro
Papandreou propõe um plebiscito sobre a aplicação do plano de resgate
2 novembro
A UE decide bloquear os 8 bilhões de euros da sexta prestação, perante a incerteza
8 novembro
O governo de Papandreou apresenta sua renúncia no plenário do Parlamento
10 novembro
O economista Lukas Papademos é designado primeiro-ministro de um governo de união nacional
29 novembro
O Eurogrupo libera os 8 bilhões de euros da sexta prestação
6 dezembro
O Parlamento grego aprova o orçamento para 2012 exigido por UE e FMI
12 dezembro
A Grécia descarta reduzir o salário mínimo, como exige a troika
2012
12 de fevereiro
O Parlamento grego aprova o plano de austeridade exigido pelos credores internacionais. A lei de austeridade fiscal que estabelece o corte de 3,3 bilhões de euros (4,35 bilhões dólares) em pensões, remunerações e emprego.
14 fevereiro
O Eurogrupo adia a reunião sobre o segundo resgate à Grécia. O PIB da Grécia no último trimestre de
2011 cai 7%
18 fevereiro
O governo aprova uma nova redução das pensões para economizar 75 milhões de euros
21 de fevereiro
Reunidos em Bruxelas, o ministros de Finanças dos países da Zona do Euro aprovam um segundo pacote de ajuda à Grécia no valor de 130 bilhões de euros